quinta-feira, 30 de maio de 2019

Olavo de Carvalho


     O Olavo de Carvalho chamado, pejorativamente, por uns, de Guru, e por outros, exaltativamente, de Mestre, iniciou um movimento no Brasil que, de certa forma, mudou as estruturas do pensamento brasileiro. Esta “certa forma” refere-se à mentalidade, ao modo de pensar do brasileiro. Ainda que este movimento esteja no seu início, posso dizer que ele possui uma atemporalidade (está fora do domínio do tempo); porém, esta atemporalidade pode perder-se no tempo. Esta última afirmação pode parecer contraditória, mas este “perder-se no tempo”, penso eu, refere-se ao fato de que o movimento iniciado pelo Olavo está fundamentado na pessoa do Olavo, na sua personalidade, no seu eu.
     Quando o Olavo deixar este plano existencial (morte), talvez o seu movimento (por falta de um termo melhor), pode deixar de existir, morrerá com ele. Ainda que perdurem as suas idéias e o seu pensamento - e com certeza perdurarão -, ainda assim, por falta de um sucessor ou sucessores, tal movimento, enquanto corrente filosófica, pode perder a sua força e dissipar-se no tempo.
     Após a sua morte, talvez surgirão vários “sucessores” do Olavo, “sucessores” estes no sentido de eles mesmos se arvorarem esta condição. Isto poderá causar uma quebra do movimento entre várias e diversas correntes que, porventura, não corresponderão.
     Talvez esta seja a hora de o Olavo escolher um ou mais discípulos (discípulo no sentido de seguidor disposto a dar prosseguimento ao trabalho de seu mestre) e, após um tempo de treinamento, proclamar de público, nominar seus discípulos como seus prováveis sucessores que continuarão seu trabalho. Isso evitará que surjam falsos discípulos, ou discípulos que, por terem frequentado as aulas do seu mestre e terem sido elogiados por ele de forma pública, arvorem-se esta qualidade de sucessores mesmo não tendo as qualidades pessoais do seu mestre.
     Talvez, se o Olavo já escolhesse um ou mais alunos e os treinasse pessoalmente para serem seus discípulos e prováveis sucessores, seria de bom tom no momento temporal e, futuramente, anunciar de público seus sucessores. Eu não saberia agora especificar quanto tempo seria esse “futuramente”, pois isto não depende de mim, mas depende, obviamente, do próprio Olavo.
     Acredito que o Olavo tenha meios e técnicas de o fazer, de dar um acompanhamento mais próximo como mentor e pupilo, mestre e discípulo, procurando passar para eles o âmago do seu pensamento. Lembrei agora do filme “Tropa de Elite”, na cena onde o Capitão Nascimento, ao treinar uma nova equipe, diz, mais ou menos com estas palavras: “Tenho que deixar meu sucessor, mas o cara tem que ser eu”. Não obstante essa relação parecer trivial, brega até, vejo uma verdade filosófica naquelas palavras.
     Em se tratando de sucessor (ou sucessores) de idéias, de filosofia e de movimento, é necessário que o pupilo acompanhe seu mestre estando perto dele fisicamente, convivendo com ele, absorvendo seus pensamentos até “tornar-se ele”. “Tornar-se ele” está entre aspas porque, mesmo o objetivo final sendo esse, tal objetivo jamais será alcançado tendo em vista a individualidade de cada um, isso é óbvio. Uma pessoa jamais poderá transformar-se em outra pessoa no sentido específico de um discípulo transformar-se no seu mestre. O discípulo, agora mestre, pode superar seu mestre ou ficar aquém dele. Mas, com relação às idéias, ao pensamento, esse objetivo pode realizar-se.
     As qualidades pessoais de uma pessoa podem ser perfeitamente passadas para outra pessoa, mas isso se dá através da convivência diária do mesmo modo que um pai passa seus valores para seu filho. No caso de mestre e pupilo é necessária uma convivência íntima, não no sentido grego - se é que me entendem -, mas no sentido de pai para filho. Convivência esta na qual se estabelece uma relação de confiança onde o mestre, em determinado momento, dará uma inspiração profunda e prolongada seguida de uma expiração audível - um suspiro de satisfação - que o fará saber que sua missão está cumprida, que seu pupilo está pronto para se tornar o mestre.
     E estes apóstolos, agora mestres, escolherão, entre seus alunos, aqueles que serão seus discípulos e adotarão a mesma relação com esses discípulos criando uma corrente inquebrável que se espalhará como uma progressão geométrica multiplicando as idéias e o pensamento ao longo do tempo.

sábado, 25 de maio de 2019

A Sociedade da Mentira


     As últimas notícias sobre desmascaramentos de mentiras em relação a pessoas que mentem sobre seu currículo corroboram meu pensamento e me fazem perguntar: como chegamos nesse ponto?
     Como chegamos no ponto de um Juiz Federal, agora Governador do Rio de Janeiro, mentir dessa maneira infantil?
     Uma das primeiras pessoas públicas que eu lembro que aplicou tal mentira foi a ex-Presidente Dilma Roussef... e mentiu na página oficial da Presidência da República.
     Recentemente, a pesquisadora química Joana D'Arc Félix de Sousa também foi pega nessa mentira, além de outras mentiras.
     A "desculpa" do Governador do Rio de Janeiro foi dizer que ele tinha intenção de estudar em Harvard e a assessoria dele disse que não há erro no currículo porque ele ainda tem o projeto de estudar em Harvard, ou seja, basta ter a intenção de ser alguma coisa na vida e pronto, podemos colocar no currículo.
     Se eu tiver a intenção de ser Presidente da República posso alterar meu currículo Lattes e colocar lá que sou Presidente da República, inclusive com data, ano da minha eleição e número de votos: 100% dos votos válidos.
     Mentir no currículo não é uma coisa à toa. Mentir no currículo é mentir sobre a sua própria vida, é você mesmo dizendo que a sua vida é uma mentira, e pior: é você mesmo aceitando que a sua vida é mentira.
     Pessoas detentoras de cargos públicos eletivos deveriam ser destituídas imediatamente do cargo ao serem pegas em mentiras como essa, pois esse tipo de mentira diz muito sobre o caráter da pessoa.
     Como chegamos no ponto dessas pessoas mentirem descaradamente e ao serem descobertas mentirem mais ainda tentando justificar o injustificável?
     Nos tornamos a sociedade da mentira. Mentir é tão comum aqui no Brasil que não chamamos mais a mentira de mentira: chamamos desculpa, justificativa, explicação, erro, marketing, política, notícias falsas, narrativa, etc.
     O caso do Governador do Rio de Janeiro é mais grave ainda, pois o sujeito foi Juiz Federal por 17 anos. Passou 17 anos lidando com as mentiras dos acusados e pelo visto aprendeu várias coisas com eles.
     Pergunto-me: como pessoas adultas e proeminentes na sociedade comportam-se dessa maneira infantil? Que belo exemplo elas dão para a sociedade.
     Será que a única maneira de fazer sucesso no Brasil é mentindo?
     Talvez essas pessoas não representem a sociedade brasileira, mas se formos julgar pelos nossos políticos, que são todos mentirosos, posso aventar a hipótese de que sim. Posso dizer com alguma certeza que a sociedade brasileira tem um quê muito grande de mentira. Que mentimos até nas coisas mais simples. Que marcamos de chegar em tal horário em uma reunião ou em um encontro e chegamos sempre, invariavelmente, atrasados. Que furamos a fila do banco e damos desculpas esfarrapadas (mentiras) para justificar a mentira, pois uma mentira não aparece somente nas palavras, mas aparece também nos atos.
     Ano passado li o livro "Você foi Enganado" que trata justamente das mentiras dos Presidentes do Brasil desde João Batista Figueiredo até Michel Temer. Todos mentiram, sem exceção. E chamam isso de "política".
     Quando deixamos de cumprir uma regra estamos mentindo. Quando fizemos um juramento e não o cumprimos, estamos mentindo.
     O mais interessante e assustador é que as pessoas quando são pegas na mentira passam a acusar a pessoa que a desmascarou e, muitas vezes, começam a inventar mentiras sobre essa pessoa, como se fosse errado desmascarar uma mentira.
     Algumas pessoas chegam ao ponto de dizer que se a pessoa não tivesse desmascarado a mentira isso não teria acontecido, portanto, a culpa é de quem desmascarou a mentira e não de quem mentiu. É a inversão total de valores. É uma insanidade.
     Como chegamos nesse ponto?

quinta-feira, 16 de maio de 2019

Bolsonaro Feminista

     O Bolsonaro acabou de levar o feminismo para o interior do Brasil, feminismo este que faz parte da ideologia que ele diz combater. E na Lei 13.827 de 13 maio de 2019, sancionada por ele, também consta o nome da Damares Regina Alves, que também diz combater essa ideologia. 
     De acordo com o novo texto que modificou a Lei Maria da Penha, quando o município não for sede da comarca, o Delegado ou, na falta deste, outro policial pode emitir medida protetiva contra o homem.
     Vamos pegar como exemplo inicial o Rio Grande do Sul. Segundo o site do Tribunal de Justiça, temos 164 comarcas no Rio Grande do Sul, sendo que cada comarca pode abranger um ou mais municípios. Temos 497 municípios do RS. A conta é simples: 497 - 164 = 333 municípios que não tem comarca ou fazem parte de uma comarca mas não são sede e que, caso o Juiz não estiver por qualquer motivo (se tiver Juiz na comarca), o Delegado ou outro policial pode afastar o homem do seu lar. Porém, o município de Santa Maria, por exemplo, é a sede da comarca e abrange os municípios de Itaara, São Martinho da Serra e Silveira Martins. 164 comarcas, pelo que se entende do site do TJ-RS, significam 164 sedes. Porém, o número de sedes de um estado (e do Brasil) não está bem claro em nenhum dos sites dos Tribunais de Justiça que consultei.
     O estado de São Paulo têm 645 municípios e 319 comarcas. 645 - 319 = 326 municípios que não tem comarca. O raciocínio é o mesmo do RS. Então, para fins dessa Lei promulgada pelo Bolsonaro, o número de municípios que essa lei abrange pode ser maior do que 326 municípios.
     O estado do Rio de Janeiro tem 92 municípios e 81 comarcas. 92 - 81 = 11 municípios que não tem comarca.  O raciocínio é o mesmo do RS. Então, para fins dessa Lei promulgada pelo Bolsonaro, o número de municípios que essa lei abrange pode ser maior do que 11 municípios.
     O estado do Ceará tem 184 municípios e  150 comarcas. 184 -150 = 34 municípios que não tem comarca. O raciocínio é o mesmo. Então, para fins dessa Lei promulgada pelo Bolsonaro, o número de municípios que essa lei abrange pode ser maior do que 34 municípios.
     Acredito que esses exemplos acima são suficientes para demonstrar que a abrangência dessa Lei 13.827 é bastante ampla no Brasil.
     A lei abrange 2.873 municípios que não são sede de comarca, portanto, são todos municípios do interior. O Brasil tem 5.570 municípios, ou seja, mais da metade dos municípios do Brasil, sendo todos no interior, serão atingidos por essa lei.
     Atento agora para o § 2º do artigo 12-C da Lei: "Nos casos de risco à integridade física da ofendida ou à efetividade da medida protetiva de urgência, não será concedida liberdade provisória ao preso". Isto significa que basta a mulher falar (sendo verdade ou não) que está sofrendo risco, e o marido será preso sem direito à liberdade provisória. Isto foi incluído pela lei do Bolsonaro, antes não tinha.
      Já estava ruim antes, agora o Bolsonaro deu a vitória definitiva ao feminismo. Para um homem conseguir uma medida protetiva contra uma mulher no Brasil é praticamente impossível, Juiz nenhum concede. Mas basta a mulher falar que quer uma medida protetiva que o Juiz concede.
      Esta celeuma que tomou conta do Brasil em relação à violência doméstica é baseada em dados inconclusos e manipulados.
     Segundo o Atlas da Violência de 2018, em 2016 foram 62.517 mortes no total. Deste total, 4.645 mulheres foram assassinadas no país. 62.517 - 4.645 = 57.872 homens assassinados em 2016.
     Segundo o Mapa da Violência de 2015, em 2013 foram 57.396 mortes no total. Deste total, 4.762 mulheres assassinadas. 57.396 - 4.762 = 52.634 homens assassinados.
     Teria que se saber, dos 57.872 homens mortos em 2016, quantos foram assassinados por mulheres?
     E teria que se saber, das 4.645 mulheres mortas em 2016, quantas foram assassinadas por homens?
     Mas tanto o Atlas da Violência quanto o Mapa da Violência não trazem esses dados. Nem perto chegam, pois as contas acima quem fez fui eu.
     Talvez a violência por agressão física seja predominante entre as mulheres, mas também não há dados conclusivos em relação a isso.
     Vejamos o que diz o Mapa da Violência contra a Mulher 2018, no tocante à violência doméstica: "Vale reforçar que esse ranking não necessariamente corresponde aos casos efetivamente ocorridos, mas apenas aqueles noticiados pela imprensa no período analisado" (p. 24). Ora, casos noticiados pela imprensa não são dados oficiais. O idiota que lê tal documento tende a acreditar no que está escrevinhado ali, como se fosse oficial. Tais Mapas e Atlas estão mais para propaganda ideológica do que para dados estatísticos sérios.
      Para as Delegacias para as mulheres, o importante é o agressor ser homem e não a vítima ser mulher, ou seja, não priorizam a vítima.
     No Distrito Federal, por exemplo, em 2006 foram pedidas 34 medidas protetivas, em 2015, 9 anos após a Lei Maria da Penha, foram 11.760 medidas protetivas. A diferença é enorme.
      E agora esse número irá aumentar mais ainda. Os homens aqui no Brasil já não tem, desde 2006, presunção de inocência. O homem é o culpado e pronto. As circunstâncias dos fatos já não importam mais, a verdade está em segundo plano. A própria Polícia Militar quando atende uma ocorrência da Maria da Penha já enquadra diretamente o homem e o algema de imediato, mesmo ele sendo a vítima. Para não ser algemado o homem deve estar no chão, arrebentado a machadadas.
      Temos no Brasil 16 Leis Federais que privilegiam a mulher em detrimento do homem e a coisa continua piorando ano após ano. Os homicídios aumentando e a violência aumentando. Não importa o sexo, o problema é a violência.
      Vamos fazer um exercício mental: imaginem que não existisse este movimento chamado "feminismo", mas existisse um movimento chamado "masculinismo" que tivesse o apoio da grande mídia (sempre ela) e que pregasse o combate à violência contra o homem e que tivesse 16 Leis Federais privilegiando o homem. Imaginem que no senso comum do brasileiro, na mentalidade do brasileiro estivesse o slogan "temos que combater essa cultura de violência contra o homem". Ainda assim o mal causado na sociedade como um todo seria exatamente o mesmo mal que o feminismo vem causando.
     É o esfacelamento completo da família brasileira chegando de forma definitiva no interior do Brasil.
    
     
Referências:

https://julioseibei.blogspot.com/2019/06/carta-aberta-as-mulheres-do-brasil.html

https://g1.globo.com/politica/noticia/2019/05/14/bolsonaro-sanciona-lei-que-permite-protecao-a-mulher-agredida-sem-autorizacao-judicial.ghtml

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13827.htm

https://www.tjrs.jus.br/site/poder_judiciario/comarcas/

https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/22374-ibge-divulga-as-estimativas-de-populacao-dos-municipios-para-2018 

https://estado.rs.gov.br/geografia

http://www.tjsp.jus.br/QuemSomos 

http://cgj.tjrj.jus.br/documents/1017893/1038177/mapa-do-estado-comarcas.pdf/4802bf77-18aa-2c84-ac28-cc844a4a62e4

https://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2015/MapaViolencia_2015_mulheres.pdf 

http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/relatorio_institucional/180604_atlas_da_violencia_2018.pdf 

http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=33410&Itemid=432

https://www.metropoles.com/vida-e-estilo/comportamento/10-coisas-que-voce-deveria-saber-sobre-a-lei-maria-da-penha 

https://universa.uol.com.br/noticias/redacao/2019/05/14/lei-que-facilita-emissao-de-medidas-protetivas-e-aprovada-saiba-o-que-muda.htm

O Sistema da Pirâmide

   Já há algum tempo - milênios ou milhões de anos, dependendo se você raciocina com criacionismo ou evolucionismo -, temos no mundo um sistema hierárquico em forma de pirâmide onde a “autoridade” é exercida de cima para baixo.
   A palavra “autoridade” está entre aspas porque seu sentido original foi deturpado. Autoridade, no seu sentido original, vem de autor, que implica responsabilidade por suas palavras e por seus atos (tem a ver com moral). É diferente de autoritarismo, que implica falta de responsabilidade por suas palavras e seus atos (falta de moral).
   As “autoridades constituídas”, na verdade são autoritários constituídos. É evidente que uma autoridade constituída pode (e deve) ter moral nas suas palavras e nos seus atos. Porém, o sistema da pirâmide favorece que uma autoridade se transforme em um autoritário, pois este é investido somente de poder legal, enquanto aquela, além do poder legal deve, obrigatoriamente, ter moral.
   Não vou, no momento, discorrer sobre o que é moral e como adquiri-la, até porque outros já fizeram isto com mais propriedade e autoridade. Mas vou assumir, para o presente estudo, o sentido de “moral” como aquele que está no senso comum, no imaginário: ter virtudes tais como ser honesto, ter conduta reta, ter coragem, ter respeito para com os outros, ter bons valores, ter bons costumes, ser respeitado. Tal sentido não contém toda a definição do que é moral, mas encerra perfeitamente a compreensão do que é moral e, por conseguinte, como adquiri-la.
   O sistema da pirâmide do qual escrevo é, por assim dizer, um esquema mental no qual, como já foi dito, as ordens emanam de cima para baixo não importando se quem está embaixo concorda ou não.
Esquematicamente, o sistema é o que está na figura abaixo:
   É simples; uma pirâmide dividida em camadas onde na base está o número maior de pessoas. Podem ser poucas ou várias camadas, dependendo do grupo de pessoas que estamos analisando. Poderia até ser feita uma pirâmide da hierarquia mundial.
   Lembre que uma pirâmide tem três dimensões: altura, largura e profundidade (ou comprimento).
   Ao analisar o organograma de qualquer empresa privada, instituição pública, família, grupo temporário de pessoas, seja o que for em se tratando de coletividade, temos uma pirâmide; basta traçar três retas formando um triângulo.
   Analisando-se, neste sentido, as três religiões reveladas: Cristianismo, Judaísmo e Islamismo, representadas por seus respectivos livros sagrados, temos o mesmo sistema piramidal, a saber, de forma genérica: em cima Deus, na camada logo abaixo anjos (ou outra denominação), depois messias, profetas, santos, etc, e assim sucessivamente até chegarmos nos seres humanos ou nos chamados “espíritos inferiores ou malignos” que habitam o que chamam de inferno (ou outra denominação). Destas últimas duas classes, não sei qual tem em maior quantidade por isso não posso precisar qual é a base dessa pirâmide: nós ou os demônios.
   Este pensamento de hierarquia está presente como um esquema mental no senso comum das pessoas na realidade física, no mundo físico no qual vivemos.
   A noção de hierarquia é intrínseca no ser humano, faz parte dele. O ser humano sempre obedeceu a alguém e/ou sempre mandou em alguém. Aquele que não obedece a ninguém e não manda em ninguém está vivendo sozinho isolado fisicamente por conta própria.
   Alguém poderá dizer: -“Eu não obedeço ninguém, sigo minha própria cabeça”. Isto é ilusão! Caso alguém dê um conselho para este alguém e este alguém seguir o conselho, no todo ou em partes, ele obedeceu. “Obedecer a alguém” não é um termo pejorativo, faz parte da vida em coletividade, bem como mandar. As pessoas confundem obedecer com submeter-se, obediência com submissão. E confundem autoridade com autoritarismo.
   O sistema da pirâmide, por falta de uma nominação melhor, enquanto esquema mental, pode ser encontrado também na filosofia de um modo geral e, como exemplos, cito Aristóteles e Platão. Poderia citar outros filósofos desde os tempos antigos até os dias atuais, porém, a lista ficaria muito extensa.
   Este conceito geral, esta apreensão intelectual da essência deste modelo de hierarquia, está profundamente arraigado na mentalidade do ser humano. São milênios - ou milhões - dessa mentalidade penetrando na consciência humana, cuja repetição subliminarmente intensa atingiu o subconsciente afetando as emoções, as vontades, os desejos, os sentimentos, as opiniões, etc.
   Poderia dizer que esta mentalidade vem desde a queda do paraíso. Poderíamos culpar Moisés por isso, pois, supostamente, foi ele quem escreveu o Gênesis e, de quebra, colocou na cabeça da maioria da humanidade a “recompensa da vida eterna”, que um dia voltaremos para junto de Deus, basta respeitar a hierarquia da pirâmide nesta vida física. O próprio Jesus Cristo estabeleceu hierarquicamente que “ninguém vai ao Pai senão por mim”. Maomé fez algo semelhante no Islamismo. Das três religiões reveladas somente o Cristianismo tem um esquema mental um pouco diferente das outras duas: existe um messias com nome e rosto que voltará um dia. No Judaísmo e no Islamismo existe o messias, mas somente se saberá quem é o messias quando ele próprio se revelar. É uma coisa meio assim misteriosa. Em alguns rabinos ortodoxos, já de idade avançada, esse esquema mental de não precisar de intermediários para chegar em Deus ainda é presente. Porém, o Talmud - a Torah oral escrevinhada - estabeleceu há tempos mais um nível intermediário entre Deus e os judeus, bem como o Novo Testamento no Cristianismo. O Islamismo é submissão pura e simples.
   Sendo a religião - enquanto conceito - a infância da filosofia, é através dela, da religião, que certos esquemas mentais, certas mentalidades e certos pensamentos entram na mente dos seres humanos, principalmente na infância não metafórica.
   Na modernidade outras correntes de pensamento estão entrando no lugar das religiões, no entanto, o sistema piramidal está se tornando cada vez mais forte.
   Não vejo nenhum problema em estabelecer-se uma hierarquia nas relações humanas entre os seres humanos e entre os seres humanos e os mundos físico e metafísico (ou espiritual).
   A questão básica é: “o que devemos reconhecer e respeitar na hierarquia? ”
   A resposta é: a moral.
   O caminho para a escravidão é aceitar um autoritário mascarado de “autoridade” imposta de cima para baixo posto que toda “autoridade” surgida assim não tem moral na sua essência. A autoridade - no verdadeiro sentido da palavra - tem moral e é autoridade justamente por ter moral.
   Em tempos modernos, a autoridade sem moral é o que se chama de opressor, pois todo opressor é autoritário. Uma pessoa que cultiva a moral em si e, por decorrência, nos outros, jamais será opressora e jamais será oprimida. Mesmo que o pior dos opressores entre na sua vida, ela jamais será oprimida, pois a coragem para lutar vem da força moral e a força moral vem da certeza de que se está fazendo o certo, o bem e o justo para si e para os outros. E quando ficar em dúvida entre “se dar bem” e prejudicar alguém, escolha com coragem e depois chore com os castigos ou alegre-se com as recompensas, pois uma dessas duas virá com a mesma certeza da morte.
   E lembre-se sempre que, nessa escolha, é possível todos saírem ganhando, uns mais, outros menos, mas faça a sua escolha na rotina diária de modo que todos possam sair ganhando. Esta deve ser a hierarquia da vida.

sexta-feira, 3 de maio de 2019

A Constituição e a Prisão em Segunda Instância


   Todo este imbróglio em torno da prisão em segunda instância tem sua origem no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal, que preceitua que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.
   Este inciso LVII foi mal construído e jamais deveria ter sido sequer colocado na Constituição (quanto mais aprovado) por ferir um dos quatro preceitos: clareza, concisão, precisão e realidade, como veremos adiante. Aliás, analisando-se os institutos jurídicos das últimas 4 ou 5 décadas (ou mais) no Brasil veremos que, além da quantidade de leis vigentes no Brasil ser absurda - em torno de 190 mil leis vigentes -, elas não são, em sua esmagadora maioria, claras nem concisas nem precisas e nem reais.
   Os artigos, incisos, letras, etc, das leis devem ser claros, concisos e precisos no tocante à sua escrita formal, a saber:
   Claro: compreensível, sem dúvida, inequívoco;
   Conciso: sucinto, expressar um conteúdo sem excesso de palavras;
   Preciso: exato, ir direto ao ponto.
   Porém, além dos preceitos acima, o legislador deve levar em conta, também, a realidade da aplicação prática da lei, como veremos no exemplo adiante.
   O objetivo final de toda Lei é mudar o comportamento da sociedade, seja para melhor ou para pior, e leis mal escritas causam estragos quase irreparáveis na sociedade.
   Tomando-se como exemplo o inciso LVII posso depreender ele é conciso, mas não é, principalmente, claro e, secundariamente, preciso.
   A concisão desse inciso reside na expressão do conteúdo sem excesso de palavras.
   Peca na sua clareza porque não deixa claro, obviamente, se é possível ou não a prisão em segunda - ou qualquer instância que for -, no ordenamento jurídico brasileiro.
   E tem uma certa precisão porque trata da presunção de inocência, mas não define exatamente a partir de quando se deve dar a prisão ao culpado; a popular “brecha” na lei: deixa no ar a interpretação.
   Caso o inciso LVII tivesse a seguinte escrita: “Ninguém poderá ser PRESO até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”, teríamos um inciso claro, conciso e preciso, mas que não seria real, não seria aplicável na realidade física. Aí está a realidade da lei, a aplicabilidade prática da lei.
   Tendo o inciso LVII a escrita acima, ninguém mais seria preso aqui no Brasil por qualquer crime que cometesse devido à demora nos processos judiciais, demora esta que não me cabe no momento analisar. Mas posso aventar a possibilidade de que, em sendo as leis claras, concisas e precisas, essa demora se reduziria automaticamente, pois leis claras, concisas e precisas deixam pouca ou nenhuma margem às interpretações e permitem recursos às instâncias recursais somente quando houver necessidade de recurso por um erro no processo, falta de indícios e/ou provas, etc.
   Outro exemplo de escrita do inciso LVII: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, mas o tribunal poderá determinar a execução provisória das penas privativas de liberdade, restritivas de direitos ou pecuniárias, sem prejuízo do conhecimento de recursos que vierem a ser interpostos”. Ou, em uma linguagem mais popular: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, mas poderá ter a execução da sentença determinada por decisão em segunda instância”. Lembro aqui para ficarem atentos na diferença entre “poderá” e “deverá”.
   Apesar de que, para mim, execução da pena, presunção de inocência, prisão, etc, não são matérias que se coloquem na Constituição. Por causa de aberrações jurídicas como esta é que a nossa suposta constituição não passa de um mero catálogo de artigos. É uma estrovenga enorme que, agindo de traição, penetrou fundo no Brasileiro e abriu rombos na sociedade... se é que me entendem.
   Outro ponto: o Brasil é o único país do mundo que tem quatro instâncias, vamos por assim dizer; a primeira instância são as comarcas, a segunda instância são os Tribunais de Justiça, e o STJ (Superior Tribunal de Justiça) e o STF (Supremo Tribunal Federal) são as instâncias recursais.
     O que vemos no ordenamento jurídico brasileiro é o excesso de recursos baseado nas famosas “brechas” na lei. Essas famosas “brechas” na lei nada mais são do que as margens excessivas de interpretação porque a lei, no seu texto escrito, ou não é clara ou não é concisa ou não é precisa, como vimos no exemplo do inciso LVII do artigo 5º da Constituição Brasileira. Aliás, chegamos ao ponto em que o excesso de recursos já se constitui por si mesmo uma "brecha" na lei onde o réu utiliza esse instituto para protelar a execução da pena.
   O excesso de margem à interpretação nas leis, leva ao autoritarismo de um ser humano sobre os outros, substitui a paz pela desordem e substitui a duração das instituições pela sua derrocada. É exatamente para evitar o caos, a corrupção, a desordem, que as leis devem ser claras, concisas e precisas e devem ter aplicabilidade prática na realidade física.
   Os legisladores, ao formular uma lei, devem, obrigatoriamente, seguir estes preceitos de clareza, concisão, precisão e realidade.
   A votação no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a prisão em segunda instância já ocorreu 4 vezes nos últimos anos e está indo para uma quinta vez, onde, novamente, o STF decidirá arbitrariamente, ao sabor do momento, a prisão ou não em segunda instância. E o STF perde tempo e dinheiro discutindo questões que já deveriam estar expressas na lei.
   Vemos que, por um erro causado pela incompetência do legislativo ao formular e aprovar abestalhadamente um inciso na Constituição, promove toda esta balbúrdia no Brasil no que concerne a uma pequena parcela do ordenamento jurídico. Estenda-se isto à maioria do ordenamento jurídico e temos o que temos no Brasil.
   Ao analisar-se a Constituição (e outras leis) no Brasil veremos que sua esmagadora maioria é mal formulada, mal escrita e não tem aplicabilidade prática. Donde conclui-se que no Brasil temos um excesso excessivamente excessivo de simulacros de Leis, ou seja, não temos Leis: é uma terra sem Lei onde impera a mentira, a politicagem, a ladroagem, a corrupção, crimes variados, maus valores, etc.
   Quem pode mais, chora menos; mas, de qualquer maneira, todos choram. Até quando?