sábado, 18 de abril de 2020

Método Laubach ou Método Paulo Freire?

RESUMO
O presente artigo tem por escopo, entre outras coisas, analisar o conteúdo do artigo Método Paulo Freire ou Método Laubach?, do historiador David Gueiros Vieira, no qual o mesmo levanta a hipótese de que o educador Paulo Freire, Patrono da Educação Brasileira, teria plagiado seu método do professor norte-americano Frank Charles Laubach. Para tanto, iniciei comparando as informações contidas no artigo do historiador com as informações de duas biografias oficiais de Paulo Freire mostrando as discrepâncias entre as mesmas. Em seguida busquei na Hemeroteca Digital Brasileira (Biblioteca Nacional) notícias em periódicos da época entre 1940 e 1949 para comprovar ou discordar das informações do artigo. As buscas referem-se à época e ao tempo de permanência de Frank. C. Laubach em território brasileiro e à análise das informações contidas. O presente estudo concentrou-se no artigo que originou a alegação de plágio inculcando a ideia de que Paulo Freire teria feito uma cópia do método do professor Laubach, sendo este artigo utilizado como uma das referências no livro Desconstruindo Paulo Freire e no Projeto Escola sem Partido que tramita na Câmara Federal. Após a análise, concluí que não há provas do referido plágio como alegado no artigo.
Palavras-chave: Paulo Freire, Laubach, Método.


Introdução
O artigo do historiador David Gueiros Vieira Método Paulo Freire ou Método Laubach?, publicado em 09 de março de 2004, aborda a hipótese de que Paulo Freire teria elaborado uma artimanha que pegou e o método que hoje é conhecido como Método Paulo Freire foi apadrinhado por toda a esquerda, nacional e internacional, inclusive pela ONU e é nada mais do que uma cópia do Método Laubach, porém com teor filosófico totalmente diferente.
David Gueiros Vieira é PHD em História da América Latina, Mestre em história dos Estados Unidos da América, conferencista e um dos maiores especialistas brasileiros em História da Questão Religiosa do Brasil segundo o site do Núcleo de Estudos de História Social da Cidade (NEHSC) da Coordenação Fortaleza (Fortaleza-CE), da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e faleceu em 30 de novembro de 2017 aos 88 anos.
Seu artigo ganhou popularidade no Brasil, principalmente na internet, sendo usado atualmente como uma das referências no Livro Desconstruindo Paulo Freire (p. 115) e no Projeto Escola sem Partido que tramita na Câmara Federal.
O texto abaixo é apenas uma parte e foi publicado originalmente no site Mídia sem Máscara (www.midiasemascara.org/) que está fora do ar ou não existe mais.
O artigo completo pode ser encontrado na internet e no acervo do Instituto Paulo Freire no link:


Naquele ano, de 1943, o Sr. Paulo Freire já era diretor do Sesi, de Pernambuco — assim ele afirma em sua autobiografia — encarregado dos programas de educação daquela entidade. No entanto, nessa mesma autobiografia, ele jamais confessa ter tomado conhecimento da visita do educador Laubach a Pernambuco. Ora, ignorar tal visita seria uma impossibilidade, considerando-se o tratamento VIP que fora dado àquele educador norte-americano, pelas autoridades brasileiras, bem como pela imprensa e pelo rádio, não havendo ainda televisão. Concomitante e subitamente, começaram a aparecer em Pernambuco cartilhas semelhantes às de Laubach, porém com teor filosófico totalmente diferente. As de Laubach, de cunho cristão, davam ênfase à cidadania, à paz social, à ética pessoal, ao cristianismo e à existência de Deus. As novas cartilhas, utilizando idêntica metodologia, davam ênfase à luta de classes, à propaganda da teoria marxista, ao ateísmo e a conscientização das massas à sua “condição de oprimidas”. O autor dessas outras cartilhas era o genial Sr. Paulo Freire, diretor do Sesi, que emprestou seu nome à essa “nova metodologia” — da utilização de retratos e palavras na alfabetização de adultos — como se a mesma fosse da sua autoria. Tais cartilhas foram de imediato adotadas pelo movimento estudantil marxista, para a promulgação da revolução entre as massas analfabetas. A artimanha do Sr. Paulo Freire “pegou”, e esse método é hoje chamado Método Paulo Freire, tendo o mesmo sido apadrinhado por toda a esquerda, nacional e internacional, inclusive pela ONU (VIEIRA, 2004).

Biografias
Ao analisar o texto completo, principalmente no que concerne à biografia de Paulo Freire, pois segundo consta no artigo, o missionário Frank Charles Laubach (1884-1970) visitou o Brasil em 1943 e o autor cita que, segundo a autobiografia do próprio Paulo Freire, ele, neste ano, era diretor do SESI de Pernambuco:
 No entanto, nessa mesma autobiografia, ele jamais confessa ter tomado conhecimento da visita do educador Laubach a Pernambuco. Ora, ignorar tal visita seria uma impossibilidade, considerando-se o tratamento VIP que fora dado àquele educador norte-americano, pelas autoridades brasileiras, bem como pela imprensa e pelo rádio, não havendo ainda televisão.

Na bibliografia do artigo de Vieira não consta a citada autobiografia de Paulo Freire e também não consta o livro Paulo Freire, uma Biobibliografia (GADOTTI et al., 1996), publicado em 1996.
No livro Paulo Freire, uma Biobibliografia (GADOTTI et al., 1996) encontra-se que Paulo Freire nasceu em Recife, PE, em 19 de setembro de 1921 (p. 28), sendo que faleceu em 2 de maio de 1997. Paulo Freire em 1943 tinha, então, 22 anos de idade. Na mesma obra consta que Freire ingressou aos 22 anos de idade na secular Faculdade de Direito do Recife e casou-se, em 1944, antes de concluir seus estudos universitários, com a professora Elza Maria Costa Oliveira. Consta ainda que Freire ocupou o cargo de Diretor do setor de Educação e Cultura do SESI de 1947 a 1954 e foi Superintendente do mesmo de 1954 a 1957 (p. 33).
        No livro Paulo Freire, uma História de Vida (FREIRE, 2017), publicado originalmente em 2005 (um ano depois do artigo de Vieira), livro este que ganhou o 2º lugar do Prêmio Jabuti 2007 na categoria Biografia, de Ana Maria Araújo Freire, viúva de Paulo Freire, sua segunda esposa, consta que Freire ingressou como aluno no Colégio Oswaldo Cruz (COC) em Recife no ano de 1937 (p. 57) e de 1939 a 1941 atuou como auxiliar de disciplina e em 1941 foi promovido para professor de língua portuguesa tendo lecionado no COC até 1947 (p. 67). Então em 1943 Paulo Freire estava no COC, ano em que ingressou na Faculdade de Direito de Recife e ficou até 1947:
Paulo começou a trabalhar no SESI-PE em 01 de agosto de 1947 [tinha então 25 anos], como assistente da Divisão de Divulgação, Educação e Cultura, nomeado pela Portaria n. 20, de 17/7/1947, assinada por Cid Feijó Sampaio, diretor do Departamento Regional do SESI, de acordo com a Portaria n. 113 do então Ministro do Trabalho, Indústria e Comércio, Art. 22, alínea h, de 20/7/1946, devendo perceber um salário mensal de Cr$ 2.000,00 (dois mil cruzeiros). Nesse mesmo ano, quando completou a graduação em bacharel em Direito, Paulo foi promovido a diretor da Divisão de Educação e Cultura, através da Portaria n. 43, de 19/11/1947, assinada pelo mesmo diretor do Departamento Regional do SESI, de acordo com o Regulamento do SESI, Art. 22, alínea h, aprovado pela Portaria do MTIC, n. 113, de 20/7/1946, com o salário mensal de Cr$ 4.000,00 (quatro mil cruzeiros) (pp. 71-72).


        Lembrando que a visita do missionário Frank Charles Laubach ocorreu em 1943 e que o método Paulo Freire ficou conhecido em 1963 por ocasião das 40 horas de Angicos.
       Temos aí um hiato de 20 anos entre a visita de Frank C. Laubach e a implementação do Método Paulo Freire.


Periódicos
Para solucionar o problema de datas ocasionado pelo artigo do historiador David G. Vieira, recorri ao site da Biblioteca Nacional Digital do Brasil da Fundação Biblioteca Nacional, fundação pública vinculada ao Ministério da Cultura. A Biblioteca Nacional (BN) é o órgão responsável pela execução da política governamental de captação, guarda, preservação e difusão da produção intelectual do Brasil, órgão este com mais de 200 anos de história, é a mais antiga instituição cultural brasileira. A BN se caracteriza como uma biblioteca nacional por:
•    ser beneficiária do instituto do Depósito Legal;
    elaborar e divulgar a bibliografia brasileira corrente, através dos Catálogos online;
   ser o centro nacional de permuta bibliográfica, com campo de ação internacional.
         Temos duas formas de acesso ao site da Biblioteca Nacional Digital:

 1 - http://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-digital/

        Optei pelo link 1 por apresentar resultados mais completos.
Ao acessar o site da Hemeroteca Digital Brasileira efetuei a pesquisa na aba Período com os parâmetros Período: 1940-1949; Local: Todos; Periódicos: Todos; e Termo de pesquisa: Laubach; como podemos ver na figura abaixo:

Figura 1. Tela de Pesquisa 1

                                                                      Fonte: O Autor (2018).

        A pesquisa retornou 61 ocorrências com o termo Laubach na consulta em 275 acervos e 4.278.858 páginas:

Figura 2. Tela de Resultados 1

Fonte: O Autor (2018).


Figura 3. Tela de Resultados 2
Fonte: O Autor (2018).


As 61 ocorrências, como podemos ver na parte de cima da figura 2 ao lado do botão Pesquisar em azul, estão distribuídas em 20 jornais (figuras 2 e 3): 12 do Rio de Janeiro, 1 de Pernambuco, 2 do Maranhão, 1 do Rio Grande do Sul, 1 da França, 1 de São Paulo, 1 do Rio Grande do Norte e 1 de Minas Gerais. Dessas 61 ocorrências, 58 tratam do professor Fank Charles Laubach e as outras 3 são casos de homônimos não tendo relação com o presente estudo.

Em análise prévia das 58 ocorrências, selecionei aquelas que tem relação direta com presente estudo.
        Pesquisando nos resultados retornados encontrei a mesma notícia em 3 jornais: A MANHÃ (RJ), JORNAL DO BRASIL (RJ) e GAZETA DE NOTÍCIAS (RJ), neste último, edição 00055(1), datada de 6 de março de 1943, ocorrência 2, página 2, a notícia abaixo:

                                                                          Figura 4. Notícia 1


Fonte: Gazeta de Notícias (RJ), Hemeroteca Digital Brasileira (2018).


O Brasil poderá abrigar 900 milhões de habitantes
Novo método de alfabetização - Seu emprego em grande escala no nosso país
O Dr. Frank C. Laubach, representante do “Comitê para a Alfabetização do Mundo”, de Nova York, que acaba de regressar ao seu país, depois de uma permanência de mais de dois meses no Brasil (o grifo é meu), visitou também a Colômbia, o Equador, o Peru e a Bolívia, procurando introduzir o seu “Método Chave” destinado à alfabetização de adultos onde obteve os melhores resultados”.

Então vemos que Laubach permaneceu de dois a três meses no Brasil em 1943.
Depois a notícia segue trazendo informações sobre seu método e sua aplicação no Brasil, entre outras coisas:

“Esse método é tão fácil que qualquer pessoa pode ensinar a outra sem ter necessidade de um treinamento especial. Em português, esse método consta de 12 lições, cada uma das quais exige de 20 a 30 minutos de estudo. Dessa forma o professor precisa apenas dedicar umas 6 horas de ensino real a seus alunos, pois o estudante poderá completar o resto por si mesmo. Os professores voluntários deverão ensinar apenas a um aluno de cada vez.
O governo brasileiro - declarou o dr. Laubach - experimentará esse novo método até obter resultados práticos de suas possibilidades de êxito, empreendendo então uma campanha em grande escala para sua divulgação. Todas as pessoas alfabetizadas terão exortadas a cumprir o dever patriótico de “dedicar 6 horas ao Brasil”. Se esse apelo for correspondido na amplitude que é de esperar, dentro de 2 anos não haverá mais analfabetos no Brasil. [...]
O tempo de aprendizagem depende em grande parte do número de letras de cada alfabeto. No caso de idiomas em que o alfabeto tem poucas letras como acontece na Malásia e no Havaii, a aprendizagem pode ser feita num único dia. Na Espanha e em Portugal, um aluno inteligente pode aprender a ler todas as letras de seu vocabulário comum em apenas uma semana ou 10 dias. Os adultos conhecem em média 5.000 palavras, enquanto as crianças conhecem apenas umas 600 ou 700.
Eis a razão pela qual os adultos podem aprender mais rapidamente. [...]
        Não posso deixar de consignar também minha profunda admiração pela maneira como o Brasil conseguiu resolver o seu problema racial. As raças aqui se misturam sem nenhum preconceito, como nunca vi em parte nenhuma do mundo. Domina aqui também um espírito de bondade e caridade que excede o de qualquer outro país. Se há no mundo um país que se pode considerar um verdadeiro paraíso - esse país é o Brasil. Exceto para os analfabetos, mas acredito que esse problema fundamental estará dentro em breve resolvido”.

A notícia acima, aparentemente, não tem o nome do autor. Procurei o expediente nos jornais para averiguar se encontrava o nome dos autores das notícias, mas não logrei êxito em encontrar o expediente. Como o nome do autor da notícia não se faz tão necessário para o presente estudo, não me aprofundei nesta busca, pois o que interessa é o tempo de permanência de Laubach no Brasil.
Conforme apurei - e tais dados podem ser facilmente verificados por outros pesquisadores - o Dr. Laubach esteve no brasil em 1943 permanecendo aqui por mais de dois meses, de março até maio, aproximadamente, sendo que nesta época Paulo Freire tinha 22 anos de idade, trabalhava como professor de língua portuguesa no Colégio Oswaldo Cruz (COC) em Recife e ingressava na Faculdade de Direito de Recife onde ficou até 1947.
Não encontrei a autobiografia de Paulo Freire citada pelo historiador David G. Vieira onde ele afirma que Freire declarou que em 1943 já era diretor do SESI de Pernambuco. Contudo, mesmo que Freire tivesse afirmado isso, os documentos aqui citados não comprovam o fato, pois Freire ocupou o cargo de Diretor do setor de Educação e Cultura do SESI de 1947 a 1954 e foi Superintendente do mesmo de 1954 a 1957.
Lembrando que Paulo Freire ganhou notoriedade com seu método em janeiro do ano de 1963 no fato conhecido como As 40 horas de Angicos, porém, em 1960 Freire já realizava trabalhos com educação fazendo parte do Movimento de Cultura Popular (MCP) como um de seus líderes mais atuantes dirigindo a Divisão de Pesquisas. O método utilizado pelo MCP era diferente do Método que viria a ser conhecido como Método Paulo Freire, pois aquele utilizava-se bastante de cartilhas e este, como se sabe, não enfatizava o uso de cartilhas, além do que, o método do MCP era estruturalmente diferente do Método Paulo Freire.
No tocante à questão do plágio sugerido pelo historiador David G. Vieira posso adiantar que esta é uma questão difícil de aventar, pois, como veremos abaixo, na época foi levantada a hipótese de o próprio Frank Laubach ter plagiado seu método do professor brasileiro Ribeiro Campos.
        Na edição de 26 de fevereiro de 1947, edição 00046(1), página 6, ocorrência 4, do JORNAL DO BRASIL (RJ), assinada pela mesma inicial F., na coluna Educação e ensino com o título Um ensina ao outro, no trecho que interessa ao presente estudo vemos o seguinte:
“Há no método de Laubach dois pontos essenciais: o didático, que combina estampas e palavras para inocular a faculdade de ler nos mais rudes analfabetos e o propriamente pedagógico, que confere a qualquer indivíduo, apenas alfabetizado, o encargo de inculcar aos outros o segredo de sua libertação. Este último, confessa Laubach a um repórter de Seleções, não foi invenção sua, mas lhe foi sugerido por um cacique alfabetizado das Filipinas, que, contaminado pelo missionário, lhe oferecera esta receita infalível: “Todo aquele que já está alfabetizado terá que ensinar a outro que não o esteja. E quem não fizer isto, mando matar”. O nome deste truculento alfabetizador não ficou perpetuado na história, mas o seu método, logo endossado por Laubach, ficou conhecido pelo dístico: “Um ensina ao outro” e diz o repórter “que desde então se espalhou pelo mundo”.
A educação deste evangelizador atingiu o próprio coração do Mahatma Gandhi. “Eu não considero o analfabetismo o problema magno da Índia; o problema econômico é o mais premente”, dissera-lhe, em um ... [palavra ilegível] de bom senso, esse profeta singular. Mas floreteando com astúcia, seu interlocutor objetivou-lhe que, se ele Gandhi fosse analfabeto, milhões de criaturas que o admiram jamais teriam ouvido falar dele. “Eu me vi atrapalhado por um momento, confessa o Dr. Laubach, mas subitamente uma resposta perfeita me pareceu vir do céu. O Sr. tem razão, Sr. Gandhi, disse-lhe eu, mas se, porventura o Sr. fosse analfabeto e não tivesse escrito livros tão valiosos e também nós não os soubessemos ler, milhões de criaturas que o admiram jamais teriam ouvido falar do senhor”. Colocado em face da possibilidade dessa catástrofe, Gandhi capitulou e, em breve, entrou no combate ao analfabetismo, dizendo: “Se cada um que aprender tomar a seu cargo ensinar a um ignorante, em pouco tempo poderemos alfabetizar toda a Índia”. E assim, sob os auspícios dessa figura tão mundialmente famosa, adquiriu novo prestígio o processo do cacique filipino de ‘Um ensina ao outro’”.

        No total são sete escritos na coluna Educação e Ensino, assinadas pelo mesmo F. Não irei transcrevê-las todas, mas a transcrição do trecho abaixo da edição 00049(1), datada de 01 de março de 1947, ocorrência 5, página 10, do mesmo JORNAL DO BRASIL (RJ), com o título O Método Laubach, também é pertinente ao estudo:
“Confundir os propósitos dessa campanha com os objetivos confessados de Laubach, é estabelecer uma tremenda confusão, que perturbará toda gente. Laubach nada inventou, afinal. Seu sistema de combinar estampas e palavras para facilitar a aprendizagem da leitura é um dos mais antigos que se conhecem. E nossos livros didáticos infantis sempre o usaram. Sabe-se também que, para ensinar a ler rapidamente, sobretudo a indivíduos isolados, todo processo é bom, até mesmo o da soletração, que era usado geralmente no Brasil até o século passado. O que faz simpatizar com Laubach é o seu ardor missionário, que o leva a peregrinar pelo mundo, procurando tornar possível a criação simples e legível de alfabetos, em países em que não havia nenhuma noção de uma linguagem escrita. Fora daí, todo o seu esfôrço é perdido. Ao seu processo pode se equiparar o do Professor patrício Ribeiro de Campos, que adota os mesmos recursos para os mesmos objetivos. E tão semelhantes são os dois processos (e tão fúteis e pouco originais), que Laubach está sendo acusado, insistentemente, de haver plagiado o Professor Ribeiro, quando o mais provável é que nunca tenha ouvido falar dele, nem de sua pedagogia brachipedeutica”.

        Com relação ao trecho da coluna transcrito acima encontrei na edição 12484(1), ocorrência 3, página 2, do jornal A NOITE (RJ), datada de 05 de fevereiro de 1947:

Figura 5. Notícia 2
 


Fonte: A Noite (RJ), Hemeroteca Digital Brasileira (2018).

O AMERICANO TERIA PLAGIADO O MÉTODO PEDAGÓGICO DO PROFESSOR BRASILEIRO
Fala a A NOITE o Sr. Ribeiro de Campos, inventor do sistema Brachypedêutico - Como alfabetizar os adultos - Observações à margem da campanha promovida pelo Ministério da Educação
Às vésperas da execução do Plano de Educação para Adultos, falou a A NOITE o Sr. B. Ribeiro de Campos que foi diretor da extinta “Campanha Pró Alfabetização do Brasil”, cuja finalidade era criar escolas para adultos.
Imitação Servil
- É certo que seu método de ensino - o Brachypedêutico - está sendo plagiado por um missionário americano?
- De fato. No número de dezembro de 1944, as Seleções do Reader’s Digest trazem, como seu primeiro artigo, a entrevista com o missionário Dr. Fank C. Laubach, que faz uma cópia fiel de algumas lições do meu livro “Como aprender a Ler e a Escrever” que foi publicado em 1937. Até mesmo as recomendações que faço ao professor são copiadas quase com as mesmas palavras, alterada apenas a ordem.

- Que pretende?
- Pretendo dar à publicidade a 2ª edição da referida obra, revista e melhorada, certo de que irá desempenhar o papel que o jornalista americano Mc Evoy previu, referindo-se ao missionário Laubach”.


            Em 6 de fevereiro de 1945 (dois anos antes das duas notícias anteriores), na edição 07601(1), página 9, do jornal O JORNAL (RJ), a notícia “Alfabetização ao fim de dezesseis lições” já falava de plágio do método brasileiro do professor Ribeiro Campos (nas notícias o nome do professor está grafado de duas maneiras, Ribeiro Campos e Ribeiro de Campos):


PLÁGIO DE UM MÉTODO BRASILEIRO
            Mas é que entre nós já existe um método racional de alfabetização, cujo autor se sente plagiado pelo dr. Laubach no princípio fundamental de seu método, que é o da supressão da memória e a substituição desta pelo uso de um dos aspectos da imaginação. Nesta base científica o professor Ribeiro de Campos, doutor em filosofia e letras pela Faculdade de S. Bento (São Paulo), elaborou em 1928 um sistema de racionalização do ensino, ao qual ele chamou de “Pedagogia Brachypedêutica”, que quer dizer - ensino breve.

        Muitos alunos não apresentam os progressos que devem apresentar, mais por falta de preparação didática dos professores do que por sua incapacidade psicológica - diz-nos o autor do método nacional. Édison, o gênio das invenções, foi, quando criança, expulso da escola que frequentava porque, dizia o professor, era supinamente estúpido. Os motivos de fracasso (fora os casos de anomalia) são, portanto, de ordem patológica ou pedagógica. Partindo desse princípio, observado ao vivo em duas de suas sobrinhas aparentemente retardadas, aquele professor voltou-se para os estudos de psicologia e pedagogia infantis e conjugou mais intimamente os dois aspectos do ensino: o fator método e o fator psicológico. E, seu método, o ensino é ministrado pelo aspecto objetivo, que facilita a matéria dentro da própria matéria; pelo aspecto psicológico, que facilita a matéria em face do aluno e pelo sistema de imagens para substituir a memória, cujo emprego tanto se verifica nos métodos comuns, principalmente pelo estudo pessoal do aluno fora da classe.         Na orientação braquipedêutica, esse estudo é dispensado em virtude de um dos aspectos da imaginação que compreende as percepções auditivas, percepções visuais e modificações anátomo-fisiológicas do aparelho de fonação com as respectivas imagens.

Trata-se justamente do processo que o dr. Laubach adotou. O educador brasileiro, porém, está tranquilo. Acha que apenas 5% de seu sistema teria sido imitado e até se orgulha que com tão pouco o missionário americano, ou seu articulista, possam curar o mundo do analfabetismo assim tão rapidamente. Mas não lhe consta que exista em língua portuguesa, a não ser o livro de sua autoria publicado em 1935, outro trabalho ... [palavra ilegível] dentro do seu sistema. Por outro lado, estranha a velocidade do suposto método de Laubach, porque 16 lições não chegam a representar a mínima parte dos fonemas necessários à alfabetização em língua portuguesa ou em língua espanhola. E muito menos lições de cinco minutos. Duvida também o professor Ribeiro Campos daquela concepção de Gandhi, segundo a qual o líder político e intelectual da Índia relega a plano secundário o analfabetismo de seus concidadãos. Também lhe parece gratuita a afirmação de que a Índia tenha 225 línguas, quando nem o mundo inteiro atinja a esse número”.

Plágio
            O plágio trata-se de uma questão de ética e de uma questão jurídica. Segundo Galuppo, 2011:

Podemos definir o plágio como cópia dissimulada da forma de obra exteriorizada de terceiro com o intuito de passar-se por seu autor. Duas consequências decorrem dessa definição. Em primeiro lugar, o que a lei de direitos autorais protege é a forma da obra, e não a ideia nela contida (art. 8º, inciso I da lei 9.610/1998). Em segundo lugar, o que caracteriza o plágio não é a identidade objetiva entre os textos (que caracterizaria a apropriação de obra alheia), mas a simples intenção subjetiva de copiar. Sobre o primeiro aspecto, e no caso de textos científicos, a lei é clara, afirmando: “No domínio da ciência, a proteção recairá sobre a forma literária ou artística, não abrangendo o seu conteúdo científico ou técnico, sem prejuízo dos direitos que protegem os demais campos da propriedade imaterial” (§ 3º do art. 7º da lei 9.610/1998). Também estão excluídas da proteção jurídica “a citação (...) de passagens de qualquer obra, para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida justificada para o fim a atingir, indicando se o nome do autor e origem das palavras (art. 46, III da lei 9.610/1998) e as “paráfrases e paródias que não forem verdadeiras reproduções da obra originária nem lhe implicarem descrédito” (art. 47 da mesma lei) (GALLUPO, 2008).


Como pudemos ver, o que a lei de direitos autorais protege é a forma da obra, e não a ideia nela contida. Mas não obstante as questões legais, até por causa da época em que, supostamente, ocorreu o plágio do método de Laubach, a questão principal é a questão ética.
Booth et al. Elencam alguns princípios éticos:
           Os pesquisadores éticos não roubam, plagiando ou reivindicando os resultados de outros.
           Não mentem, adulterando informações das fontes ou inventando resultados.
           Não destroem fontes nem dados, pensando nos que virão depois deles.
   Outros princípios da ética da pesquisa são menos óbvios, mas implícitos:
           Pesquisadores responsáveis não apresentam dados cuja exatidão têm motivos para questionar.
           Não encobrem objeções que não podem refutar.
           Não ridicularizam os pesquisadores que têm pontos de vista contrários aos seus, nem deliberadamente apresentam esses pontos de vista de um modo que aqueles pesquisadores rejeitariam.
           Não redigem seus relatórios de modo a dificultar propositalmente a compreensão dos leitores, nem simplificam demais o que é legitimamente complexo (BOOTH et al. 2008, p. 326).
Ainda conforme Booth et al.:
Mais desafiadoras, no entanto, são aquelas ocasiões em que os princípios éticos nos levam além de proibições e exigem que ajamos com espírito de colaboração. Muitos filósofos têm afirmado que o problema ético essencial não reside apenas em evitar a violação de obrigações em relação aos outros, mas, sim, em nos unirmos a eles com um projeto mútuo de desenvolver o que os gregos chamavam de ethos, ou caráter. Ao pensarmos nas escolhas éticas dessa maneira, como uma construção mútua do ethos, já não enfrentamos mais uma escolha simples entre nossos próprios interesses e os interesses dos outros, mas o desafio de encontrar um outro caminho que seja bom para ambos (BOOTH et al., 2008, pp. 326-327).


       E essa escolha ética vale tanto para quem comete plágio quanto para quem acusa. Acusar alguém de um crime tipificado em lei sem ter provas da sua acusação, antes da questão jurídica, tem a questão ética. Faz-se necessário colher as provas através de um trabalho de pesquisa para não ser injusto com quem se acusa.


Por exemplo, o dramaturgo inglês Willian Shakespeare foi acusado de ter plagiado Romeu e Julieta de outro autor. Na verdade, na época, haveria cinco versões diferentes do drama, com pequenas alterações e novos personagens, sendo uma prática comum na época, contou. Outro escritor clássico, o espanhol Miguel de Cervantes, autor de Dom Quixote de La Mancha, chegou a escrever ao rei da Espanha contra as cópias e versões que sua obra sofria (STJ, 2012).

E este é somente um exemplo. Poderia elencar outros, alguns mais atuais, mas não se faz necessário.

Conclusão
Como vimos, a questão de plágio nestes casos depende da prova na forma da lei, pois métodos de alfabetização, e de ensino em geral, trazem vários pontos em comum como utilização de figuras, aprendizagem por meio de sílabas, letras, fonemas, etc. Acusar alguém de plágio, nestes casos, como ocorreu com base no artigo do historiador, torna-se um problema embaraçoso quando não se tem provas definitivas.
Apegar-se somente na ideia que um determinado autor teve e tentar relacioná-la à ideia de outro autor não caracteriza de modo algum o plágio. Fosse assim, todos que tiveram ou tem a ideia de escrever um livro, um artigo, ou que inventaram um método, etc., incorreriam em plágio, além disso, teríamos que perscrutar qual foi o primeiro indivíduo que teve tal ideia (tarefa monumental, senão impossível) e todos seríamos plagiários desse indivíduo. Para caracterizar plágio, a prova deve ser evidente e estar embasada em fatos, documentos e provas testemunhais, todos somados, que comprovem o plágio. Pois, como vimos, a lei protege a forma da obra e não a ideia nela contida. Caso não fosse assim, teríamos sérios problemas jurídicos, pois as ideias fazem parte dos seres humanos e não há como saber quem teve qual ideia primeiro. Por isso a lei protege a forma da obra, e não a ideia nela contida.

        Fiz um comparativo, a ser publicado, entre o Método Laubach e o Método Paulo Freire no tocante à metodologia e à forma, e encontramos algumas semelhanças e algumas diferenças entre ambos, mas as semelhanças, podemos afirmar, não configuram plágio. Independentemente da publicação posterior do comparativo, este presente estudo traz em si mesmo um conjunto de evidências, que somadas, não deixam dúvidas que a alegação do historiador, no tocante ao plágio, e de seus sucessores que, porventura, utilizam seu artigo como base, não procede.

A escolha do título Método Laubach ou Método Paulo Freire? foi devida ao título do artigo Método Paulo Freire ou Método Laubach?.
A intenção do presente estudo não foi defender ou ofender alguém, mas somente elucidar a questão. Se o Método Paulo Freire contém doutrinação esquerdista ou teor filosófico marxista que dão ênfase à luta de classes, à propaganda da teoria marxista, ao ateísmo e a conscientização das massas à sua condição de oprimidas, essa é uma outra análise a ser feita.
Não abordei aqui o fato de os métodos em questão estarem ou não registrados na forma da lei por não se fazer necessário ao estudo.

        Espero ter mantido os princípios éticos por mim elencado no presente estudo e, repetindo, não intencionei ofender alguém, mas, como os mesmos princípios éticos citam pontos de vista contrários, desde que esses pontos de vista contrários não tendam a ridicularizar alguém, fiz este presente estudo com o objetivo de encontrar um outro caminho que seja bom para ambos e espero ter contribuído para o avanço da ciência.


Referências

BRASIL. Biblioteca Nacional Digital. Hemeroteca Digital Nacional. Disponível em <http://bndigital.bn.gov.br/hemeroteca-digital/>. Acesso em 20 set. 2018.
BOOTH, Wayne C., COLOMB, Gregory G., WILLIAMS, Joseph M. A Arte da Pesquisa. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2008.
FREIRE, Ana Maria Araújo. Paulo Freire, uma história de vida. 2. ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 2017.
GADOTTI, Moacir et al. Paulo Freire, uma Biobiliografia. São Paulo: Cortez/Instituto Paulo Freire/UNESCO, 1996.
GALUPPO, Marcelo Campos. Plágio e acusação de plágio: aspectos jurídicos. In: ANAIS DA 63ª REUNIÃO ANUAL DA SBPC, Goiânia, GO, 2011. Disponível em <http://www.sbpcnet.org.br/livro/63ra/resumos/PDFs/arq_1400_404.pdf>. Acesso em 10 out. 2018.
Instituto Paulo Freire. Disponível em <http://www.acervo.paulofreire.org>. Acesso em 07 out. 2018.
JUSBRASIL. Plágio: quando a cópia vira crime. Superior Tribunal de Justiça, 2012. Disponível em <https://stj.jusbrasil.com.br/noticias/3174944/plagio-quando-a-copia-vira-crime>. Acesso em 10 out. 2018.
Projeto Escola sem Partido. Disponível em <http://www.escolasempartido.org/artigos-top/178-metodo-paulo-freire-ou-metodo-laubach>. Acesso em 10 out. 2018.
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SANTOS, Thomas Giulliano Ferreira dos et al. Desconstruindo Paulo Freire. Porto Alegre: História Expressa, 2017.
VIEIRA, David Gueiros. Método Paulo Freire, ou Método Laubach? Disponível em <http://www.acervo.paulofreire.org:8080/jspui/bitstream/7891/742/3/FPF_PTPF_01_0334.pdf> Acesso em 26 set. 2018.

sábado, 21 de março de 2020

Propriedade Privada e Comunismo

Karl Heinrich Marx

     Hoje a base do texto será o manuscrito Propriedade Privada e Comunismo de Karl Marx, cujo texto na íntegra pode ser encontrado no link ao final.
     Mas primeiro farei uma pequena introdução do método e do raciocínio de Marx (o raciocínio de Marx é uma coisa, a obra marxista é outra).
     Da análise do texto decorrerão outros desdobramentos, pois o próprio Marx não trabalhava com definições, mas trabalhava com “determinações” e ia desdobrando infinitamente o objeto da análise para concretizá-lo. Isto é fato: Marx não trabalhava com definições. Ele desdobrava o objeto infinitamente na intenção de concretizá-lo. Isto, por si, é um absurdo. Desdobrando-se um objeto de análise infinitamente como se poderá concretizá-lo?
     "Objeto" aqui é toda e qualquer coisa a se analisada. Exemplo: capital, um lápis, uma cadeira, liberdade, esperança, etc.
     Quando se desdobra um objeto desta maneira (infinitamente) o que acontece é uma confusão mental imensa (nunca saberemos o que é o objeto), pois esses desdobramentos acarretarão em outros desdobramentos e assim até o infinito. Exemplo: no Capital, Marx fala por primeiro que o capital é uma relação social, não é uma coisa, depois desdobra o capital em “determinações” e no decorrer diz que o capital pode ser moeda também (o capital teria nascido da moeda e depois a moeda se transforma em capital?!?), e moeda (dinheiro) sabemos que é uma coisa e não uma relação social, e assim Marx vai “desdobrando” infinitamente o objeto em “determinações”, vai mudando o eixo. Aliás, tanto capital quanto relação social são coisas, porém, não tem como se saber em qual sentido Marx emprega esses termos. Não há na obra marxista uma única definição de quaisquer coisas. Como dizem certos marxistas: "Se você é um leitor que pretende encontrar definições, Marx não é o autor para você".
     Mercadoria, mais-valia, etc, desafio o leitor a encontrar uma única definição de qualquer conceito básico em toda a obra marxista. Não encontrará, mas está lançado o desafio.
     Esse raciocínio (ou falta dele) de Marx, estendeu-se a todos os outros autores posteriores a ele. Basta perceber que o universo semântico das várias obras comunistas posteriores a Marx são semelhantes. As expressões utilizadas são bastantes parecidas, o estilo de escrita é semelhante, ressalvadas, claro, diferenças de estilo pessoal na escrita. Mas, no geral, são semelhantes.
     Um aluno que lê e estuda Marx (ou outro autor comunista posterior a Marx) por um, dois ou mais anos, penetra nesse universo semântico e absorve o raciocínio de Marx por osmose. Passa a repetir as mesmas expressões e passa a desdobrar as coisas em infinitas “determinações” que, aparentemente, tem uma relação com o objeto anterior, mas esta relação logo perde-se em uma relativização maluca porque o objeto é desdobrado infinitamente e não se chega a conclusão nenhuma. E sabemos que existem coisas na vida que tem definições (conceitos objetivos) e outras coisas não tem definições (conceitos subjetivos). E tem coisas que encontrar uma definição dá um pouco mais de trabalho e estudo.
     Penso eu que este método de não se trabalhar com definição nenhuma leva à loucura e ao emburrecimento, por motivos óbvios. É o desdobramento infinito do pensamento: uma coisa leva a outra, que leva a outra... e assim sucessivamente num ciclo sem fim. Não foi à toa que Marx propôs a tal “Lutas de Classes”, lutas no plural, pois a luta não é somente entre as classes, mas acontece dentro de uma mesma classe também. É a luta sem fim, ninguém mais se entende, pois vão se desdobrando os pensamentos e as argumentações, onde ninguém chega a conclusão nenhuma, mas têm-se discussões infinitas onde vai se mudando de eixo na discussão e cada um pensa que tem razão, porém, não tem razão, tem “determinações” num processo de relativizações sem fim.
     E chega-se num ponto em que um dos lados DETERMINA que está certo sem argumentação nenhuma. E isto segue-se num ciclo sem fim de lutas, brigas de egos, discussões intermináveis em torno de nada, etc. Basta ver algum debate até entre marxistas sérios para perceber que não se chega a conclusão nenhuma. Cada um tem a sua própria “determinação” a respeito da obra de Marx. Acredito que é por isso que a obra comunista no mundo é incomensurável. Cada autor, após um tempo de estudo, julga-se automaticamente apto a escrever sua própria obra encontrando novas “determinações”.
     Este raciocínio é perigoso, pois leva à mentira, à enganação. Chega um momento em que não se encontra mais uma “determinação” no objeto (as informações do objeto se esgotam) e passa-se a relativizar inventando determinações achando que essas determinações têm alguma relação com o objeto, mas não tem, pois foram tantas “determinações” extraídas do objeto que o sujeito (a pessoa que está analisando o objeto) já se perdeu numa confusão mental.
     Bom, após este breve prolegômeno, passo ao texto propriamente dito: Propriedade Privada e Comunismo. Escolhi este texto porque Marx dá umas pinceladas em Filosofia. São poucos os textos onde Marx entra em Filosofia. Sua obra é mais voltada para alguma coisa parecida com economia.
     Segue aqui todo o primeiro parágrafo, para ninguém falar que retirei citações fora do contexto. Depois vamos desdobrando em “determinações, como Marx faria:

“Todavia, a antítese entre a não-posse de propriedade e propriedade ainda é uma antítese indeterminada, não concebida em sua referência ativa às relações intrínsecas, não concebidas ainda como uma contradição, desde que não é compreendida como uma antítese entre trabalho e capital. Mesmo sem a expansão evoluída da propriedade privada, p. ex., na Roma antiga, na Turquia, etc., esta antítese pode ser expressa em uma forma primitiva. Nesta forma, ela não aparece ainda como estabelecida pela própria propriedade privada. O trabalho, porém, a essência subjetiva da propriedade privada como exclusão de propriedade, e o capital, trabalho objetivo como exclusão de trabalho, constituem propriedade privada como a relação ampliada da contradição e, pois, uma relação dinâmica que tende a resolver-se.”

     Marx começa o texto dizendo: “Todavia, a antítese entre a não-posse de propriedade e propriedade ainda é uma antítese indeterminada, não concebida em sua referência ativa às relações intrínsecas, não concebidas ainda como uma contradição, desde que não é compreendida como uma antítese entre trabalho e capital. ”
     Posso, de “cara”, perguntar: de qual antítese Marx está falando? Da antítese de Hegel?
     Para responder essas perguntas o leitor tem de ler praticamente TODA a obra de Marx (e entrar no seu universo semântico). Aí já vemos um problema em não se trabalhar com definições, em não deixar as coisas claras nos seus escritos. Não que se tenha que dar definições para tudo - isso é impossível -, mas pelo menos nos conceitos básicos se faz necessário, senão o leitor fica perdido no tempo e no espaço e isso, por si, permite ao leitor encontrar suas próprias “determinações” gerando um ciclo infinito de pensamentos desordenados que produz somente confusão mental.
     Mas vamos adiante. Não tentarei aqui dar uma definição ao que Marx chama de “não-posse de propriedade” e “propriedade”, pois se o próprio Marx não trabalha com definições, quem sou eu para fazê-lo?
     Mas posso dar minhas próprias “determinações”. Para tanto, valer-me-ei de um simples exemplo: eu alugo uma casa, tenho a posse, mas não tenho a propriedade; quem tem a propriedade é o proprietário. Estamos falando de posse, e esta, pode ser feita diretamente entre as partes (no fio do bigode) ou mediada pelo Estado (contrato assinado, posse jurídica).
     E Marx transforma isso numa antítese indeterminada, mas que não é concebida como uma contradição e desde que não é compreendida como uma antítese entre trabalho e capital. Daí ele enfia trabalho e capital no meio da conversa (desdobra em uma nova determinação).
     Marx faz um bom uso das palavras (universo semântico), não sei para qual fim, mas faz.
     Depois ele fala em propriedade privada, que, nessa forma (não-posse de propriedade e propriedade) essa antítese não aparece ainda como estabelecida pela própria propriedade privada.
     E segue: “O trabalho, porém, a essência subjetiva da propriedade privada como exclusão de propriedade, e o capital, trabalho objetivo como exclusão de trabalho, constituem propriedade privada como a relação ampliada da contradição e, pois, uma relação dinâmica que tende a resolver-se.”
     Podemos observar que, na citação acima, poderíamos encontrar uma definição de trabalho (a essência subjetiva da propriedade privada como exclusão de propriedade) e de capital (trabalho objetivo como exclusão de trabalho). Porém, Marx não trabalha com definições, trabalha com “determinações” e vai desdobrando o objeto até o infinito. Aqui já encontramos outra “determinação” para capital, diferente das que eu citei no exemplo acima de O Capital no quinto parágrafo deste texto.
     Espero que o leitor esteja entendendo o raciocínio, que entenda o que são os tais “desdobramentos infinitos em determinações”, ou seja, desdobrar o objeto infinitamente em determinações para concretizá-lo. Até o momento não concretizamos o que é capital para Marx. E mesmo que o leitor leia TODA a obra de Marx não concretizará o que é capital para Marx, pois Marx não trabalha com definições, trabalha com “determinações”.
     E depois, no final da citação, ele fala da “propriedade privada como a relação ampliada da contradição e, pois, uma relação dinâmica que tende a resolver-se.”
     De qual contradição ele está falando agora? Da antítese entre a não-posse de propriedade e propriedade não concebidas ainda como uma contradição? Nunca se sabe exatamente do quê Marx está falando.
     E depois ele fala da “relação dinâmica que tende a resolver-se”. Qual relação dinâmica? Da relação entre a não-posse de propriedade e propriedade ou da relação entre capital e trabalho?
     Bom, de qualquer maneira, seja lá de qual relação Marx esteja falando, ela tende a resolver-se sozinha, então não vamos nos preocupar com isso.
     Depois, no segundo parágrafo, o qual não transcrevei aqui porque é grande, mas darei minhas “determinações”. O leitor pode conferir o parágrafo, e o texto inteiro, depois no link ao final.
     Marx fala que a propriedade privada é primeiro considerada somente em seu aspecto objetivo, mas considerando o trabalho como sua essência, ou seja, o trabalho é considerado como a essência da propriedade privada. Sua maneira de existir, portanto, é o capital, que é necessário abolir. E o trabalho que é levado a um nível comum, subdividido e, por isso, não-livre, é visto como a fonte da nocividade da propriedade privada e de sua alienação em relação ao homem.
     O trabalho não-livre é visto como a fonte da nocividade da propriedade privada e de sua alienação em relação ao homem. O que é trabalho não-livre para Marx? Não encontraremos o que é isso, pois Marx não trabalha com definições, ele trabalha com determinações. Aliás, não se sabe sequer o que é trabalho para Marx. Trabalho não-livre é uma nova determinação de trabalho.
     Depois Marx cita o trabalho agrícola de Fourier e o trabalho industrial de Saint-Simon e segue:
“Finalmente, o comunismo e a expressão positiva da abolição da propriedade privada e, em primeiro lugar, da propriedade privada universal. Entendendo essa relação em seu aspecto universal, o comunismo é em sua primeira forma, apenas a generalização e concretização dessa relação”.
     Nesta parte acima, Marx fala do comunismo e da expressão positiva da abolição da propriedade privada. Em todo o texto Propriedade Privada e Comunismo, Marx refere-se sempre à abolição da propriedade privada como uma coisa positiva, mas não explica porque isso é uma coisa positiva. O leitor que encontre sua própria determinação do porquê a abolição da propriedade privada é uma coisa positiva, mas Marx, pela repetição constante disso, frisa que é uma coisa positiva.
     Depois ele diz que o comunismo quer abolir o talento, etc., pela força, mas nessa parte ele está falando do comunismo inteiramente vulgar e irrefletido. E o papel do trabalhador não é abolido, mas ampliado a todos os homens.
     Esta parte é interessante: “A relação da propriedade privada continua a ser a da comunidade com o mundo das coisas. Por fim, essa tendência a opor a propriedade privada em geral à propriedade privada é expressa de maneira animal; o casamento (que é incontestavelmente a forma de propriedade privada exclusiva) é posto em contraste com a comunidade das mulheres, em que estas se tornam comunais e propriedade comum”.
     Acredito que está bem claro: no casamento, a mulher é propriedade privada do homem.
     Depois ele diz: “... essa idéia de comunidade das mulheres é o segredo de Polichinelo desse comunismo inteiramente vulgar e irrefletido”. Segredo de Polichinelo é aquele segredo que todo mundo sabe, mas comenta-se somente à boca miúda, tal qual o marido traído que é sempre o último a saber.
     Após, ele fala que “as mulheres terão de passar do matrimônio para a prostituição universal”, assim como o mundo das riquezas terá de passar da relação de casamento exclusivo com o proprietário particular para a de prostituição universal com a comunidade.
     É uma bela relação que Marx faz: devemos dividir as riquezas assim como devemos dividir as mulheres. Mas lembremos que Marx está falando do comunismo vulgar, irrefletido, porém, ele não diz se isso é uma coisa boa ou uma coisa ruim; o leitor que encontre sua própria determinação.
     Ele ainda fala da inveja universal que se estabelece como uma forma camuflada de cupidez, de cobiça. Que essa inveja e o nivelamento por baixo constituem a essência da competição, ou seja, quem tem menos quer ter mais, única e exclusivamente por que tem inveja do outro. E isso, para Marx, é a essência da competição. Sabemos que a concorrência é a essência do capitalismo, então, posso determinar que, para Marx, a essência do capitalismo é a inveja. Eu quero ter propriedade privada por que tenho inveja dos outros?!? Eu quero dar e ter fidelidade no casamento por que tenho inveja dos outros?!?
     Ele termina o parágrafo dizendo que a “eliminação da propriedade privada representa uma apropriação genuína que é demonstrada pela negação abstrata de todo o mundo da cultura e da civilização, e pelo retorno à simplicidade inatural do pobre e indigente que não só ainda não ultrapassou a propriedade privada, mas nem ainda a atingiu”.
     Ele está falando acima do retorno do homem a si mesmo como um ser social, isto é, realmente humano, um regresso completo e consciente que assimila toda a riqueza da evolução precedente e isso se dá pela abolição positiva da propriedade privada e; o comunismo como um naturalismo plenamente desenvolvido é humanismo e como humanismo plenamente desenvolvido é naturalismo; e o comunismo “é a resposta ao enigma da História e tem conhecimento disso”. Ele está falando agora do comunismo quanto à sua consciência pensante, e seu processo entendido e consciente de vir-a-ser; e não do comunismo vulgar, irrefletido.
     A parte seguinte também é interessantíssima: “Na relação com a mulher, como presa e serva da luxúria comunal, manifesta-se a infinita degradação em que o homem existe para si mesmo; pois o segredo dessa relação encontra sua expressão inequívoca, inconteste, franca e patente na relação do homem com a mulher e na maneira pela qual se concebe a relação direta e natural da espécie. A relação imediata, natural e necessária de ser humano como ser humano é também a relação do homem com a mulher”.
     Na minha determinação posso inferir que o comunismo prega por igual a infinita degradação do homem e da mulher, mas existem aqueles que são comunistas e são “mais iguais do que os outros” e estão fora dessa degradação.
     O meio do texto todo Marx segue na toada da abolição positiva da propriedade privada, fala da alienação religiosa, da atividade social e do espírito social, do trabalho científico, da consciência como espécie, da objetificação do homem, dos cinco sentidos do homem, da história da indústria, das ciências naturais, etc, num blá-blá-blá que se desdobra em várias determinações, como sempre.
     E chegamos no final. Marx fala da idéia da criação da terra. Da geogenia que descreve a formação e o desenvolvimento da Terra como um processo de geração espontânea e que essa geração espontânea é a única refutação prática da teoria da criação. Aqui é onde ele começa não somente a negar Deus, mas quer abolir a idéia de Deus da mente humana e a palavra Deus do vocabulário.
     No parágrafo seguinte ele cita Aristóteles que disse: você foi gerado por seu pai e sua mãe, e conseqüentemente foi o coito de dois seres humanos, um ato da espécie humana, que produziu o ser humano. E Marx cria uma nova determinação chamada movimento circular segundo a qual o homem reproduz-se a si mesmo. E faz um malabarismo mental onde tenta refutar “racionalmente” a teoria da criação da seguinte maneira: “quem criou o primeiro homem e a natureza como um todo? Só posso responder: sua pergunta é, em si mesma, um produto da abstração. Pergunte a si mesmo como chegou a essa pergunta. Pergunte-se se sua pergunta não nasce de um ponto de vista a que eu não posso responder por que ele é deturpado. Pergunte-se se essa progressão existe como tal para o pensamento racional. Se você indaga acerca da criação da natureza e do homem, você está abstraindo estes. Você os supõe não-existentes e quer que eu demonstre que eles existem. Replico: desista de sua abstração e ao mesmo tempo você abandonará sua pergunta. Ou então, se você quer manter sua abstração, seja coerente, e se pensa no homem e na natureza como não-existentes pense também em você como não-existente, pois você também é homem e natureza. Não pense nem formule quaisquer perguntas, pois logo que você o faz sua abstração da existência da natureza e do homem se torna sem sentido. Ou será você tão egoísta que concebe tudo como não-existente, mas quer que você exista? ”
     Marx diz que a teoria da criação do mundo por Deus é uma abstração deturpada e que é só você não se perguntar mais de onde viemos e para onde vamos que tudo se resolverá como por mágica e que se você não fizer isso você é egoísta. É a negação da metafísica. Para o comunismo a metafísica não existe.
     Mas vamos adiante. No início do último parágrafo, Marx fala que: “Como, no entanto, para o socialista, o conjunto do que se chama história mundial nada mais é que a criação do homem pelo trabalho humano, e a emergência da natureza para o homem, ele, portanto, tem a prova evidente e irrefutável de sua autocriação, de suas próprias origens. "
     Chega a ser uma piada. Marx diz que o homem se autocriou. Ora, isso também é uma abstração, pois Marx não sabia como o mundo e o ser humano se originaram (e ainda não sabemos com certeza), mas para Marx a teoria da criação por Deus é uma abstração deturpada enquanto a teoria dele de autocriação é uma “verdade autoevidente”.
     Como ele mesmo disse acima: “Se você indaga acerca da criação da natureza e do homem, você está abstraindo estes”. Ora, para chegar à conclusão de que o ser humano se autocriou, Marx teve que abstrair, teve que indagar acerca disso. Vemos que é um picareta extremamente maligno ou um maluco. Marx deve ser relegado ao esquecimento de onde nunca deveria ter saído.
     Depois ele diz que a busca de um ser estranho, um ser acima do homem e da natureza é praticamente impossível porque essa busca é uma confissão da irrealidade do homem e da natureza. Mas a tal da autocriação proposta por ele não é uma busca impossível e, como já vimos, isso é tão abstração como a teoria da criação do mundo por Deus. Porém, desde que o mundo é mundo, o ser humano sempre teve Deus, deuses ou uma entidade qualquer. Isso, de certo modo, faz parte da metafísica, faz parte da natureza do ser humano questionar de onde viemos; e a loucura do comunismo pretende acabar com isso. Contudo, isso é impossível. O que estão conseguindo é causar sofrimento e miséria no mundo.
     Depois Marx fala do ateísmo. Que o ateísmo não faz sentido porque é a negação de Deus e procura afirmar, por essa negação, a existência do homem. Para Marx nem o ateísmo é aceitável, porque enquanto tiver um ateu sempre existirá a idéia de Deus. O ateu nega a Deus, mas fala em Deus mesmo não acreditando Nele. Um ateu pelo menos pensa na hipótese do que acontece depois da morte, mesmo acreditando que não acontece nada, morremos e pronto, não existe alma nem vida eterna, mas pelo menos um ateu pensa nisso e conserva sua moral. O comunismo é a negação de qualquer crença e não estou falando de crença religiosa, mas de toda e qualquer crença. A moral é social, política e econômica, ou seja, ela é volúvel.
     E Marx termina: “O socialismo dispensa esse método assim tão circundante; ele parte da percepção teórica e prática sensorial do homem e da natureza como seres essenciais. É autoconsciência positiva humana, não mais uma autoconsciência alcançada graças à negação da religião; exatamente como a vida real do homem é positiva e não mais alcançada graças à negação da propriedade privada, por meio do comunismo. O comunismo é a fase de negação da negação e é, por conseguinte, para a próxima etapa da evolução histórica, um fator real e necessário na emancipação e reabilitação do homem. O comunismo é a forma necessária e o princípio dinâmico do futuro imediato, mas o comunismo não é em si mesmo a meta da evolução humana - a forma da sociedade humana. ”
     O comunismo é a concepção zoológica da humanidade, o ser humano tomado como um animal irracional, agindo por instinto; menos os comunistas, estes estão acima disso tudo vivendo do bom e do melhor escravizando os “animais” seres humanos levados à condição de animais irracionais.
     "O comunismo é a negação da negação, é a forma necessária e o princípio dinâmico do futuro imediato e, ao mesmo tempo, o comunismo não é a meta da evolução humana", ou seja, o comunismo é a negação de tudo; é luta, sofrimento, miséria, emburrecimento, é o ser humano agindo como animal, é degradação, é o ser humano comendo filhotes de ratos vivos, é a maioria dos seres humanos sendo escravizados pelos comunistas.
     O comunismo é uma cultura de mentira e fingimento.
     E quem são os comunistas?
     Para não alongar o texto, responderei essa questão numa outra oportunidade, pois isso requer várias considerações e veremos como o comunismo e o capitalismo se confundem atualmente e que a questão básica é moral.

domingo, 16 de fevereiro de 2020

Raciocínio

   Para este estudo, coisa é tudo que há (corpóreo ou incorpóreo) tanto fisicamente quanto em pensamento; objeto é aquilo que se está estudando; sujeito é aquele que estuda o objeto. Uma coisa pode ser um objeto material ou imaterial estudado pelo sujeito.
   Coisa é tudo o que há e engloba tudo o que existe. Tudo o que existe, para o nosso estudo, para a nossa organização do pensamento, refere-se especificamente às coisas físicas, existentes fisicamente no mundo. Porém, uma coisa que existe fisicamente também há. Então, tudo o que há e existe no mundo são coisas, mas são coisas enquanto objeto de estudo. Logo entraremos nos conceitos e definições.
   Tomaremos agora como exemplo as palavras cadeira e liberdade. Cadeira existe fisicamente e também há como conceito. Quando eu falo a palavra cadeira ela pode referir-se na mente dos outros a todas as cadeiras do mundo, a nenhuma cadeira (somente o conceito de cadeira) ou a uma cadeira em específico.
   Liberdade não existe fisicamente, mas há como conceito, não sabemos o tamanho da liberdade, a cor da liberdade, etc, mas sabemos que a liberdade existe na realidade física pelos seus efeitos e consequências. Pegamos uma pessoa e a colocamos atrás das grades, na cadeia. Tiramos a sua liberdade, porém, tiramos somente a sua liberdade física, mas essa pessoa conserva sua liberdade de espírito, de pensamento, etc. Caso dermos uma paulada na cabeça dessa pessoa e a colocarmos na cadeia, aí sim podemos dizer que tiramos de um modo mais completo a sua liberdade. Poderíamos entrar agora na discussão de alma, consciência, etc, pois mesmo desmaiada essa pessoa pode conservar algum tipo de consciência, mas não nos cabe agora discutir isso.
   O que foi dito acima refere-se a conceitos objetivos e conceitos subjetivos. Para o nosso estudo e para nossa organização do pensamento, pois outros autores podem ter conceitos e definições diferentes, tomaremos as seguintes definições:
   Conceito: é aquela imagem mental abstrata que cada um tem na sua mente a respeito de uma coisa.
   Descrição: é quando descrevemos uma coisa em palavras, seja ela falada ou escrita, mas não damos a sua finalidade. Simplesmente damos a sua descrição física.
   Definição: é quando descrevemos uma coisa e damos a sua finalidade. Então, a “definição” de alguma coisa é a sua descrição mais a sua finalidade. A definição engloba a descrição. A partir de agora nos referiremos somente à definição.
   Então, a definição também é o conceito que temos na mente externado em palavras faladas ou escritas.
   Para clarificar, vamos tomar como exemplo um simples exercício: tenho aqui na mão um lápis e eu pergunto “O que é esta coisa que eu tenho na mão?”. Alguém responderá: um lápis. Porém, eu digo: não perguntei o nome desta coisa, perguntei o que é esta coisa chamada lápis. É óbvio que atrelado ao nome da coisa (lápis) está a definição. Todo mundo sabe o que é um lápis. Todos aprendemos o que é um lápis através do conhecimento intuitivo. Veremos mais adiante o que é conhecimento intuitivo.
   Para respondermos “o que é esta coisa chamada lápis”, precisamos definir (descrição mais a finalidade) o que é um lápis, ou, mais precisamente, este lápis: é um objeto de uns 20 cm de comprimento, de meio cm de largura, tem um cilindro pontudo de grafite envolto por uma camada de madeira e esta camada de madeira está pintada na cor verde, etc, e serve para escrevermos no papel (finalidade). Esta é a definição. Lembrando que isto é feito somente para organização do pensamento. Nada mais.
   Este exercício pode ser aplicado a todas as coisas. Tente definir em palavras (faladas ou escritas) os objetos que você está vendo na sua frente agora.
   Posso agora inferir que, a partir de um simples lápis, podemos escrever uma enciclopédia completa. Basta termos na cabeça que a pessoa para a qual estamos definindo o lápis não saiba de nada. Precisaremos definir o que é grafite, o que é tinta, o que é madeira, etc. Madeira vem da árvore, mas o que é árvore? Precisaremos definir árvore com tudo o que compõe uma árvore. Vemos que daí, basicamente, vieram as ciências, a taxonomia, etc.
   Caso fôssemos definir “liberdade”, não podemos dar a sua definição física, pois “liberdade” não existe fisicamente, mas podemos tentar dar uma definição subjetiva. E chegamos em conceitos objetivos e conceitos subjetivos.
   Conceito objetivo: refere-se ao objeto físico, o objeto físico em si é que determina a sua própria definição, como no caso do lápis. Objetivo vem de objeto. Grosso modo, o objeto é que se autodefine.
   Conceito subjetivo: refere-se ao sujeito, a definição da coisa parte do sujeito (pessoa) que está definindo a coisa, como no caso da liberdade, ou seja, o conceito subjetivo tem muito do sujeito que está se expressando e da coisa que não existe fisicamente (liberdade, igualdade, fraternidade, sistemas políticos e econômicos [socialismo, capitalismo, etc]). São conceitos subjetivos e partem, basicamente, do sujeito que está definindo a coisa. Muitas vezes chegamos a um consenso entre vários autores do que é o conceito subjetivo de tal coisa expresso em palavras. Mas se fôssemos tentar definir completamente, por exemplo, de novo, liberdade, provavelmente ficaríamos anos, ou talvez o resto da vida tentando definir exatamente o que é liberdade sem nunca chegarmos a uma definição completa. Então, se faz necessário um consenso entre as pessoas para que avancemos no pensamento, senão ficaremos o resto da vida discutindo o que é liberdade.
   Assim é a linguagem; um consenso, uma convenção, mesmo sabendo que, talvez, a definição de tal coisa, de tal nome, não seja exata, mas foi o melhor que conseguimos fazer e temos consciência disso. Ter consciência disso é muito importante.
   Para nosso entendimento, língua é a língua portuguesa, a língua inglesa, língua alemã, etc. Linguagem envolve a língua, pois temos a entonação da voz, expressão corporal, etc. Na linguagem falada expressamos melhor as idéias, pois o interlocutor percebe a entonação da voz, a expressão corporal, etc. A linguagem escrita requer uma habilidade para expressar, por exemplo, ironia. Eu falo: "você é inteligente". Na entonação de voz e na expressão facial o interlocutor percebe a ironia, mas na linguagem escrita, requer que tenhamos uma certa habilidade para expressarmos a ironia.
   Óbvio é que uma palavra que nomina uma coisa que não existe fisicamente (liberdade), pode ter um conceito objetivo, mas nesse sentido, objetivo refere-se à gramaticalidade do conceito.
   Outro exercício para clarificar: imaginemos 10 pessoas olhando para uma árvore, uma mesma árvore. Estas 10 pessoas estão em fila, uma ao lado da outra e cada uma munida com papel e caneta. Pediremos para cada uma delas definir no papel a árvore que estão vendo. Ao final do exercício veremos que as 10 definições não serão exatamente iguais e nem totalmente diferentes. Terão semelhanças e diferenças. Essas semelhanças e diferenças, podemos dizer, vem, basicamente, do vocabulário de cada pessoa. Uma definirá a árvore como tendo folhas verdes, outra, como tendo folhas verdes escuras e assim por diante. Porém, todos estão vendo a mesma árvore. Umas definições serão mais detalhistas que outras de acordo com o vocabulário de cada pessoa. Entraremos nesta parte da linguagem mais adiante.
   Agora vamos ao conhecimento intuitivo. Intuição, grosso modo, refere-se ao que percebemos através dos sentidos. Conhecimento intuitivo é aquele que não precisa de intermediário, não precisa de uma definição.
   Por exemplo, quando você era criança seu pai lhe chamou e disse: vem cá, meu filho, senta aqui nesta cadeira e vamos conversar. E você aprendeu que aquela coisa se chamava cadeira. Seu pai não precisou dizer: vem cá, meu filho, senta aqui neste objeto que tem 4 pernas, um assento, um encosto, é feito de madeira, na cor marrom, etc. Simplesmente disse: cadeira. E você aprendeu.
   Vemos que a maioria esmagadora das coisas físicas do mundo aprendemos por conhecimento intuitivo. Nunca precisamos definir tal ou tal coisa. Sabemos o nome da coisa sem nunca nos preocuparmos em definir a coisa. Isto refere-se, basicamente, a sabermos ou não sabermos do que estamos falando na maioria das vezes.
   Refere-se à linguagem, aos nomes das coisas, como bem colocou Aristóteles nas Categorias. Em relação à linguagem, refere-se ao signo, significado (definição) e referente.
   Signo: são os sinais gráficos que representam os fonemas (gramática). Mas signo também são os nomes das coisas, também são símbolos que representam alguma determinada coisa. Repetindo: essas definições aqui presentes são para organização do pensamento, outros autores podem ter definições diferentes e tomamos essas definições para não nos perdermos no raciocínio.
   Significado: é o que a coisa significa. Dizer o que é um nome (uma palavra) por meio de outras palavras. É também a definição da coisa, do signo.

   Referente: é a coisa à qual o signo se refere, por exemplo, cadeira se refere ao objeto físico cadeira. Vemos que quando o referente é uma coisa que não existe fisicamente (liberdade, esperança, etc), torna-se um pouco mais difícil identificar o referente. Muitas vezes identificamos o referente do signo (nome, palavra, verbo, etc) de um conceito subjetivo pelo próprio significado (o referente é o próprio significado) e outras vezes identificamos o referente de um conceito subjetivo pelo contexto do enunciado (frase, oração, período, etc) onde o signo do conceito subjetivo está inserido.

   Faço uma diferenciação de pensamento e raciocínio. Pensamento, todo mundo nasce sabendo pensar, mas precisamos aprender a raciocinar. O raciocínio analítico que nos foi ensinado por Aristóteles é diferente do pensar. Este, já nascemos sabendo, aquele precisamos aprender para organizar os pensamentos. Raciocínio, grosso modo, é a organização dos pensamentos e é disto que estamos falando aqui: raciocínio analítico, que vem de análise, analisar as coisas. Raciocínio também é a aplicação da razão.
   Tomaremos como parâmetros para definir uma coisa as Categorias de Aristóteles, na tradução de Pinharanda Gomes:
o que (a substância),
o quanto (quantidade),
o como (qualidade),
com que se relaciona (relação),
 onde está (lugar),
 quando (tempo),
como está (estado),
 em que circunstância (hábito),
 atividade (acção),
 e passividade (paixão).
Dizendo de modo elementar, são exemplos
de substância, homem, cavalo;
de quantidade, de dois côvados de largura, ou de três côvados de largura;
de qualidade, branco, gramatical;
de relação, dobro, metade, maior;
de lugar, no Liceu, no Mercado;
de tempo, ontem, o ano passado;
de estado, deitado, sentado;
de hábito, calçado, armado;
de acção, corta, queima;
de paixão, é cortado, é queimado.

   Lembrando que são somente parâmetros para termos como base para definir uma coisa, como, por exemplo, no caso da definição de lápis anteriormente feita. Podemos utilizar as nove categorias (uma vez que a substância é a coisa em si), ou podemos utilizar algumas das categorias, pois em alguns casos não tem como aplicar as nove categorias porque depende da coisa que estamos definindo. No caso da liberdade, não tem como aplicarmos, por exemplo, a categoria de quantidade, pois não sabemos o tamanho da liberdade, mas podemos aplicar a categoria de lugar adaptando-a em relação a estarmos dentro ou fora da cadeia. E assim partimos desses parâmetros que facilitam a análise e posterior definição de uma coisa.
   Fazendo um adendo, hão discussões sobre o que Aristóteles quis dizer com “essência”. Alguns autores dizem que “essência” para Aristóteles é a coisa em si na sua origem, no sentido de origem de todas as coisas, aquela essência primária que deu origem a tudo que existe.
   Outros exemplificam “essência” dando o seguinte exemplo: uma mesa feita de madeira, a “essência” da mesa é a madeira da qual ela foi feita. Penso que esta última está errada. Uma mesa com o tampão de madeira e os pés de metal, qual seria sua essência? A madeira ou o metal?
   Formos pedir a “essência” de liberdade, a coisa de complica ainda mais. Qual é a “essência” da liberdade?
   Não entrarei aqui nas definições de “forma” e “matéria” de Aristóteles, pois o assunto se estenderia, mas penso que a “essência” de uma mesa de madeira não é a madeira na qual ela foi feita. Teríamos que ver de qual madeira essa mesa foi feita (eucalipto, mogno, etc) e sabemos que eucalipto é uma coisa e mogno é outra. As duas são árvores, mas de gêneros diferentes, vamos por assim dizer.
   Então, segundo meu modo de raciocínio, “essência” de uma coisa talvez nunca saibamos o que é. Mas podemos chegar perto de saber o que é a “essência” de uma coisa analisando-se a coisa tomando por base as categorias, mesmo que nunca possamos dizer com exatidão qual a “essência” da coisa.
   Esta é uma das dúvidas constantes da filosofia e temos que aceitar. Talvez algum dia alguém saiba dizer com exatidão a qual “essência” Aristóteles estava se referindo, mas, por enquanto, a dúvida persiste.
   Esta é a analítica de Aristóteles. Analisar-se as coisas por todos os lados. Aristóteles conseguiu, com muita propriedade, sintetizar no papel como funciona o raciocínio natural do ser humano, mesmo que esse raciocínio não chegue a uma conclusão lógica.
   A lógica, como conhecemos hoje, é o que vem depois da analítica. Primeiro o raciocínio passa por um processo de análise e depois chega-se a uma conclusão e esta pode ser lógica ou não, o popular, faz ou não faz sentido. Isso está bem claro em Aristóteles.
   Não encontramos no Organon o substantivo "lógica" nenhuma vez. Aristóteles falava da analítica. O raciocínio analítico é um processo de análise mental que leva à lógica. Aristóteles conseguiu colocar no papel com muita propriedade como funciona o processo de raciocínio natural do ser humano.
   O ser humano se comunica, basicamente, através da linguagem falada e da linguagem escrita. Entenda-se aqui "língua" como língua portuguesa, língua inglesa, língua alemã, etc. E "linguagem" engloba a língua. A linguagem se compõe da língua, da expressão corporal, da entonação da voz, etc.
   Vemos que, na linguagem escrita, torna-se um pouco mais difícil demonstrar, por exemplo, ironia, ao passo que na linguagem falada isto se torna mais perceptível.
   Quando eu falo, minhas palavras evocam pensamentos e provocam emoções nos ouvintes. Então vemos que não há como separar a razão da emoção no ser humano (é impossível), apesar de que vários autores tentaram (e falharam miseravelmente) em querer separar a razão da emoção no ser humano. Podemos separá-las gramaticalmente, somente enquanto definições linguísticas, mas na realidade não há como separar a razão da emoção no ser humano.
   O Brasileiro, de um modo geral, reage somente à emoção que as palavras e as coisas causam nele. Não há mais aquele processo de análise que, primeiro, leva em conta o significado e o referente dos signos (palavras, nomes, símbolos, etc). O raciocínio natural, aquele processo de análise que leva à lógica, tornou-se confuso. A reação automática é emocional (fiquei ofendido ou não, gostei ou não gostei, etc). E isso leva a variantes: se eu simpatizo com uma pessoa, concordo com ela, mesmo que ela esteja mentindo. Caso eu antipatize com uma pessoa, discordo dela, mesmo que ela esteja certa; além de outras variantes que não cabe aqui discorrer agora.
   O Brasileiro, de um modo geral, reage somente à emoção que as palavras e as coisas causam nele. Parece-me que não raciocinam mais com o significado dos signos (palavras, nomes, símbolos, etc) e com o referente. Aliás, parece-me que não sabem sequer que existe uma coisa chamada referente.
   Podemos resumir, grosso modo, àquela pergunta básica de Filosofia: o que é esta coisa?
   O que é esta coisa da qual estamos falando? Do que estamos falando? Do quê esse cara está falando?
   Qual o assunto e qual o objeto do assunto? A que se refere isso que esse cara está falando?
   Por exemplo: o assunto geral são frutas, mas o objeto do assunto é banana. Então se eu começo falando de banana, você não pode responder com laranja, pois são frutas, é óbvio, mas são objetos de assunto diferentes. A banana tem um formato específico, uma cor, gosto, etc, e a laranja tem outras características.
   Exemplificando mais na realidade física: quando se discute liberação das drogas, mais especificamente, da maconha, geralmente e quase automaticamente usa-se o argumento do álcool e do cigarro. É um raciocínio extremamente superficial e errado. O assunto são drogas, mas maconha é diferente do álcool. Maconha é sólida, álcool é líquido, as substâncias que compõem uma e outro são diferentes, os efeitos no corpo humano são diferentes. Não há como comparar maconha com álcool enquanto drogas. O assunto é o mesmo: drogas, mas são drogas diferentes, são objetos de assunto diferentes.
   Raciocinar somente como "drogas" e querer compará-las uma justificando a outra é relativizar dois objetos de assunto que somente tem relação verbal na palavra "drogas", mais nada. É ilusão mental. É a mesma coisa que dizer que banana e laranja são a mesma coisa porque são frutas.
   Parta sempre da pergunta: do que estamos falando? E depois, qual o assunto (assunto geral) e qual o objeto do assunto?
   Tudo no mundo tem um assunto e um objeto do assunto quando estamos conversando ou discorrendo sobre alguma coisa. E para organizar o pensamento (raciocínio) é interessante partirmos dessas premissas até isso se tornar automático na mentalidade.

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2020

Materialismo Dialético

Vamos lá.
   O que todo mundo precisa entender é que o Materialismo Dialético (a “filosofia” inexistente do comunismo) parte do princípio de que a dialética é, fundamentalmente, o contrário da metafísica, ou seja, é a negação da metafísica, ou mais seja ainda: a metafísica não existe no comunismo marxista. Por outro lado, como o comunismo troca de discurso como troca de cueca, a metafísica está começando a ser interessante para o discurso comunista. Mentiras, mentiras e mentiras.
   Para o nosso entendimento neste texto, metafísica é, grosso modo, “o conhecimento das causas primeiras e mais universais”, aquilo que está além da física, sendo “física” (physis), natureza. São, basicamente, as boas e velhas perguntas filosóficas: “de onde viemos, para onde vamos, qual o princípio de tudo?”, as quais o comunismo marxista ignora completamente em sua “filosofia”.
   “Meu método dialético — diz Marx — não só é fundamentalmente diverso do método de Hegel, mas é, em tudo e por tudo, o seu reverso. Para Hegel o processo do pensamento que ele converte inclusive em sujeito com vida própria, sob o nome de idéia, é o demiurgo (criador) do real e este, a simples forma externa em que toma corpo. Para mim, o ideal, ao contrário, não é mais do que o material, traduzido e transposto para a cabeça do homem”. (Karl Marx, palavras finais da 2.ª edição do t. I do “O Capital”).
   “O desenvolvimento é a “luta” dos contrários” (Lenin, t. XIII, pag. 301, ed. russa, “Em torno do problema da dialética”).
   “A concepção materialista do mundo — diz Engels — se limita simplesmente a conceber a natureza tal como é, sem nenhuma espécie de acréscimos estranhos” (F. Engels, 'Ludwig Feuerbach”, em Karl Marx, Obras Escolhidas, ed. Europa-América, t. I, pág. 413).

   Para o marxismo, seja ele qual for, a moral universal não existe. Somente existe a moral social, política e econômica, que muda (movimenta-se, desenvolve-se) dentro do materialismo histórico, ou seja, o que é imoral hoje, por exemplo, matar; num próximo momento histórico pode não ser imoral, e matar pode ser permitido. E isso vale para qualquer tipo de moral.
   Para os comunistas, ou quem adota essa doutrina, não existe nada além da presente vida. Não existe "nenhuma espécie de acréscimo estranho", não existe qualquer tipo de Deus, não existe moral, não existe respeito... não dá nem para chamar um comunista de ateu, pois um ateu pelo menos pensa no que existe após a morte mesmo acreditando que com a morte tudo se acaba. A maioria dos ateus conserva a moral. O comunista sequer pensa nessas coisas, pois a moral, para ele, é uma coisa de momento, é um capricho, é uma birra do ser humano.
   Como Marx escreveu no texto Propriedade Privada e Comunismo: "Uma vez que a essência do homem e da natureza, o homem como um ser natural e a natureza como uma realidade humana, se tenha tornado evidente na vida prática, na experiência sensorial, a busca de um ser estranho, um ser acima do homem e da natureza (busca essa que é uma confissão da irrealidade do homem e da natureza) torna-se praticamente impossível. O ateísmo, como negação desse irrealismo, não mais faz sentido, pois ele é uma negação de Deus e procura afirmar, por essa negação, a existência do homem."
    Para o comunismo nem o ateísmo faz sentido, existe somente a confusão mental e a luta de classes, não importando quais classes. Aliás, “classe” nem existe para o comunista, é somente um termo para enganar trouxas. No original em Alemão está "Lutas de Classes", no plural porque as lutas não devem acontecer somente entre as classes, mas também entre os indivíduos. É a luta sem fim, fragmentação da sociedade. O negócio do comunista é lutar, discutir, mentir, roubar, matar... revolucionar. E, de quebra, induzir os outros a fazer a mesma coisa, porém, estes outros nunca sabem no que se meteram como veremos adiante na carta histórica de Engels a Marx em 23 de outubro de 1846 contando como foi a reunião que decidiu a fundação do socialismo/comunismo contemporâneo, mas até lá se fazem necessárias algumas explicações.
   “Parece-me que, no período posterior a Marx, - diz Lukács - a tomada de posição em relação ao seu pensamento deve constituir o problema central de todo pensador que leve a sério a si próprio, e que o modo e o grau com que ele se apropria do método e dos resultados de Marx determinam o seu lugar no desenvolvimento da humanidade. Esse desenvolvimento está determinado pela situação de classe, se bem que essa determinação não é rígida, mas dialética. A nossa posição na luta de classes determina amplamente o modo e o grau que assumimos o marxismo, mas, por outro lado, todo novo progresso nessa adoção nos faz aderir cada vez mais à vida e à práxis do proletariado e redunda beneficamente no aprofundamento da nossa relação com a doutrina marxista” (Meu Caminho para Marx). Lembrando que Lukács passou 10 anos estudando Marx (para quê eu não sei), mas não dá para desconsiderar o que ele escreve.
   O comunista se coloca acima do burguês e do proletário, é isso que significa "essa determinação não é rígida, mas dialética". Para o comunista, o que ele chama de burguês e o que ele chama de proletário, são meios de ação para atingir seus fins: dinheiro e/ou poder e/ou satisfação do seu ego pessoal. A moral vale somente para os outros e, ainda assim, como uma simples fórmula para enganar esses outros. O comunista, tal qual um psicopata, utiliza-se da culpa e da compaixão - ora uma, ora a outra e ora as duas - e promove esses sentimentos nos outros fazendo-os sentirem-se às vezes culpados, às vezes com compaixão e às vezes com culpa e compaixão para se aproveitarem desses sentimentos através da agressividade psicológica que lhe é característica (do comunista).
   “O materialismo dialético, - diz Lukács - a doutrina de Marx, deve ser conquistada a cada dia, assimilada a cada hora, a partir da práxis. Por outro lado, a doutrina de Marx, em sua inatacável unidade e totalidade, constitui a arma para a condução da prática, para o domínio dos fenômenos e de suas leis” (Meu Caminho para Marx).
   A práxis marxista nada mais é do que formar coletivos para se apoderar deles com a intenção de chegar ao poder. E no processo de formação desses coletivos o comunista utiliza-se do materialismo dialético, da mentira. Fornece uma causa para o coletivo, não importando qual causa for, e mantém essa causa - ou várias causas ao mesmo tempo -, sempre em movimento, sempre mudando para manter o coletivo ocupado com coisas irrelevantes. É isso que "a partir da práxis" significa. A partir da práxis o comunista troca de discurso como troca de cueca... apesar de que alguns comunistas trocam de discurso (mentem), mas não trocam de cueca, literalmente.
   “Pois qualquer verdade – diz Lênin – se a exagerarmos, se ultrapassamos os limites de sua validade, pode tornar-se um absurdo; aliás, é inevitável que, em tais circunstâncias, ela se torne um absurdo” (Meu Caminho para Marx, Lukács).
   Vai se movimentando e mudando a causa até que a verdade se torna um absurdo dentro da própria causa. Mas o comunista, que forneceu a causa para o coletivo, sabe que esta “causa” nada mais é do que um engodo, uma mentira. Mentir, mentir e mentir até virar um absurdo.

   Um exemplo de materialismo dialético:
   “Em física... toda mudança é uma transformação de quantidade em qualidade, uma consequência da mudança quantitativa da massa de movimento de qualquer forma inerente ao corpo ou que se transmite a este último. Assim, por exemplo, o grau de temperatura da água não influi em nada, a princípio, em seu estado líquido; mas, ao aumentar ou diminuir a temperatura da água líquida, chega-se a um ponto em que o seu estado de coesão se modifica e a água se converte, num caso, em vapor, e noutro, em gelo.
   ... As chamadas constantes da física (os pontos de transição de um estado para outro — N. do A.) não são, na maior parte das vezes, senão os nomes dos pontos nodais em que a soma ou a subtração quantitativas (mudanças quantitativas) de movimento provocam mudanças qualitativas no estado do corpo em questão, no qual, portanto, a quantidade se transforma em qualidade” (F. Engels, “Dialética da Natureza”, ed. cit., pag. 503)”.
   Ora, a quantidade não se transforma em qualidade, pois quantidade é uma coisa e qualidade é outra coisa. O que se transforma, vamos por assim dizer, é a qualidade líquida da água para qualidade sólida transformando-se em gelo. Engels confunde a quantidade de temperatura com a qualidade do corpo ao qual é aplicada a temperatura.
   Aí podemos ver um sofisma: “(mudanças quantitativas) de movimento provocam mudanças qualitativas no estado do corpo em questão”, esta foi a primeira premissa, que está correta; mas a segunda premissa a seguir: “no qual, portanto, a quantidade se transforma em qualidade” está errada.
   No exemplo, Engels evoca a possibilidade de a quantidade se transformar em qualidade. Porém, como já foi explicado, essa possibilidade não existe, mas Engels cria essa possibilidade falsa na mente do leitor ou do ouvinte fazendo com o que o leitor ou o ouvinte confunda quantidade com qualidade, destruindo a inteligênciaIsso é o materialismo dialético.
   Outro exemplo:
   “Não é a consciência do homem que determina a sua existência, mas, ao contrário, sua existência social é que determina a sua consciência” (Karl Marx, Obras Escolhidas, t. I, pag. 339, “Contribuição à crítica da Economia política”).
   Marx confunde “existência” com “existência social” dando a entender que a consciência é puramente produto da construção social e que o ser humano nasce sem consciência e, portanto, sem moral. A partir daí fica fácil dizer que não existe moral universal e que a moral é social, política e econômica. Não se sabe com exatidão de onde vem e nem o que determina a “consciência”, mas Marx dá como certo que a consciência é determinada pela existência social. E ainda cria um adendo (social), um penduricalho à palavra “existência” modificando seu sentido original anteriormente exposto por ele mesmo. Marx transforma "existência" em "existência social" e a verdade torna-se  um absurdo. Eu até poderia dizer que Marx e Engels foram os precursores do “politicamente correto”, pois este é sempre uma expressão, nunca uma palavra isolada.
   Como Aristóteles bem escreveu: “Toda a asserção, afirmativa ou negativa, deve ser verdadeira ou falsa, enquanto as palavras não combinadas, por exemplo, homem, branco, corre, vence, não podem ser, nem verdadeiras, nem falsas” (Organon, Categorias). E quando combinamos duas palavras onde uma anula ou confunde o significado e/ou o sentido da outra, temos confusão mental.
   Por exemplo, o que significa “politicamente correto”? É alguém que é correto na política ou é alguém que tem uma política correta? Pois são duas coisas diferentes. “Politicamente” sabemos o que é, e “correto” também sabemos o que é. E também sabemos que essas palavras isoladas não podem ser verdadeiras nem falsas, não deixam dúvidas quanto ao seu significado. Mas “politicamente correto”, o que é? Ninguém sabe. Então torna-se necessário inventar uma definição esdrúxula para a expressão, seja qual for a expressão. A partir da junção dessas palavras cria-se um exagero da verdade que se torna em absurdo, como Lenin explicou acima. Mas lembremos que “exagero da verdade” nada mais é do que mentira.
   Vemos também que a expressão “politicamente correto” é uma expressão politicamente correta - a partir daí tudo se confunde numa pasta mental -, pois significa nada, são expressões imbecis, chavões idiotas jogados na boca do coletivo, jogos de palavras que destroem a inteligência.
   Aliás, a expressão “materialismo dialético”, além de significar excremento nenhum, é a transformação da mentira em absurdo.
   Absurdo é aquilo que viola as leis da lógica por ser totalmente contraditório (lógica, para Aristóteles é a analítica, pois não encontramos nenhuma vez no Organon o substantivo "lógica"). Absurdo é distinto de falso, que pode não ser contraditório. De duas proposições contraditórias, se uma é verdadeira, a outra será necessariamente falsa. O absurdo é distinto, também, do dilema. O dilema é o raciocínio que parte de premissas contraditórias e mutuamente excludentes, mas que terminam por fundamentar uma mesma conclusão. Exemplo de dilema: ou eu caso ou compro uma geladeira, posto que os dois são entrar numa fria. Não obstante a jocosidade do exemplo, vemos que o dilema é diferente do absurdo. Absurdo, seguindo o exemplo anterior, seria: ou eu caso ou tenho matrimônio. É um absurdo, pois as duas proposições são iguais e, sendo iguais, não tem como uma ser verdadeira e a outra falsa.
   Um exemplo de absurdo em uma única frase: não existem verdades absolutas! Ora, quando você afirma que não existem verdades absolutas, então essa frase em si não é uma verdade absoluta, portanto, existem verdades absolutas porque você propôs essa frase como sendo uma verdade absoluta. Você fez uma afirmação falsa e verdadeira ao mesmo tempo, e isto é um absurdo. O "materialismo dialético" é repleto de absurdos e isento de dilemas. O dilema leva à dúvida e a dúvida é uma constante em filosofia no que concerne à metafísica. É através da dúvida que chegamos às escolhas na vida. Onde há dilema, onde há dúvida, temos que fazer escolhas até nas coisas mais simples da vida, isso faz parte da vida (ou caso ou compro uma geladeira). Para fazer uma escolha na vida, as premissas devem ser contraditórias. E o tal "materialismo dialético" tenta eliminar a dúvida substituindo-a pelo absurdo destruindo a inteligência do ser humano, pois no absurdo as premissas não são contraditórias e daí a escolha que você fizer, o resultado será o mesmo (ou caso ou tenho matrimônio). O materialismo dialético é a "filosofia" do absurdo; do sofisma, da falsidade e da mentira.
   Talvez na analítica de Aristóteles encontremos a cura para esta doença mental chamada materialismo dialético. Mas esta é uma outra conversa, pois, para Aristóteles, a analítica é um processo de análise das coisas. Sendo coisa, em filosofia, tudo o que há, e não tudo o que existe, pois tudo o que existe refere-se somente às coisas físicas (materiais) e tudo o que há refere-se a todas as coisas. Por exemplo, liberdade e cadeira são coisas. Então, a cadeira existe (fisicamente) e há (conceito); e a liberdade há, mas não existe fisicamente, porém, sabemos que a liberdade existe através dos seus efeitos e consequências na realidade física, contudo, enquanto objeto de filosofia, as duas (liberdade e cadeira) são coisas.
   Vamos agora a um exemplo real de como funciona o tal “materialismo dialético” na prática, ou seja, o tal materialismo dialético na práxis do proletariado de acordo com esta carta histórica de Engels a Marx em 23 de outubro de 1846 contando como foi a reunião que decidiu a fundação do socialismo/comunismo contemporâneo:
   “Sobre o plano de Associação proudhoniana, discutiu-se três noites”, escreve Engels. “A princípio tive quase a clique toda contra mim. [...] O principal foi, então, demonstrar necessidade da revolução violenta” (23 de Outubro de 1846). “Finalmente fiquei furioso e persegui os meus adversários até que eles se viram forçados a pronunciar-se abertamente contra o comunismo. Exigi uma votação sobre a questão de saber se nós éramos ou não comunistas. Grande foi a indignação dos grünianos, que começaram a afirmar que se haviam reunido para discutir o “bem da humanidade” e que era necessário saber o que é precisamente o comunismoDei-lhes então a mais simples definição, a fim de não permitir que eludissem o fundo da questão. Defini, portanto”, escreve Engels, “as intenções dos comunistas assim: 1) impor os interesses dos proletários em oposição aos dos burgueses; 2) fazê-lo através da supressão da propriedade privada e sua substituição pela comunidade dos bens; 3) não reconhecer nenhum outro meio para a realização destas intenções que não a revolução democrática, violenta” (escrito um ano e meio antes da revolução de 1848)”.
   A discussão terminou com a aceitação da definição de Engels sobre o que é socialismo/comunismo por 13 votos contra 2, a favor de Engels. Vemos que esta estrovenga chamada socialismo/comunismo já nasceu através de enganação, fingimento e mentira. Um ano mais tarde, numa carta de 24 de novembro de 1847, Engels informa Marx de que escrevera o rascunho do Manifesto Comunista, os princípios básicos do comunismo.
   Eu poderia dar inúmeros exemplos, pois a obra marxista, e a decorrente dela, é toda repleta destes absurdos, sofismas, mentiras, distorções e enganações, mas, no momento, é o que basta.
   Vemos que o materialismo dialético nada mais é do que empregar sofismas de quinta categoria daqueles que podemos encontrar em profusão na ZBM (zona do baixo meretrício) ... com todo o respeito às mulheres que ali trabalham, pois em questão de moral um comunista está abaixo delas e deve respeitá-las porque uma delas bem que pode ser sua mãe.
   Quando se junta o materialismo dialético com a práxis marxista temos mentiras aplicadas ao "coletivo" para que este aja na prática fazendo a mentira tornar-se um absurdo e, por conseguinte, a moral, a metafísica e a inteligência extinguem-se e temos o comunismo transformando-se em uma cultura na qual o comunista parasita a sociedade causando uma confusão mental que inspira terror no seio desta sociedade.

Referência
https://www.marxists.org/portugues/lenin/1913/mes/correspondencia.htm

sexta-feira, 27 de dezembro de 2019

Os Donos do Poder

    Os “donos do poder” que pensam ter o controle do processo: Presidentes, Reis, Rainhas, Xeiques, integrantes de grupos como Bilderberg, CFR, ONU, movimentos comunistas, movimentos conservadores, Igreja Católica, fundações como Ford, Open Society, Rockefeller e etc; que promovem somente maus valores no mundo com o único intuito de ganhar dinheiro e poder, o que mais vocês esperam ganhar com isso a longo prazo?    
   A falta da boa educação gera somente pessoas burras e violentas. E vocês esperam controlar essas pessoas com drogas e leis?    
   Quando a revolução do proletariado acontecer - sim, essa mesma - as vítimas serão vocês e não adiantará se esconder atrás de seguranças armados ou de exércitos. A elite mundial seguindo nesse rumo acabará como a elite da Revolução Francesa. Alguns promotores da Revolução Francesa também acreditavam que estavam seguros ... e tiveram seus pescoços decepados. Outros conseguiram se safar, mas a Revolução Francesa foi somente um balão de ensaio. Nesse jogo de cartas marcadas vocês estão criando uma população de coringas.    
   Esse processo está se repetindo atualmente cada vez com mais frequência no mundo. Antes eram fatos isolados, agora são focos em conjunto. 
   Esse processo vem se acentuando através de guerras civis, levantes de trabalhadores, protestos, derrubadas de governos, enfim, revolução. Está se tornando costumeiro devido à diferença mundial entre ricos e pobres. Poucas pessoas e famílias detêm a maior parte da riqueza do mundo.    
   Não é preciso ser um gênio para entender o que acontece quando se junta pobreza, burrice e violência. É simples: toda pessoa burra é potencialmente violenta, e basta um motivo para a violência aflorar. E vocês, há décadas, estão dando este motivo: pobreza. Além disso, financiam todos os movimentos que promovem a “luta de classes” - pobres contra ricos é, na verdade, a suprema luta de “classes”.    
   Não é difícil imaginar quem sairá perdendo. Os pobres, burros e violentos são a maioria e, neste caso, a minoria organizada (vocês) NÃO vence a maioria desorganizada - esta massa é muito grande -, até porque o dinheiro que vocês liberam para certos “coletivos”, vocês mesmos estão promovendo a organização dessa maioria. No momento são grupos isolados, cada qual defendendo a sua “causa”, mas para esses grupos se unirem através das suas lideranças não é difícil. Lideranças estas para as quais vocês liberam dinheiro a granel.    
   Vocês estão loucos ou estão numa bolha que não percebem o que está acontecendo? Eles estão usando seu próprio dinheiro contra vocês mesmos para matá-los futuramente. Seus seguranças e exércitos são do povo e os familiares, amigos e conhecidos também são do povo. Não é difícil imaginar de que lado eles ficarão.    
   A única maneira de reverter esse processo é tomarem consciência do que está acontecendo e fazerem alguma coisa. Voltem a promover bons valores; deixem a ganância, a usura e a mentira de lado. Combatam quem promove maus valores, combatam quem dá dinheiro para certos movimentos revolucionários para que eles parem de dar. São vocês quem tem meios de ação. 
   Para a esmagadora maioria da população mundial atualmente resta somente a pobreza, a burrice e a violência; e estas resultarão em revolução total contra vocês mesmos daqui a poucas décadas.    
   A decisão está nas suas mãos.

Este texto tenho que refazer, no momento propício.