Já há algum tempo - milênios ou milhões de anos, dependendo
se você raciocina com criacionismo ou evolucionismo -, temos no mundo um
sistema hierárquico em forma de pirâmide onde a “autoridade” é exercida de cima
para baixo.
A palavra “autoridade” está entre aspas porque seu sentido original
foi deturpado. Autoridade, no seu sentido original, vem de autor, que implica
responsabilidade por suas palavras e por seus atos (tem a ver com moral). É
diferente de autoritarismo, que implica falta de responsabilidade por suas
palavras e seus atos (falta de moral).
As “autoridades constituídas”, na verdade são autoritários
constituídos. É evidente que uma autoridade constituída pode (e deve) ter moral
nas suas palavras e nos seus atos. Porém, o sistema da pirâmide favorece que
uma autoridade se transforme em um autoritário, pois este é investido somente
de poder legal, enquanto aquela, além do poder legal deve, obrigatoriamente,
ter moral.
Não vou, no momento, discorrer sobre o que é moral e como adquiri-la,
até porque outros já fizeram isto com mais propriedade e autoridade. Mas vou
assumir, para o presente estudo, o sentido de “moral” como aquele que está no
senso comum, no imaginário: ter virtudes tais como ser honesto, ter conduta
reta, ter coragem, ter respeito para com os outros, ter bons valores, ter bons
costumes, ser respeitado. Tal sentido não contém toda a definição do que é
moral, mas encerra perfeitamente a compreensão do que é moral e, por
conseguinte, como adquiri-la.
O sistema da pirâmide do qual escrevo é, por assim dizer, um
esquema mental no qual, como já foi dito, as ordens emanam de cima para baixo
não importando se quem está embaixo concorda ou não.
Esquematicamente, o sistema é o que está na
figura abaixo:
É
simples; uma pirâmide dividida em camadas onde na base está o número maior de
pessoas. Podem ser poucas ou várias camadas, dependendo do grupo de pessoas que
estamos analisando. Poderia até ser feita uma pirâmide da hierarquia mundial.
Lembre que uma pirâmide tem três dimensões: altura, largura
e profundidade (ou comprimento).
Ao analisar o organograma de qualquer empresa privada,
instituição pública, família, grupo temporário de pessoas, seja o que for em se
tratando de coletividade, temos uma pirâmide; basta traçar três retas formando
um triângulo.
Analisando-se, neste sentido, as três religiões reveladas:
Cristianismo, Judaísmo e Islamismo, representadas por seus respectivos livros
sagrados, temos o mesmo sistema piramidal, a saber, de forma genérica: em cima
Deus, na camada logo abaixo anjos (ou outra denominação), depois messias,
profetas, santos, etc, e assim sucessivamente até chegarmos nos seres humanos ou nos chamados “espíritos
inferiores ou malignos” que habitam o que chamam de inferno (ou outra
denominação). Destas últimas duas classes, não sei qual tem em maior quantidade por isso não posso precisar qual é a base dessa pirâmide: nós ou os demônios.
Este pensamento de hierarquia está presente como um esquema
mental no senso comum das pessoas na realidade física, no mundo físico no qual
vivemos.
A noção de hierarquia é intrínseca no ser humano, faz parte
dele. O ser humano sempre obedeceu a alguém e/ou sempre mandou em alguém.
Aquele que não obedece a ninguém e não manda em ninguém está vivendo sozinho
isolado fisicamente por conta própria.
Alguém poderá dizer: -“Eu não obedeço ninguém, sigo minha
própria cabeça”. Isto é ilusão! Caso alguém dê um conselho para este alguém e
este alguém seguir o conselho, no todo ou em partes, ele obedeceu. “Obedecer a
alguém” não é um termo pejorativo, faz parte da vida em coletividade, bem como
mandar. As pessoas confundem obedecer com submeter-se, obediência com
submissão. E confundem autoridade com autoritarismo.
O sistema da pirâmide, por falta de uma nominação melhor,
enquanto esquema mental, pode ser encontrado também na filosofia de um modo
geral e, como exemplos, cito Aristóteles e Platão. Poderia citar outros
filósofos desde os tempos antigos até os dias atuais, porém, a lista ficaria muito
extensa.
Este conceito geral, esta apreensão intelectual da essência
deste modelo de hierarquia, está profundamente arraigado na mentalidade do ser
humano. São milênios - ou milhões - dessa mentalidade penetrando na consciência
humana, cuja repetição subliminarmente intensa atingiu o subconsciente afetando as
emoções, as vontades, os desejos, os sentimentos, as opiniões, etc.
Poderia dizer que esta mentalidade vem desde a queda do
paraíso. Poderíamos culpar Moisés por isso, pois, supostamente, foi ele quem
escreveu o Gênesis e, de quebra, colocou na cabeça da maioria da humanidade a “recompensa
da vida eterna”, que um dia voltaremos para junto de Deus, basta respeitar a hierarquia
da pirâmide nesta vida física. O próprio Jesus Cristo estabeleceu
hierarquicamente que “ninguém vai ao Pai senão por mim”. Maomé fez algo
semelhante no Islamismo. Das três religiões reveladas somente o Cristianismo
tem um esquema mental um pouco diferente das outras duas: existe um messias com
nome e rosto que voltará um dia. No Judaísmo e no Islamismo existe o messias,
mas somente se saberá quem é o messias quando ele próprio se revelar. É uma coisa meio assim misteriosa. Em alguns
rabinos ortodoxos, já de idade avançada, esse esquema mental de não precisar de
intermediários para chegar em Deus ainda é presente. Porém, o Talmud - a Torah
oral escrevinhada - estabeleceu há tempos mais um nível intermediário entre Deus e os
judeus, bem como o Novo Testamento no Cristianismo. O
Islamismo é submissão pura e simples.
Sendo a religião - enquanto conceito - a infância da
filosofia, é através dela, da religião, que certos esquemas mentais, certas
mentalidades e certos pensamentos entram na mente dos seres humanos, principalmente
na infância não metafórica.
Na modernidade outras correntes de pensamento estão entrando
no lugar das religiões, no entanto, o sistema piramidal está se tornando cada
vez mais forte.
Não vejo nenhum problema em estabelecer-se uma hierarquia
nas relações humanas entre os seres humanos e entre os seres humanos e os
mundos físico e metafísico (ou espiritual).
A questão básica é: “o que devemos reconhecer e respeitar na
hierarquia? ”
A resposta é: a moral.
O caminho para a escravidão é aceitar um autoritário
mascarado de “autoridade” imposta de cima para baixo posto que toda “autoridade”
surgida assim não tem moral na sua essência. A autoridade - no verdadeiro
sentido da palavra - tem moral e é autoridade justamente por ter moral.
Em tempos modernos, a autoridade sem moral é o que se chama
de opressor, pois todo opressor é autoritário. Uma pessoa que cultiva a moral em
si e, por decorrência, nos outros, jamais será opressora e jamais será oprimida. Mesmo que o pior dos
opressores entre na sua vida, ela jamais será oprimida, pois a coragem para
lutar vem da força moral e a força moral vem da certeza de que se está fazendo
o certo, o bem e o justo para si e para os outros. E quando ficar em dúvida
entre “se dar bem” e prejudicar alguém, escolha com coragem e depois chore com os castigos ou alegre-se com as recompensas, pois uma dessas duas virá com a mesma certeza da morte.
E lembre-se sempre que, nessa
escolha, é possível todos saírem ganhando, uns mais, outros menos, mas faça a
sua escolha na rotina diária de modo que todos possam sair ganhando. Esta deve
ser a hierarquia da vida.
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