terça-feira, 29 de dezembro de 2020

Coisas Aleatórias

    Aleatório: que depende das circunstâncias, do acaso; casual, fortuito, contingente.

 

   Coisa: tudo o que existe ou possa existir, de natureza corpórea ou incorpórea. Em Filosofia, “coisa” vai um pouco mais além, é tudo o que há e tudo o que existe. Tudo o que existe são, basicamente, de natureza corpórea, tudo o que existe fisicamente no mundo. Por exemplo, um lápis, um carro, uma árvore, etc. Tudo que há engloba tudo o que existe, mas tem coisas que somente hão. Por exemplo, liberdade, esperança, verbos (o verbo correr, por exemplo, não existe um objeto físico com esse nome “correr”, mas você sabe o que é correr na realidade, movimentar-se com velocidade) e assim por diante.

   Lápis há e existe. Caso eu falar somente a palavra “lápis”, na imaginação ou no pensamento ou no raciocínio, uns poderão pensar em todos os lápis do mundo, outros pensarão num lápis específico (um lápis que tem em casa) e aqueloutros pensarão: “Lápis, e daí, sei o que é um lápis, o conceito lápis”. Ou vaca, como bem disse o Olavo.

   Isso é feito para organização dos pensamentos. Raciocínio é organização dos pensamentos. Um pensamento organizado analítica e logicamente após o outro.

   Então, coisas aleatórias, neste texto, são pensamentos e raciocínios que virão surgindo e colocarei no papel ou, no caso, no teclado, que se materializará na tela, realizar-se-á na tela - mesóclises são bonitas. Mas aí já entraremos na linguagem e estou com preguiça de discorrer sobre signo, significado e referente.

 

   - Deus há e existe, mas não é uma coisa. Deus é Deus.

 

   - Sei lá em qual camada da personalidade estou, não entendo muito bem essas 12 camadas da personalidade. Preciso de mais tempo para ver isso com profundidade.

 

   - Já discorri sobre “conceitos objetivos” e “conceitos subjetivos”, coisas. Não ficarei voltando, pois já voltei várias vezes, senão o raciocínio não avança. O raciocínio em espiral requer a volta aos conceitos básicos, mas dentro de um limite.

 

   - Realidade: qualidade ou característica do que é real. Porém, “realidade” também é o mundo físico, o mundo das palavras, o mundo do pensamento, o mundo do raciocínio, enfim, a realidade na qual nós vivemos. Uma árvore é uma árvore em qualquer parte do mundo. As coisas que hão também fazem parte da realidade. Esse conjunto do que é chamado de “realidade” compõe-se de várias partes. As partes que compõem o todo, os particulares e os gerais. Outros exemplos: esse todo chamado “inteligência” compõe-se de várias partes. Esse todo chamado “lápis” compõe-se de várias partes. Partimos desse raciocínio básico e vamos avançando. São várias variáveis que compõem um raciocínio mais complexo. E, no meio disso tudo, temos as constantes por trás dos fatos.

 

   - Virtudes e vícios são uma questão de hábito. Caso eu me habituar a mentir, serei um mentiroso. Caso eu me habituar, pela repetição, a falar a verdade, serei virtuoso. De certa maneira é simples assim. Óbvio é que aí temos também razão e emoção. Razão no sentido de raciocínio, não no sentido de certo ou errado. E emoção no sentido de emoções em si, sentimentos, desejos, vontades, intenções, sensações, etc, a parte psicológica do ser humano.

 

   - Classificação e relação. Não podemos confundir uma com a outra. Gênero e espécie são classificações. Gênero animal; espécie humana, espécie bovina, espécie eqüina, etc. São classificações, mas não há relação entre a espécie humana e a espécie bovina, por exemplo. Toda relação surge naturalmente. Por exemplo, a categoria de “relação” de Aristóteles; dobro, metade. Percebam a relação surgida naturalmente. Uma coisa é o dobro da outra, uma coisa é a metade de outra. Caso eu falar “banana” e o meu interlocutor responder “laranja”, não há relação. Mesmo que ele responda depois: - “Mas são frutas”; ainda assim é uma classificação, não é uma relação. Caso comparar o gosto da banana com o gosto da laranja, aí temos uma relação surgida naturalmente, pois as duas frutas têm um gosto específico. Acidentes, predicados.

   Vamos a um exemplo mais real. A liberação da maconha. Sempre que se toca nesse tema, alguém responde: - “Mas o álcool e o cigarro são drogas e são liberados”. Isso é uma classificação, não é uma relação. É ilógico raciocinar assim. A maconha é sólida, o álcool é líquido; um cigarro de maconha é sólido, um cigarro de carteira também o é, mas as substâncias que compõem cada um são diferentes, portanto, são coisas diferentes. As drogas são classificadas de acordo com seus efeitos no organismo humano e cada droga age de um modo diferente. É um exemplo bem real entre classificação e relação. Caso você queira comparar o preço da maconha com o preço do cigarro, aí temos uma relação, mas comparar diretamente objeto a objeto não tem como, é ilógico.

 

   - Vou discorrer sobre “conceitos objetivos” e “conceitos subjetivos” de forma breve. Conceito é aquela imagem mental abstrata na mente. Conceito objetivo vem de “objeto físico”, neste caso. O objeto físico se auto-define, você extrai as informações do objeto físico (lápis). “Conceito subjetivo” vem de sujeito; tem muito do sujeito ao definir o objeto (liberdade). Objeto aqui é “objeto de estudo”, não é objeto físico. Vemos aí dentro do significado dos signos, os vários sentidos de um signo. Grosso modo, uma palavra tem vários sentidos os quais você pode empregá-la. "Nós somos nós e nossas circunstâncias".

 

   - No começo tudo era verbo. Essa é a importância da linguagem e isso afeta o raciocínio. O uso incorreto das palavras emburrece. Signo, significado (dentro do significado temos os vários sentidos) e referente.

 

   - Decai a inteligência, decai a moral e vice-versa. Decai uma, a outra vem de arrasto, não importa qual decai primeiro.

 

   - Termino de novo com Santo Tomás de Aquino: - “O bem vem da razão”. E ponto final.

sexta-feira, 25 de dezembro de 2020

A Concepção Zoológica da Humanidade

   O mundo está se encaminhando para a reação por instinto animal puro e simples. Esta é a concepção zoológica da humanidade.

   Instinto é o impulso interior que faz um animal executar inconscientemente atos adequados às necessidades de sobrevivência própria, da sua espécie ou da sua prole. Porém, instinto também é um impulso natural independente da razão que faz o ser humano agir sem pensar, sem raciocinar.

   Lembrando que “pensamento” é distinto de “raciocínio”. O raciocínio é a concatenação de pensamentos, é a organização lógica dos pensamentos, é um pensamento organizado logicamente após o outro. E nós expressamos nossos pensamentos e raciocínios através da palavra falada e da palavra escrita. Por exemplo, a frase: “Nunca ouvi falar disso, mas não tem cabimento”; são somente dois pensamentos jogados ao vento, não há um raciocínio porque a segunda oração não “bate”, não “fecha” com a primeira, não há um raciocínio, não há uma organização analítica-lógica. A pessoa está dizendo, admitindo que nunca ouviu falar do que o outro está dizendo, mas ao mesmo tempo está chegando numa conclusão. Como isso é possível? Caso falasse: “Nunca ouvi falar, mas tem cabimento” seria a mesma estupidez, pois se nunca ouviu falar daquilo que o outro está dizendo, como pode chegar numa conclusão? O correto seria responder: “Nunca ouvi falar, mas vou pesquisar, irei me informar a respeito”.

   Nós expressamos nossos pensamentos e raciocínios através da palavra falada e da palavra escrita, através da linguagem. Quando você diz: “Perdi a linha de raciocínio” é porque estava seguindo um raciocínio e esqueceu o que estava falando - ou escrevendo -, ou veio um pensamento maluco e você perdeu a linha de raciocínio. Isto é óbvio, é natural, então podemos perceber na realidade a distinção entre pensamento e raciocínio e como isso se expressa nas palavras faladas e escritas. Tudo o que você fala e escreve são seus pensamentos e raciocínios, você está demonstrando para as outras pessoas como é a sua cabeça, como você pensa e raciocina.

   O ser humano é um ser racional e um ser emocional. É impossível separar essas duas condições em um ser humano. Razão, aqui no sentido de raciocínio, não no sentido de certo ou errado. E emoção no sentido de emoções em si, sentimentos, desejos, vontades, intenções, sensações, etc, a parte psicológica do ser humano.

   Eu posso separar a razão da emoção na linguagem (signo, significado), como fiz anteriormente, mas na realidade é impossível separar a razão da emoção dentro de um ser humano. Essas minhas palavras neste texto provavelmente estão evocando pensamentos e/ou raciocínios no leitor e provocando emoções. Este conjunto “razão e emoção” é o referente, é o que a coisa é em si na realidade.

   Decai a inteligência, decai a moral e vice-versa; decai uma, a outra vem de arrasto.

   Talvez o leitor não se sinta atraído por este início de texto, porém, independentemente disto, comprova o que eu afirmei. Talvez o leitor não gostou das palavras em si, talvez não está entendendo do quê estou falando, talvez o título do texto evocou um raciocínio específico e provocou uma emoção específica, talvez o leitor esteja pensando e/ou raciocinando: “É, até concordo com algumas coisas até agora (razão), mas não estou gostando muito do texto - ou estou gostando (emoção)”. Razão e emoção.

   Intrinsecamente o ser humano é um ser racional e emocional. Talvez o leitor raciocine com a palavra “emocional”, utilizada por mim na frase anterior, como transtorno afetivo ou forte abalo sentimental. Mas o sentido desta palavra neste momento vai mais além, como dito antes, emoção são as emoções em si, sentimentos, desejos, vontades, intenções, sensações, etc, a parte psicológica do ser humano.

   É impossível separar a razão da emoção dentro de um ser humano, mas é possível causar um desequilíbrio. É possível fazer a pessoa reagir à emoção que as palavras e as coisas causam nela. Para tanto, basta emburrecer as pessoas. Basta fazê-las perder o raciocínio. Geralmente a perda de raciocínio vem de um medo ou uma ansiosidade constante que faz a pessoa reagir pela emoção que as palavras e as coisas causam nela.

   Vou comer teu cu, trouxa! Talvez o leitor sentiu, ao ler a frase anterior, um certo desconforto ou achou engraçada a frase pelo inusitado da coisa ou até esteja pensando em parar de ler o texto pelo uso de palavrões; não tenho como saber exatamente a emoção causada, mas pelo raciocínio posso imaginar de acordo com a emoção que eu sentiria ao ler a frase ou  imaginar pela reação de alguém que já tenha lido e me contado o que sentiu. Razão e emoção.

   Há uma distinção entre “emoção” e “sentimento”. Emoção é uma agitação dos sentimentos. Lembrando que o sentido de “emoção” em “razão e emoção”, anteriormente ditos, vai além do sentido que estamos vendo agora. Por exemplo, neste sentido específico de agora, raiva é uma emoção posto que é uma agitação, ódio é um sentimento posto que é calmo; alegria é um sentimento posto que é calma, euforia é uma emoção posto que é uma agitação. Mas nem todo sentimento está relacionado à uma emoção.

   Dentro do significado de uma palavra temos vários sentidos os quais podemos empregar essa palavra e é preciso deixar bem claro em qual sentido empregamos uma palavra em uma determinada circunstância. É preciso falar e escrever com clareza senão não vamos nos entender, estaremos falando a mesma língua, mas não estaremos falando a mesma linguagem e isso afeta a mentalidade das pessoas, afeta o raciocínio e afeta a emoção.

   Causado esse desequilíbrio entre razão e emoção, as pessoas emburrecem, perdem o raciocínio e passam a reagir pela emoção que as palavras e as coisas causam nela. Citando Aristóteles: “A palavra cão, não morde”. Vamos imaginar uma situação onde estamos reunidos um grupo de 4 amigos. E um deles, na sua fala usa a palavra cachorro e o outro encolhe de medo as pernas na cadeira e diz: “Já fui mordido por um cachorro”! E o outro responde: “Mas não tem nenhum cachorro aqui na sala, é um medo infundado”. É o que se chama de “trauma” em psicologia. Vem do desequilíbrio entre razão e emoção. Não há um cachorro presente na sala, mas a ansiosidade e/ou o medo (emoção) não deixam a pessoa raciocinar.

   Como diz Santo Tomás de Aquino na Suma Teológica: “O bem vem da razão”. Você não precisará ter lido a Suma para entender que o bem vem da razão. Quantas vezes na sua vida você fez coisas erradas e depois disse: “É que eu não estava pensando direito” ou “É que não pensei direito no que estava fazendo”.

   Depois da reação pela emoção vem a reação pelo instinto. O raciocínio (razão) vai decaindo até que o ser humano deixa de reagir pela emoção - o que já é errado - e passa a reagir pelo instinto. Pessoas que saem na rua peladas com cartazes dizendo que estão “protestando” é reação pelo instinto. Pessoas que comem filhotes de ratos vivos é reação pelo instinto, pessoas que saem na rua, mesmo vestidas, quebrando tudo e tacando fogo nas coisas é reação pelo instinto. Caso eu sair sozinho pelado na rua com um cartaz dizendo que estou “protestando” serei considerado um louco, um maluco. Caso eu sair sozinho vestido na rua quebrando tudo e tacando fogo nas residências e comércios, serei considerado um maluco: “Olha lá, o cara enlouqueceu, acha que está protestando”. Porém, se eu sair na rua, nestes casos, com mais 30 ou 50 pessoas daí não é loucura, é um “protesto”. Neste sentido, um hospício está repleto de pessoas “protestando”.

   A concepção zoológica da humanidade é fazer as pessoas reagirem pelo instinto animal puro e simples. Isso vai se alastrando como um incêndio pela sociedade. Porém, de certa forma, é impossível de se fazer isto no mundo todo, mas causa miséria e sofrimento durante o processo.

   Por mais que se queira, vamos por assim dizer, ser “frio e calculista”, é impossível para a esmagadora maioria das pessoas, pois o ser humano não controla suas emoções (emoções em si, sentimentos, desejos, vontades, intenções, sensações, etc, a parte psicológica do ser humano), mas equilibra a emoção pela razão (raciocínio).

   Decai a inteligência, decai a moral e vice-versa; decai uma, a outra vem de arrasto.

   Sábias palavras de Santo Tomás de Aquino: “O bem vem da razão”. E ponto final.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

O Direito acabou há décadas no Brasil

   “O Direito é, por conseguinte, um fato ou fenômeno social; não existe senão na sociedade e não pode ser concebido fora dela” (Lições Preliminares de Direito, Miguel Reale, p. 2). Os nossos “doutos” supremos sabedores da verdade interpretam isso - se é que sabem disso - da seguinte maneira: “Já que o Direito é da sociedade e nós somos a sociedade, então nós fazemos a lei como queremos”. Essa distorção das normas básicas do Direito é característica de criminosos, de bandidos. E essa distorção por parte dos “doutos” supremos legisladores da verdade leva a sociedade inteira a não cumprir lei nenhuma porque a lei já nasce distorcida, já nasce imoral. E o comportamento da sociedade torna-se imoral, pois o Direito, por conseguinte, tutela comportamentos humanos.

   No Brasil temos o chavão: “É legal, mas é imoral”. Nada mais errado. TODA imoralidade é ilegal e toda ilegalidade é imoral. O Direito nasceu para combater a imoralidade. “Legal, mas imoral” é coisa que não existe. Toda lei imoral é nula na essência, chamam de lei porque um bando de pessoas imorais escreveu um texto e promulgou-o, mas na realidade é somente um pedaço de papel escrito.

   Devido ao raciocínio metonímico, no Brasil trocam o nome da coisa "privilégios" pelo nome "direitos". Privilégios dados a certos grupos são imorais e são ilegais. Leis que concedem privilégios financeiros (mordomias), por exemplo, são imorais e por isso mesmo são ilegais, são nulas na essência. Repito: não existe isso de "legal, mas imoral", são somente textos feitos por pessoas imorais.

   O fato de um Deputado Federal ou Senador propor um projeto de lei onde a coisa em si é imoral, isso caracteriza-o como imoral. E seus colegas deveriam dizer para ele: "Entre com este projeto imoral e nós cassaremos teu mandato"; porém, isto é utopia no Brasil, pois acontece o contrário, todos aprovam alegremente o projeto para embolsar dinheiro de imposto que depois falta na educação, saúde e segurança. É assim que você vê a realidade. Neste sentido as atitudes, o comportamento é que mostram quando uma pessoa é imoral... e o Direito tutela comportamentos humanos e a base do Direito é a moral, pois o Direito surgiu para combater a imoralidade e a moral vem dos valores universais morais: mentir, matar, estuprar, roubar, corrupção, furtar, etc, todo ser humano nasce sabendo que isso é errado. A base de todo crime é a imoralidade, pois todo crime é imoral.

   A lei é uma das formas do Direito, mas não é o conteúdo. Devido ao raciocínio metonímico no Brasil trocam o nome da coisa "privilégios" pelo nome "direitos". Privilégios dados a certos grupos são imorais e são ilegais. Leis que concedem privilégios financeiros (mordomias), por exemplo, são imorais e por isso mesmo são ilegais, são nulas na essência. Repito: não existe isso de "legal, mas imoral", são somente textos feitos por pessoas imorais. Todos esses privilégios de políticos no Brasil são ilegais e imorais: auxílio-moradia, auxílio-disso, auxílio-daquilo, etc.

   Aliás, por mim nem existiria mais a palavra "legal", somente falaríamos: Esta lei é moral ou não é lei!

   O que veio primeiro, o Direito ou a criminalidade? A resposta é óbvia: a criminalidade. O Direito surgiu justamente para combater a criminalidade e todo crime é imoral e o Direito surgiu para combater a imoralidade. Faço agora uma observação até ingênua, mas pertinente: estavam lá os seres humanos nos primórdios da humanidade e não existia crime nenhum e nem imoralidade e um deles resolveu do nada - o que por si já é absurdo - criar uma lei de... vamos chamá-la de... homicídio! E os outros perguntaram:

- O que é isso?

- Homicídio é quando uma pessoa mata a outra.

- Matar? O que é isso?

- Espera, vou demonstrar para entendermos o que é homicídio...

Então esta pessoa agarrou a goela de outra e matou-a.

- Entenderam agora?

- Ah sim, agora entendemos... pois é, você tem razão, precisamos dessa lei... esse tipo de coisa não pode acontecer.

   E a sociedade concordou e continua concordando.

   O Direito foi surgindo ao longo do tempo na humanidade justamente para combater esse tipo de pessoa que está fora da realidade e, por estar fora da realidade, distorce-a.

   “O homem que cumpre a lei não faz outra coisa senão respeitar um enlace que é de natureza divina” (Teoria Tridimensional do Direito, Miguel Reale, p. 504). Lembrando que toda lei deve ser e ter moral. E de qual moral se fala? Ora, aquilo que se chama valores universais de moral: mentir, matar, estuprar, roubar, furtar, etc, todo ser humano nasce sabendo que isso é errado. Não aprofundarei esta parte de moral, pois não é o escopo, mas deixo uma pergunta: Como sabemos que uma coisa é errada? Por exemplo, por que matar é errado? Resposta: Porque é crime! Ora, e antes de ser definido como crime, como sabemos que matar é errado?

   A tal da Lei é somente uma das formas do Direito. Forma e Conteúdo. “Aconselhamos sempre nossos alunos a dedicar atenção ao sentido das palavras; elas não surgem por acaso mas, como já vimos ao nos referirmos aos termos lex e jus, guardam muitas vezes o segredo de seu significado” (Lições Preliminares de Direito, Miguel Reale, p. 4). Observa-se aqui signo, significado e referente. Uma Lei, por tratar-se de um pedaço de papel escrito deve observar quatro preceitos básicos: clareza, concisão, precisão e aplicabilidade na realidade (a execução). E toda Lei deve, obrigatoriamente, seguir os quatro preceitos, nem um, nem dois, nem três, tem de ser os quatro juntos reunidos e analisados num bolo só.

   Os três primeiros (clareza, concisão e precisão) referem-se ao texto escrito, à linguagem empregada, à gramática (no caso; ortografia, sintaxe e semântica), ao uso das palavras; o quarto preceito refere-se à realidade, à execução da Lei, à sua aplicabilidade na realidade. Uma Lei mal escrita, em alguns casos é inócua, em outros casos é perniciosa.

   Claro: compreensível, sem dúvida, inequívoco;

   Conciso: sucinto, expressar um conteúdo sem excesso de palavras;

   Preciso: exato, ir direto ao ponto.

   Aplicabilidade na realidade: a execução.

   “Há casos em que é necessário abrandar o texto, operando-se tal abrandamento através da eqüidade, que é, portanto, a justiça amoldada à especificidade de uma situação real” (Idem, p. 280).

   Vou a um exemplo.

   Todo este imbróglio em torno da prisão em segunda instância tem sua origem no artigo 5º, inciso LVII, da Estrovenga da República Federativa do Brasil, que profetiza com voz tonitruante e glamorosa precedida de três batidas pomposas no chão com o bastão da iniciação na ordem e no progresso, tudo isso protegido pela capa preta que esconde a burrice e a imoralidade: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

   Esta porcaria de inciso LVII foi mal construído pelos mestres dos magos das cerimônias legislativas e, além disso, jamais deveria ter sido sequer colocado (quanto mais aprovado) na Constituição por ferir dois dos quatro preceitos básicos do Direito em relação à norma (clareza e precisão) e também por não ser matéria que se enfie em uma constituição de um país. Aliás, analisando-se os institutos jurídicos das últimas 5 ou 6 décadas no Brasil (ou mais) veremos que, além da quantidade de leis vigentes no Brasil ser absurda - em torno de 790 mil leis vigentes, quando o ideal seria um número em torno de 500 a, no máximo, mil leis vigentes -, elas não são, em sua esmagadora maioria, nem claras nem concisas nem precisas e não tem aplicabilidade na realidade.

   Vários juristas como, por exemplo, Ives Gandra Martins Filho já afirmaram que em um país como o Brasil o ideal seria ter de 500 a 1000 leis vigentes, oscilando entre esses limites. Temos 790 vezes a mais do que o necessário. O excesso de burocracia promove a corrupção e, neste sentido, tal excesso é o excesso de leis.

   O inciso LVII é conciso, mas não é principalmente claro e, secundariamente, preciso e, por isso, não é aplicável na realidade, não é executável.

   A sua concisão está na expressão do conteúdo sem excesso de palavras.

   Peca na sua clareza porque não deixa claro, obviamente, se é possível ou não a prisão em segunda, ou qualquer instância que for, no ordenamento jurídico brasileiro. Trata da culpabilidade, mas não diz quando o culpado será recolhido à prisão, deixa no ar, subjetividade. Ora, a culpabilidade está diretamente ligada à prisão do culpado. De que adianta condenar uma pessoa a 50 anos de cadeia e não a recolher à prisão? Todo o trabalho da Polícia e do Judiciário torna-se enxugação de gelo. Tempo e dinheiro perdidos, jogados no lixo.

   Tem uma certa precisão porque trata da presunção de inocência, mas não define com exatidão a partir de quando termina a inocência e deve se dar a prisão ao culpado; a popular “brecha” na lei, deixa no ar a interpretação, subjetividade. Daí os "notáveis saberes jurídicos" são quem decidem de acordo com as suas cabeças ocas.

   Caso o inciso sem juízo tivesse a seguinte escrita: “Ninguém poderá ser PRESO até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” teríamos um inciso claro, conciso e preciso, mas que não seria real, não seria aplicável na realidade física. Aí está a realidade da lei, a aplicabilidade prática da lei. Apesar de que o texto desse inciso como está já enseja interpretações esdrúxulas.

   Tendo o inciso LVII a escrita acima ninguém mais seria preso no Brasil - coisa que já acontece - por qualquer crime que cometesse devido à demora nos processos judiciais, demora esta que não me cabe no momento analisar. Mas posso aventar a possibilidade de que, em sendo as leis claras, concisas e precisas, essa demora se reduziria automaticamente, pois leis claras, concisas e precisas deixam pouca ou nenhuma margem às interpretações e permitem recursos às instâncias recursais somente quando houver necessidade de recurso por um erro no processo, falta de indícios e/ou provas, etc.

   Tendo o inciso LVII a escrita acima, permitiria que eu, por exemplo, saísse para trabalhar de manhã e vendo um Cristão passando na rua eu sacaria do revólver, daria seis tiros nele - só para ver de que lado que ele cai -, iria na Delegacia mais próxima com a arma fumegando ainda, o cano quente, jogaria em cima do balcão e diria ao policial plantonista: “Matei um cara lá, registra isso... e vai depressa que estou atrasado para o trabalho”. Eu seria preso somente depois do último do último do último recurso no STJ ou STF.

   Trânsito em julgado é isso: eu seria declarado culpado somente depois do último do último do último... recurso no STF. É por isso que o STF já julgou várias vezes, agora pode, agora não pode prisão em segunda instância, julga ao fedor do momento.

   Um exemplo de escrita do inciso LVII: “Alguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, mas o tribunal deverá determinar a execução das penas privativas de liberdade, restritivas de direitos ou pecuniárias, sem prejuízo do conhecimento de recursos que vierem a ser interpostos”. Ou, em uma linguagem mais popular: “Alguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, mas deverá ser recolhido à prisão na decisão em segunda instância”. Lembro aqui para ficarem atentos na diferença entre “poderá” e “deverá”.

   Repito, a presunção de inocência não é matéria que se enfie na Constituição. É matéria do Código de Processo Penal ou outra lei pertinente. Mas do jeito que a coisa está, mesmo que seja aprovada a prisão em segunda instância no Brasil, esta lei já nascerá inconstitucional, pois o inciso LVII continuará lá. Aliás, depois dessa “Constituição” de 1988 ocorreu esse temporal de ações de inconstitucionalidade, a esmagadora maioria das leis que vieram depois tornaram-se automaticamente inconstitucionais. Fim do exemplo.

   Posso discorrer vários outros exemplos, mas por questão de espaço o texto se tornará longo e meus conterrâneos não gostam muito de ler, somente citarei: a lei de cotas raciais (autodeclarados pretos, pardos e indígenas), a lei do abuso de autoridade (agente público [autoridade] é praticamente todo mundo), o ECA ( Estatuto da Criança e do Adolescente), a tal da lei das Fake News (que nem foi aprovada ainda, mas será), e por aí vai.

   Todas elas com o texto subjetivo ao extremo. O que vemos no processo jurídico brasileiro é o excesso de recursos baseado nas famosas “brechas” na lei. Essas famosas “brechas” na lei nada mais são do que as margens de interpretação excessivas simplesmente porque a lei, no seu texto escrito, ou não é clara ou não é concisa ou não é precisa, como vimos no exemplo da Constituição Brasileira ... esta estrovenga sem noção feita e promulgada por um bando de asnos. Bando este que vem copulando entre si e dando cria e aperfeiçoando geneticamente a burrice e a canalhice dos seus rebentos. O bastão da burrice vem sendo passado de geração em geração. Os políticos mais velhos, velhacos e sedentos por leite fresco, copulam bem gostoso a mentalidade dos mais novos mantendo a tradição progressista ... se é que é possível esta expressão: tradição progressista!?

   O excesso de margem na interpretação das leis, leva ao autoritarismo de um ser humano sobre os outros, substitui a paz pela desordem e substitui a duração das instituições pela sua derrocada. É exatamente para evitar o caos, a corrupção e a desordem é que as leis devem ser claras, concisas e precisas e devem ter aplicabilidade na realidade.

   Os legisladores, ao formular uma lei, devem, obrigatoriamente, seguir estes preceitos básicos de clareza, concisão, precisão e realidade. A aplicação na realidade também é aquele exercício imaginativo que se faz após ter o texto bem escrito, claro, conciso e preciso. Após reduzir-se ao máximo a subjetividade do texto, deixá-lo sem brechas, deve-se perguntar: Temos como fazer isso o que está escrito aqui? Temos como executar isso?

   Pois mesmo o texto estando claro, conciso e preciso às vezes não tem como executar, por exemplo, por falta de dinheiro. Daí deve-se esperar para promulgar a Lei. E como o Direito tutela o comportamento humano, deve-se perguntar também antes de promulgar a lei: O que mudará na sociedade com a promulgação desta Lei? Mudará para melhor ou para pior?

   Toda e qualquer lei, norma, decreto, portaria, etc, muda em algum grau quantitativo e/ou qualitativo o comportamento da sociedade, o que é óbvio. Exemplo simples: aumenta o preço da gasolina por portaria de algum diretor, o cidadão que for afetado terá de mudar seu comportamento, terá que deixar de passear de carro fim de semana porque senão não terá dinheiro para trabalhar durante a semana.

   Leis de maior abrangência quantitativa e qualitativa mudam o comportamento da sociedade. Exemplo: a lei de cotas raciais promoveu o debate sobre racismo no Brasil, ou seja, promoveu o racismo no Brasil. Antes dessa lei não existia coisas como “racismo estrutural”, “dívida histórica”, etc. Talvez o leitor tenha ficado confuso agora e se perguntado: “como uma lei que veio para acabar com o racismo pode ter promovido o racismo?” O texto da lei é subjetivo. A Lei 12.711/2012, a lei de cotas raciais e seu decreto 7.824/2012. Há a expressão "autodeclarados" pretos, pardos e indígenas nos artigos 3º e 5º da lei. Ora, quando uma lei usa e/ou cria um termo ou uma expressão deve especificar no parágrafo seguinte: considera-se "autodeclarados" para os devidos fins desta lei... e estabelecer alguns parâmetros. Na lei de cotas raciais não há tal coisa, então o que vale é o sentido gramatical. Todo esse pessoal que entrou nas cotas raciais e agora está sendo acusado de fraude e tendo seu diploma e/ou emprego cassado, entrou dentro da lei. Agora estão sendo acusados de fraude por terem cumprido o que a lei determinou. As tais bancas que estão surgindo, após 8 anos da promulgação da lei, são criadas por portaria de algum Reitor e a lei de cotas está em vigor, ou seja, uma portaria de um Reitor regulamenta e altera uma lei aprovada pelo Legislativo e pelo Executivo. As tais bancas é que decidem agora pelo critério fenotípico quem pode entrar ou não nas cotas raciais. Em última instância, essas pessoas estão decidindo quem é preto, pardo ou indígena no Brasil.

   Leis assim colocam o cidadão sempre fora da lei, transformam automaticamente o cidadão num marginal - o termo “marginal” significa aquele que está à margem da Lei.

   Existe o que se chama de “ordenamento jurídico”. Esta expressão refere-se, basicamente, à hierarquia da Leis. A Constituição é a Carta Magna, a lei maior, e assim por diante. Temos leis complementares, leis delegadas, decretos, decretos-leis, etc, e cada uma vale mais do que a outra, e este ordenamento jurídico já foi completamente destruído no Brasil há décadas. No tocante aos princípios básicos do Direito então, nem se fala, isso é coisa que “non ecziste” no Brasil.

   Ao analisar-se a Constituição - e outras leis - veremos que sua esmagadora maioria é mal formulada, mal escrita e não tem aplicabilidade prática. Os “legisladores” brasileiros, as Vossas Excelências, com seu desarranjo legislativo escrevem as leis com palavras bonitas, mas vazias de conteúdo e ao lerem (se é que sabem ler) as próprias leis que escrevem, tem múltiplos orgasmos mentais: “- Olha que coisa mais linda esta lei, fomos nós que fizemos, é um avanço, não sabemos excremento nenhum de leis e nem como funciona o processo legislativo, mas somos ôtoridade”.

   A Constituição tem 250 artigos e 80 emendas constitucionais - até o momento-, sendo seis delas de revisão. Destes, 101 artigos a ser “regulamentados em lei complementar” e alguns, passados 32 anos, ainda não foram regulamentados, estão no ar, subjetividade. É por essas coisas que o Brasil é a terra dos absurdos.

   Outra coisa é a tal expressão: "Esta é uma cláusula pétrea da constituição". Ora, uma "constituição" que tem cláusulas pétrea e outras não pétreas não é uma constituição. TODAS AS CLÁUSULAS devem ser pétreas, senão não é uma constituição, pois a carta magna só pode ser alterada com uma Assembléia Constituinte. Como bem disse Roberto Campos à época: "Isso não é uma constituição, é uma estrovenga". Estrovenga: uma coisa confusa e monstruosa, esquisita, um estrupício.

   O preceito básico de uma constituição é justamente ser a Carta Magna, a Lei Maior, então é óbvio que TODAS as suas cláusulas devem ser obrigatoriamente pétreas, não podem ser mudadas toda hora. Uma coisa que tem cláusulas pétreas e cláusulas não pétreas não é uma constituição, é uma lei ordinária, uma lei delegada, um decreto, um decreto-lei, etc.

   Ora, a Carta Magna é a lei maior e não pode ser regulamentada por uma lei menor. É o poste mijando no cachorro, é o Brasil. É uma aberração jurídica. As leis complementares, ordinárias, delegadas e etc é que devem guiar-se pela Constituição e não o contrário. Isso é que é uma inversão de valores bem caprichada na qual a população brasileira é introduzida legalmente como o passivo da história. Para quem não entendeu, é o avanço linguístico da famosa expressão popular que doravante se escreve de forma clara, concisa, precisa e real: o povo só toma na bunda, mas agora é Legal.

   Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário vêm alterando a Constituição e o Estado Brasileiro há décadas ... sem Assembléia Constituinte. Não é à toa que temos essa confusão maligna dos diabos. Não é à toa que, antes de 1988 somente o pessoal do meio jurídico sabia o que era “ação de inconstitucionalidade”, após 88 começou uma chuva de ações de inconstitucionalidade e a expressão “ação de inconstitucionalidade” tornou-se corriqueira no Brasil ... até na ZBM sabem disso. ZBM é a zona do baixo meretrício, também conhecida por seu apelido carinhoso: zona.

   Donde conclui-se que no Brasil temos um excesso excessivamente excessivo de simulacros de Leis, ou seja, não temos Leis: é uma terra sem Lei onde impera a mentira, a politicagem, a ladroagem, a corrupção, a putaria, crimes variados, maus valores, etc. E isso vem da burrice, da cultura da mentira e do fingimento onde todos mentem e fingem que não estão mentindo, onde todos fingem e mentem que não estão fingindo. O Direito acabou no Brasil.

   Quem pode mais, chora menos; mas de qualquer maneira, todos choram. Até quando?

segunda-feira, 28 de setembro de 2020

Chavões


      Nós, Brasileiros, somos um povo inteligente, criativo, o problema é essa cultura da mentira e do fingimento que se instalou. Isso leva à perda do senso das proporções (discernimento), leva ao raciocínio metonímico, leva à aversão ao conhecimento, leva ao emburrecimento, leva à baixeza moral. Decai a inteligência, decai a moral e vice-versa. Decai a moral, decai a inteligência. Acontece automaticamente e quase ao mesmo tempo: decai uma, decai a outra. Por outro lado, aumenta uma, aumenta a outra.

   Antes de penetrar no assunto - e já penetrando -, analisarei signo, significado e referente.

   Signo é tudo aquilo que tem um ou mais simbolismos posto que um signo pode ter vários referentes. Tudo na vida são signos. Toda palavra é um Signo, mas nem todo Signo é uma Palavra.

   Signo, no dicionário, basicamente é sinal indicativo; símbolo. Posso relacionar signo com “os nomes das coisas” do bom e velho, mas ainda moderno Aristóteles. Tudo no mundo tem um nome que significa o que a coisa é, seja esta coisa física ou não física.

   Lembrando que "coisa", em qualquer dicionário, encontraremos o seguinte ou algo parecido, pois todos os dicionários convergem: "tudo o que existe ou possa existir, de natureza corpórea ou incorpórea".

   "Coisa" em filosofia, num sentido filosófico, é tudo o que há e tudo o que existe e possa a vir existir. Tudo o que há refere-se a todas as coisas (incorpóreas e corpóreas) e tudo o que existe refere-se somente às coisas físicas (corpóreas).

   Exemplo: Lápis é uma coisa corpórea; Liberdade é uma coisa incorpórea. Porém, "lápis" há e existe; existe fisicamente e há enquanto conceito. Liberdade somente há, pois não existe fisicamente. Qual o tamanho da Liberdade (altura, largura e profundidade - as 3 dimensões), qual a cor, etc. Contudo, sabemos que essa tal Liberdade manifesta-se na realidade.

   Um signo também é uma letra, uma palavra ou uma expressão composta de duas ou mais palavras. As letras do alfabeto são, nesse sentido, signos. Cada letra representa, refere-se a seu fonema específico, a seu som específico. Uma letra é um sinal gráfico, um signo. A letra “a”, por exemplo, representa o fonema /a/, o som aaaaaaaaaaaa, onda sonora que se propaga pelo ar e chega aos ouvidos do ouvinte. A letra “a” é o signo, seu significado é: primeira letra do nosso alfabeto. Seu referente é o fonema /a/, o som aaaaaaaaaa.

   Porém, um signo pode ser também um cheiro, um gosto, uma cor, etc. Exemplo: estou andando na rua e sinto um perfume, um cheiro bom, de rosas, olho para os lados e não veja as tais rosas, nem um vaso na janela, mas sei que aquele cheiro é de rosas posto que já cheirei rosas, então já tem um símbolo atrelado a este signo.

   Outra circunstância: estou andando na rua e sinto um perfume, cheiro bom, ou um fedorão, mas seguiremos com perfume - é melhor -, porém, não identifico qual o referente deste perfume, sei que é um cheiro bom, mas não sei se é comida, flores, etc. O fato de gostar do cheiro não implica em simbolismo.

   Mario Ferreira dos Santos, no seu Tratado de Simbólica, coloca que tudo é símbolo, a realidade é simbólica.

   A Estátua da Liberdade: num primeiro momento ela simboliza a Liberdade, num segundo momento pode simbolizar um presente que a França deu para os EUA, então teremos dois simbolismos atrelados ao mesmo signo.

   Caso eu fizer o sinal da Cruz sabemos o que isso significa, qual(is) o(s) simbolismo(s).

   A palavra “lápis” é o signo que se refere ao objeto físico lápis. A palavra “liberdade” é o signo que se refere ao objeto não físico liberdade; e assim por diante. Toda palavra é um signo, mas nem todo signo é uma palavra.

   Significado é significar um signo através de outros signos. Todo significado é genérico posto que nos dá uma boa idéia do referente (o que a coisa é), porém, não nos diz com exatidão o que a coisa é.   Dentro do significado temos os vários sentidos cujos veremos adiante.

   Significado, no dicionário, é relação de reconhecimento, de apreço; valor, importância, significação, significância. Porém, para nosso entendimento, “significado” também é um signo explicado por outras palavras. Significado também é dizer o que a coisa é através de palavras, dizer o que uma palavra significa através de outras palavras. Mas até aí estamos somente no campo das palavras.

   Lápis - instrumento para escrever, desenhar ou riscar, que consiste geralmente em um estilete de grafite revestido de um invólucro de madeira.

   Liberdade - grau de independência legítimo que um cidadão, um povo ou uma nação elege como valor supremo, como ideal.

   Dentro do significado temos os vários sentidos que veremos adiante.

   "Definição" é delimitar o objeto de estudo, estabelecer limites, é a significação precisa e delimitada. O "significado" é genérico, a "definição" é específica.

   Exemplo: o significado de lápis é "instrumento para escrever, desenhar ou riscar, que consiste geralmente em um estilete de grafite revestido de um invólucro de madeira".

   A definição de um lápis seria o significado mais as características específicas (categorias aristotélicas do lápis): "instrumento para escrever, desenhar ou riscar, que consiste geralmente em um estilete de grafite revestido de um invólucro de madeira, sendo que este lápis é da cor verde, formato sextavado, tem uns 18 cm, tem uma virola que segura uma borracha na ponta, etc".

   Podemos perceber que nem todos os lápis são da cor verde e nem todos tem o formato sextavado, etc, porém, o significado é o mesmo para todos os objetos que tem um bastão de grafite, uma camada de madeira em volta e servem para rabiscar, escrever e desenhar no papel, por isso é genérico. Tem também lápis de cor, lápis de cera, etc, porém, todos são lápis em relação ao conceito.

   Referente é o que a coisa é em si. É aquilo ao que o signo e o significado se referem na realidade.

   Tem também "signo, significado e significante"; ou "signo, interpretante e objeto". Depende do ponto de vista que se olha: da tal da semiologia ou da tal da semiótica. No fim são tudo a mesma coisa, mas prefiro a tríade, a trindade - quase divina: signo, significado e referente. Fica mais claro.

   Referente é o que a coisa é, tanto na realidade física quanto na realidade metafísica. Lembrando que estamos vendo conceitos básicos, metafísica aqui refere-se ao significado da palavra etimologicamente falando: do latim metaphysica, do gr. tà metaphysiká, "os (tratados) depois da física"... aquilo que está além da física.

   Lembrando que Física, no sentido que estamos falando vem, basicamente, do grego phusikês, "ciência, estudo da natureza", ou seja, aquilo que está além da natureza física, além das coisas físicas, corpóreas. Lembrando que os Gregos discerniam entre Natura Naturans e Natura Naturata.

   A etimologia das palavras tanto pode ajudar quanto atrapalhar, porém, faz parte do aprendizado você distinguir entre uma coisa e outra.

   Signos e significados encontramos prontos em qualquer dicionário. O referente encontramos na realidade.

   Os signos estão organizados de forma alfabética nos dicionários. Cada signo tem seu significado e tem também seus sentidos, ou seja, um signo tem seu significado genérico (básico) e tem dois ou mais sentidos aos quais ele pode se referir. Sentido: aquilo que uma palavra ou frase podem significar num contexto determinado.

   Os vários sentidos os quais uma palavra pode ser empregada também é, grosso modo, o que alguns linguistas como Saussure chamava de Significante/Significado ("Mas estes termos (significante/significado) ainda são equívocos. Não ganhamos essa palavra que nos falta e que designaria sem ambiguidade possível seu conjunto", Saussure é meio confuso nessa parte, por isso tomaremos aqui "essa palavra que nos falta" como sendo 'sentidos'), e Peirce chamava de Interpretante.

   Darei como exemplo de "vários sentidos" essas duas frases com a palavra Inteligência:

   "Aquela pessoa tem inteligência" e "Aquela pessoa trabalha numa agência de inteligência". A palavra, o signo (toda palavra é um signo, mas nem todo signo é uma palavra) é a mesma: "inteligência", porém, de acordo com o contexto muda o sentido da palavra, mas sem se afastar do significado que em si é genérico.

   Vou tomar agora como exemplo a palavra “categoria” analisando-se o dicionário:

substantivo feminino

1     conjunto de pessoas ou coisas que podem ser abrangidas ou referidas por um conceito ou concepção genérica; classe

Ex.: ele pertence à c. dos superdotados

2     grau negativo ou positivo de excelência; qualidade

Ex.: um trabalho de alta c.

...

6     Rubrica: esportes.

cada um dos grupos em que, por sua idade, peso, desempenho etc., se repartem os desportistas

Ex.: lutador da c. peso pesado

...

8     Rubrica: filosofia.

no aristotelismo, cada um dos conceitos que formam o conjunto dos gêneros ou divisões primeiras do ser (substância, qualidade, quantidade, relação etc.)

...

10   Rubrica: linguística.

cada uma das classes de elementos do sistema linguístico, organizada de acordo com um determinado critério: semântico, gramatical, funcional etc.

Exs.: c. de palavras

 c. do tempo

 c. do discurso

Houaiss.

    Vemos que o primeiro significado é seu significado genérico, básico. Os outros são o que se chama de sentidos nos quais podemos empregar a palavra. Podemos perceber que os vários sentidos não fogem do significado genérico, básico. Exemplo: o sexto sentido (rubrica: esportes) refere-se à categoria de pessoas; o décimo sentido (rubrica: linguística) refere-se à categoria de coisas. Porém, isso não é uma fórmula mágica, são somente parâmetros os quais você utiliza para melhor entendimento, para melhor interpretar um texto - escrito ou falado. Você não precisa andar com um dicionário e uma gramática embaixo do braço, mas já está pronto ali... faça uso. Aliás, você já anda com um dicionário e uma gramática na mão todos os dias, você anda com uma biblioteca gigantesca na mão: seu celular com internet.

   Então temos vários sentidos nos quais podemos empregar uma palavra, porém, mesmo assim não podemos fugir disso, não podemos inventar sentidos para as palavras, porque se o fizermos, perde-se o referente da realidade. O referente nós captamos no conjunto da frase, do enunciado, das orações, dos parágrafos, etc.

   A menor unidade da língua é a palavra, mas por que não é a letra? Porque uma letra é somente um sinal gráfico de um som. Nós não nos comunicamos por grunhidos: aaaaaa, ggggg, mmmm, rrrrrrr, grrrrr, etc. Um signo para ter um significado na comunicação precisa ser uma palavra, precisa ser o nome de uma coisa.

   Nós juntamos as letras e formamos as palavras, juntamos as palavras e formamos frases, juntamos frases e formamos parágrafos, juntamos parágrafos e formamos capítulos, juntamos capítulos e formamos livros, juntamos livros e formamos enciclopédias, compêndios, etc. E assim podemos seguir em divisões de gênero, espécie, sub-espécies, etc. E todos precisam estar organizados analítica e logicamente entre si.

   A gramática é o conjunto de prescrições e regras que determinam o uso considerado correto da língua escrita e falada. Contudo, a gramática não é somente esse conjunto de regras, pois a gramática representa, grosso modo, os signos e os significados com seus sentidos. O referente trata-se da coisa na realidade. Posso dizer também que o referente trata da parte analítica e lógica.

   Contudo, deixo bem claro que signo, significado (com vários sentidos) e referente é um conjunto, uma trindade - quase divina - e não se pode analisar separadamente em questão de raciocínio.

   Repito: deixo bem claro que signo, significado (com vários sentidos) e referente é um conjunto, uma trindade - quase divina - e não se pode analisar separadamente em questão de raciocínio.

   Repito de novo: deixo bem claro que signo, significado (com vários sentidos) e referente é um conjunto, uma trindade - quase divina - e não se pode analisar separadamente em questão de raciocínio.

   E aqui já faço uma distinção entre pensamento e raciocínio. Pensar, todo mundo nasce sabendo pensar. É preciso aprender a raciocinar, organizar e concatenar os pensamentos, estabelecer relações lógicas entre coisas e coisas, entre fatos e fatos e entre coisas e fatos e vice-versa.

   Raciocínio (modo de pensar); modo de articular, organizar, concatenar os pensamentos, um pensamento organizado logicamente após o outro. Toda comparação envolve uma relação e vice-versa, relação aqui no sentido de relacionar, não de relatar. Aquela relação de Aristóteles, uma relação surgida naturalmente: dobro, metade. - Dois é o dobro de quê? - Dele mesmo, oras! Vejam a relação natural: dois é o dobro de alguma coisa, está relacionado com outra coisa; uma coisa não pode ser o dobro - ou a metade - de nada ou dela mesma, mas não me estenderei nisso.

   Vou dar um exemplo de um chavão, bem prático, para entendermos como funciona o processo signo-significado-referente: “Nunca ouvi falar disso, mas não tem cabimento”. Um sujeito fala alguma coisa para esse animal e ele responde com a pérola acima. Temos as várias variações dessa mentalidade. Um sujeito fala alguma coisa e o animal responde: "Não é bem assim", e você pergunta: "Se não é bem assim como estou falando, como é então?" e o animal responde: "Como é eu não sei, a coisa não é tão simples assim, é mais complexa e por ser complexa eu não sei explicar e bla bla bla".

   “Nunca ouvi falar disso” é um pensamento e “mas não tem cabimento” é outro pensamento, gramaticalmente (na palavra falada e na palavra escrita) são duas orações - frases, orações, períodos... essa coisa toda. Lembrando que expressamos os pensamentos e raciocínios através da palavra falada e da palavra escrita. Tudo aquilo que falamos e escrevemos reflete como é a nossa mente, nossa cabeça. Quando você fala ou escreve deve expressar um raciocínio, senão estará somente divagando. O conjunto “Nunca ouvi falar disso, mas não tem cabimento” não é um raciocínio. São somente dois pensamentos desordenados expressados em palavras que formam essas duas orações que formam essa frase. O animal está dizendo que nunca ouviu falar daquilo (que o outro falou; seja uma afirmação, uma pergunta, etc), mas está chegando à conclusão imediata de que não tem cabimento. Ora, se nunca ouviu falar - ele mesmo admite isso - como é possível chegar numa conclusão, seja ela com cabimento ou não? Caso ele respondesse: "Nunca ouvi falar disso, mas tem cabimento", daria no mesmo. O correto seria responder: "Nunca ouvi falar disso, mas vou informar-me, vou pesquisar". Aí temos um raciocínio, uma concatenação de pensamentos de acordo com a realidade. Devido a eu não ter conhecimento do assunto devo, obrigatoriamente, informar-me sobre.

   Espero que o leitor tenha percebido que o animal em questão é um jumento. Ele é burro no sentido de analfabeto funcional, não percebe isso e ainda se acha o gostosão.

   Ele poderia ter dito: "Nunca ouvi falar disso, mas vou pesquisar, informar-me". Aí temos um raciocínio.

   Tudo o que você fala e escreve são seus pensamentos e raciocínios materializados. As ondas sonoras são físicas, a tinta no papel é física.

   A tal frase “Nunca ouvi falar disso, mas não tem cabimento” na letra fria da gramática está correta (signo, significado e regras), porém, falta o referente, falta a parte analítica-lógica do raciocínio. Então a gramaticalidade se perde automaticamente, pois a linguagem não é somente palavras ordenadas em regras gramaticais. A linguagem deve expressar idéias, raciocínios, conceitos, etc, de forma clara.

   Aliás, faço uma pergunta: o que veio primeiro, a linguagem ou a gramática?

   A resposta é óbvia: a linguagem. Ou estava lá o ser humano nos primórdios (seja esse primórdio do tempo das cavernas ou do tempo de Adão e Eva) sem saber falar uma determinada língua e caiu uma gramática pronta do céu? E daí olharam aquele livro cheio de sinais estranhos e chegaram à conclusão: agora vamos aprender a ler e a falar!

   A gramática foi surgindo, estruturando-se ao longo do tempo. A esmagadora maioria das regras gramaticais surgiram com uma base na realidade, com um referente na realidade. E não o contrário.

   A linguagem é uma convenção e não uma invenção (veja só de novo, signos e significados com seus sentidos; invenção e convenção). Alguns nomes de coisas foram inventados, mas no momento em que foram associados ao objeto ganham um significado e tornam-se uma convenção e não dá para mudar isso. Exemplo: a palavra, o nome, o signo “lápis” tem um significado. Quando o cara que inventou o lápis, sabe-se lá quando (vá pesquisar), nominou de lápis, seja lá qual tenha sido o processo de nominação utilizado pelo vivente na época - uma característica do lápis, etimologia, etc - ou simplesmente o cara resolveu chamar de lápis porque quis, mas a partir desse momento tornou-se uma convenção. Alguns nomes têm a ver com a coisa em si. E não dá para mudar isso porque perde-se a comunicação. Se mudarmos qualquer um dos dois - signo e/ou significado - bagunça-se o referente.

   Por exemplo, caso eu definir, significar um lápis como região glútea, ao me expressar os outros não saberão do que estou falando, perderão o referente. Imagine a frase: Você tem uma região glútea aí? Ou se eu falar: Você tem um lápis aí para me dar?, referindo-me à região glútea do cara. Dará problema.

   Mas vamos a um exemplo mais elaborado e deixar a jocosidade de lado. Estado ético. “Vamos implantar um Estado Ético no Brasil”. Aparentemente é uma coisa boa, um Estado Ético, um Estado baseado na honestidade e na moralidade. Porém, o signo “ético” na expressão não se refere às normas, valores, prescrições e exortações presentes em qualquer realidade social. O signo “ético” refere-se ao ajuste entre as normas sociais e as necessidades da produção, isso no sentido Gramsciano, Antonio Gramsci. Então o vivente está falando em criar leis, ajustar as normas sociais às necessidades da produção, seja lá quais forem elas.

   Vamos a outro exemplo: Hegemonia Cultural. Hegemonia é supremacia, influência preponderante exercida por cidade, povo, país etc. sobre outros. Cultural vem de cultura. Então “hegemonia cultural” é a predominância de uma cultura sobre todas as outras. Qual cultura? A que está predominante no momento histórico da sociedade, seja lá qual for essa cultura. Para Gramsci, “hegemonia cultural” é a predominância do socialismo sobre todas as outras culturas. Então quando um cara desses fala em “hegemonia cultural” ele está falando em implantar o socialismo. Numa tacada só Gramsci definiu o socialismo/comunismo como uma cultura - o que de fato é -, mas transformou o significado de um signo, alterou a convenção da língua baseado em nada, tirou do ânus dele.

   É assim que você vira socialista sem nem perceber, repetindo chavões os quais você nem sabe o que significa e, quando descobre, daí já não importa mais, pois você já está emburrecido e imoral. Daí para ser amoral é um pulinho.

   Eu poderia falar aqui de Heidegger e tantos outros que, para ler, precisa-se de um dicionário de termos Heideggerianos, ou Gramscianos, ou Hegelianos ou da PQP. Dicionários estes que, muitas vezes, ultrapassam mil páginas. Nada contra esses autores, mas perde-se a clareza dos escritos deles. Parece-me estranho que se tenha de ler um dicionário de termos e expressões próprias, um glossário individual, para entender o quê o autor escreveu. Vários autores dessa Filosofia e Literatura moderna e contemporânea tem essa mania feia de inventar exageradamente termos e expressões próprias que mudam o signo e/ou significado fazendo perder e/ou confundir o referente. E assim vamos emburrecendo. Se formos pegar Marx - não no sentido pejorativo de pegar -, a coisa é mais brutal ainda. Marx não trabalha com definições, ele trabalha com determinações. Vai desdobrando o objeto até o infinito na intenção de concretizá-lo - como se consegue desdobrar um objeto de estudo até o infinito e depois concretizá-lo é uma coisa que me escapa. Marx não define nada, vai desdobrando tudo até virar uma confusão mental na qual nem ele mesmo entende mais do quê ele estava falando. Porém, na escrita desses caras sempre há um significado oculto, um truque lá que confunde os idiotas que não sabem interpretar um texto.

   Não é à toa que ainda se discute certos autores há 300, 400, 500 anos - ou mais - e não se chega sequer a uma conclusão básica sobre o quê o cara está falando. E nesse momento o burro da parada é sempre você, leitor. Você que não entende a genialidade deles. Você que está refutando eles... e como você ousa refutá-los? É a discussão sem fim, é a crítica radical de tudo quanto existe. Este é, grosso modo, o significado oculto.

   Essa frase já se tornou um chavão no Brasil: “Olha lá, o cara está refutando tal autor... ha ha ha!

   Vamos analisar. Refutar, nesse sentido, significa afirmar o contrário de; desmentir, negar. Mas o cara está realmente refutando, está afirmando o contrário? Ou está somente apontando um erro, dando combate por meio de argumentos?

   Se o autor da refutação está afirmando o contrário, então é uma refutação e você está certo no seu enunciado: ele está mesmo refutando tal autor. Mas, nesse momento, você sabe se o “refutador” está certo ou errado? Você já leu o autor em questão que o outro está refutando? Se não leu, então cala a boca porque não tem referente no que você fala. Aah, mas tem 50 outros que afirmam o contrário do “refutador”. Sim, e daí? Pergunto de novo: você já leu o autor em questão? Se não leu, então como você sabe se são os 50 que estão certos ou se é o “refutador” que está certo? Você está raciocinando somente pela parte quantitativa e está esquecendo a parte qualitativa. São várias variáveis envolvidas no processo de raciocínio.

   Você sequer conhece os significados dos signos e quer dar palpite? Você nem sabe o que é um palpite e o que é uma opinião. Provavelmente você é daqueles que fala que vai dar a sua opinião... e sempre o que vem depois é um palpite, geralmente furado.

   Um palpite, neste sentido, é uma coisa saída da sua cabeça ignorante do assunto. Uma opinião requer um embasamento, uma razão suficiente (leia Mário Ferreira dos Santos, Lógica e Dialética, e você saberá o que é uma razão suficiente e verá que é bem simples). Mas deixarei aqui um gostinho:

“Princípio da Razão suficiente.

Este princípio é também considerado como um dos princípios lógicos. Poderia ser exposto assim: um enunciado é verdadeiro ou falso; se pretende ser ele verdadeiro, necessita uma razão que o fundamente, que o apoie. Chama-se a essa razão de "suficiente" quando, por si, é bastante para servir-lhe de completo apoio.

É uma razão suficiente, quando não falta mais nada para que o enunciado seja verdadeiro.”

   Você usa isso todo dia e não sabe. Quando você diz: “O cara está se contradizendo”, você está dizendo que a razão dele não foi suficiente, ou seja, o que ele disse depois não serviu de apoio ao que ele disse antes. Veja só como é simples, nesse caso. “Nunca ouvi falar disso, mas não tem cabimento”, não tem referente porque a razão “mas não tem cabimento” não serve de apoio ao enunciado anterior “nunca ouvi falar disso”.

   Às vezes a razão suficiente é o próprio referente não expresso em palavras. Temos um político - já que a política está em voga - berrando no microfone: “Prometo acabar com o desemprego no Brasil!”. O verbo acabar é um signo e tem um significado. O referente você capta no conjunto da frase. Esse animal está dizendo que não terá mais nem UM desempregado no Brasil. Ora, isso é impossível de se fazer na realidade. O referente, nesse caso, é impossível, portanto, esse animal ou está mentindo ou não sabe do que está falando. E isso sequer é uma promessa. Só se promete o que é possível de se cumprir. Se ele tivesse gritado: “Prometo diminuir o desemprego no Brasil!”, aí teríamos uma promessa com um referente factível na realidade. Para saber se ele cumprirá a promessa, vote nele. O animal se elege e daí emprega um parente que estava desempregado. A promessa estará cumprida, pois ele não disse de quanto iria diminuir o desemprego.

   A parte analítica e lógica, mencionada antes, é dela que você capta o referente, é o raciocínio analítico que leva à lógica. Você raciocina, faz um processo de análise nas catracas (engrenagens) da sua cabeça e chega a uma conclusão, e esta, pode ter lógica ou não. É, nesse sentido, o pensamento natural do ser humano. Você, provavelmente, caso chegou até aqui na leitura, durante o texto devem ter passado coisas na sua cabeça, pensamentos, raciocínios, talvez devaneios até, ou seja, você estava fazendo um processo de análise deste texto e talvez leu até aqui porque achou péssimo, mas quer ver no que isso vai dar. Mas fez um processo de análise natural na sua cabeça e chegou a uma conclusão e esta conclusão pode ter lógica ou não. Caso a sua conclusão tenha lógica, então você encerra o processo de análise ou se aprofunda no assunto, estuda um pouco mais, informa-se um pouco mais. Caso a conclusão não tenha lógica, então se faz necessário que você analise um pouco mais, estude mais, informe-se mais. Fazemos isso o tempo todo. Então vemos que essa tal de lógica é o que vem depois dessa tal de analítica.

   Veja bem, no Organon de Aristóteles - sempre esse cara - o substantivo “lógica” está ausente. Aristóteles não raciocinava com “lógica”, essa palavra nem existia, o logos significava outra coisa. Lá nessa época Grega, no meio do mato, ele raciocinava com “analítica”. Para citar somente Pinharanda Gomes, o substantivo Lógica está ausente no Organon. “O substantivo lógica é forma tardia, mais devida ao eclectismo alexandrino e romano do que ao magistério liceal.” Então, é mais apropriado falar em Analítica Aristotélica. Vemos que, além de cronologicamente na história, a lógica, como a conhecemos atualmente, surge naturalmente depois da analítica. É o processo natural de análise que você faz na sua cabeça. Você faz automaticamente um processo de análise, chega a uma conclusão e esta conclusão pode ter lógica ou não. Isso tudo se chama, também, raciocínio.

   E, no meio disso tudo, temos a razão e a emoção. Razão no sentido de raciocínio, não no sentido de certo ou errado. E “emoção” no sentido de emoções, sentimentos, vontades, desejos, sensações, intenções... é, nesse caso, a parte psicológica do ser humano.

   O ser humano é um ser racional E um ser emocional. Não tem como separar, dissociar a razão da emoção aí dentro de você como se o ser humano tivesse uma chavezinha nas costas: pec, agora estou no modo razão; pec, agora estou no modo emoção. Ao ler meu texto, provavelmente ele evocou raciocínios em você e provocou alguma emoção: “É, até concordo em parte com o que esse cara escreveu, mas não estou gostando muito deste texto”. Razão e Emoção.

   É impossível separar a Razão da Emoção em um ser humano, mas é possível causar um desequilíbrio e fazer as pessoas reagirem pela emoção com que as palavras e as coisas causam no vivente, seu comunista ou seu capitalista. Daí vem aquela pergunta: Você sabe o que é “ser um comunista”? Ou um capitalista? Se não souber, então você está pensando por chavões, reage automaticamente pela emoção. Você já não tem raciocínio. Reage toda afetadinha e já está burro. Esvaziou um signo de significado (e de sentidos) e colocou no lugar uma emoção.

   “Nunca ouvi falar disso, mas não tem cabimento”: reação pela emoção. Mais ou menos assim: “Como esse cara ousa me falar ou perguntar uma coisa que eu não sei? Será que esse cara não sabe que tudo o que eu não sei não existe?”

   Chegamos nesse ponto: “A ignorância é fonte de autoridade intelectual”, Olavo de Carvalho.

   Vou falar agora sobre Olavo de Carvalho, aliás, já vinha falando e você que não percebeu.

   Quando ele fala: "O Brasileiro raciocina metonimicamente". O que é metonímia? É uma figura de linguagem que consiste no uso de uma palavra fora do seu contexto semântico normal, por ter uma significação que tenha relação objetiva com seu referente. Por exemplo: "O cara lá está montado no ouro". Você quis dizer que o cara lá tem dinheiro, é rico. Você trocou "ouro" por "dinheiro". "Bebi uma garrafa de cachaça". Você quis dizer que bebeu a cachaça da garrafa. Você trocou a ordem sintática. Figuras de linguagem são recursos estilísticos, devem ser usadas com parcimônia, com economia. Quando você faz muito isso, você troca as palavras e você troca o seu raciocínio. Você já não entende mais as coisas. Pensamento/raciocínio, linguagem e comportamento - abaixo discorro um pouco mais para entender como uma afeta a outra, como se muda o comportamento das pessoas através da mudança da linguagem, das palavras.

   Essa afetação toda que o Brasileiro tem, da qual o Olavo fala, grosso modo, vem do eufemismo, outra figura de linguagem: palavra, locução ou acepção mais agradável, de que se lança mão para suavizar ou minimizar o peso conotador (sentido figurado) de outra palavra. "Vossa Excelência está faltando com a verdade". O cara quis dizer que o outro está mentindo e, de certa forma, é uma metonímia também, trocou as palavras. E trocou a palavra "verdade" pela palavra "mentira", que nem sinônimos são. São as nuances da língua. Em alguns casos é até aceitável falar "você está faltando com a verdade", mas em outros casos não. Ao usar de muitos eufemismos você minimiza a gravidade da coisa, você tira a importância do referente, no caso, você minimiza a gravidade da mentira que o outro contou.

   E temos também a sinonímia no sentido de usar sinônimos em demasia. Cada palavra é um signo, é um nome de uma coisa e tem um significado e vários sentidos. Quando se usa sinônimos deve-se ter cuidado para que não se altere o significado e/ou o sentido da sentença, da frase. Um sinônimo utilizado erradamente pode alterar o referente da frase. No exemplo acima nem são sinônimos, verdade e mentira são coisas diferentes, neste caso, opostas. Este ditado: "Voltar às coisas mesmas" é isso, é usar as palavras certas nos lugares certos, chamar as coisas pelos nomes.

   Então, grosso modo, do raciocínio metonímico vem a burrice e com o raciocínio eufemístico vem essa afetação toda, essa pose toda onde o cara é burro, não percebe, mas se acha o gostosão.

   No Brasil, ao lermos um texto no jornal, num livro, etc, de maneira geral, a entonação afetada na voz surge naturalmente mesmo que você queira ler o texto normalmente sem dar entonação nenhuma na voz.

   Fiz esse interregno sobre o véio Olavo porque se fez necessário.

   De onde vem as idéias? A neurociência não sabe, mas se você ler, absorver informações, estudar, vivenciar, etc, estará aparelhando seu cérebro com conhecimento e, um belo, dia, isso volta em forma de idéias. O que eu já escrevi até agora neste texto, 99,9 % não são idéias minhas e o que continuarei escrevendo também não serão idéias minhas. São coisas que li, estudei, interpretei, raciocinei, "queimei a mufa". São coisas que caras muito mais sabidos do que eu já queimaram a mufa raciocinando e deixaram pronto para nós, basta ler. Mas não, você não quer ler, você quer reinventar a roda todos os dias. Quer fazer uma roda quadrada. O ser humano se comunica, basicamente pela palavra falada e pela palavra escrita. Você, que não lê, está perdendo 50% do conhecimento humano. A palavra falada se esvanece no ar, você precisa ler para sedimentar o conhecimento. Mas não há uma ordem de prioridade entre a palavra falada e a palavra escrita, as duas são importantes.

   Mas vamos a outra forma de pensamento por chavões. Tem palavras na Língua Portuguesa - e em qualquer língua - que não batem, não casam, não "fecham". Tem orações que não batem, não casam também; frases, parágrafos, etc. Por exemplo, vou formular uma frase: “A pedra da bola pegou fogo e veio o cachorro e comeu, daí o cachorro saiu voando e explodiu”. Na ortografia e na sintaxe até está correta a frase. Mas, e o referente que decorre da semântica? Ache um referente nisso aí. Ache um sentido (semântica) nessa frase.

   Pois é, “nunca ouvi falar disso, mas não tem cabimento” é a mesma coisa. É a pedra da bola...

   Aquela frase daquele ministro do STF: “Toda tirania deve ser afastada, inclusive a tirania da maioria que elege o Executivo e o Congresso.” É a pedra da bola que pegou fogo. É um jumento zurrando.

   Vamos interpretar. “Tirania” em qual sentido está empregado na frase? Não fica claro. Ele trocou conceitos por palavras. Tirania: poder soberano usurpado e ilegal; governo de tirano. Neste sentido, “tirania” implica em um tirano e isso por si é a minoria. Então ele estava falando da “minoria da maioria”?!?

   Vamos, por descargo de consciência, interpretar que ele estava falando de “tirania” enquanto opressão. Ora, o referente você entende pelo conjunto da frase. Quem elege o Executivo e o Congresso? São os eleitores, e o próprio Ministro é um eleitor, então ele mesmo se chamou de tirano, de opressor e não percebeu. Mas estranhamente ele acertou.

   O problema da parte semântica é esse. Percebam que a frase em questão está correta ortograficamente e sintaticamente, mas cagou-se na semântica. Ele fez “relação” entre coisas que não tem como relacionar, ele juntou palavras da Língua que não dá para juntar. É como se eu falasse ou escrevesse: “A pedra da bola pegou fogo”. Ortograficamente e sintaticamente está correta a frase, mas encontrem um sentido (semântica) nessa frase.

   Vamos mais além analisando a frase. A expressão “tirania da maioria” já é em si imbecil. Democracia é a vontade da maioria, então “tirania da maioria” é a tirania da democracia. Pronto, agora tirania é democracia e democracia é tirania, guerra é paz, liberdade é escravidão e por aí vai. Este é o problema de trocar conceitos por palavras e ficar juntando palavras aleatoriamente. Perde-se, de certa forma, o contato com a realidade, fica-se meio insano. É a pedra da bola que pegou fogo. É aquela anedota de um louco oferecendo 100 reais para outro louco subir pelo facho de luz da lanterna e o outro responde: “Está achando que sou bobo, quando eu estiver no meio você desliga a lanterna e eu caio”. É mais ou menos a mesma falta de lógica. Conversa de doido.

   Quando se junta palavras, signos da língua que não dá para juntar acontece isso daí. Emburrecimento. E quando decai a inteligência, decai a moral e vice-versa. Decai a moral, decai a inteligência, acontece quase ao mesmo tempo, mas vai indo paulatinamente, aos poucos, o vivente não percebe que está ficando burro, pois a inteligência é uma das poucas coisas (senão a única) que quanto mais você perde, menos você se dá conta de que está perdendo. Por exemplo: caso você tenha duas notas de 50 reais e perde uma, você se dá conta. Agora, meça quantitativamente a inteligência, diga-me quanto de inteligência você tem. O famoso QI - Quociente de Inteligência - é quantitativo no resultado, mas é somente uma convenção em números. Aliás, o "teste de QI" não existe. O que existe é o teste de Idade Mental. O QI é o resultado da fórmula (IM/IC)x100. Idade Mental dividida pela Idade Cronológica e o resultado é multiplicado por 100, para não restarem frações. Então, essa fórmula diz somente se a sua idade mental corresponde à sua idade cronológica. A média aritmética de vários QIs é somente isso, a média. Por essa média você sabe se está acima ou abaixo da média, mas essa fórmula diz somente se a sua idade mental corresponde à sua idade cronológica. É somente um parâmetro, um bom parâmetro, mas nada além disso. Eu poderia falar ainda sobre o teste de IM - aquelas várias questões -, quem faz ele? Como são elaboradas as questões? Qual a cultura de quem elabora essas questões? Você faz um teste desses hoje, dará um resultado; você repete o mesmo teste depois de um mês, dará o mesmo resultado? E existem testes de IM para várias faixas de idade?

   Nunca fiz e nunca pretendo fazer tal teste, vai que eu descubra que sou um idiota. Ou, talvez, vai que eu descubra que sou um gênio. Ou pior ainda: vai que eu descubra que estou na média da mediocridade. Mas, enfim, vamos passar para outro objeto do assunto.

   Lembremo-nos que a esmagadora maioria das regras gramaticais estão calcadas na realidade, vieram da realidade, e não o contrário. Aconteceram ao longo do tempo na humanidade, a linguagem foi se desenvolvendo, mas sempre com base na realidade, em algum referente. E quando você inverte esse processo, você, de certa forma, inverte o raciocínio analítico, tenta chegar a uma conclusão sem ter analisado sequer as partes que compõem o todo, tenta entender o todo através de somente uma ou duas partes - isso é impossível. E a base de tudo é a linguagem.

   Você não precisa decorar a gramática, nem o dicionário - até porque é impossível -, mas falando, lendo e escrevendo, e, às vezes, consultando o dicionário e a gramática para dirimir uma provável dúvida, você vai longe, vai aprendendo por "osmose". Lendo textos bem escritos você aprende a forma correta da escrita. Tem autores - vários - que fazem pouco uso da gramática, mas escrevem de forma correta e não é porque somente "aprenderam lendo", mas aprenderam a captar o referente das coisas, das frases.

   Um adendo. Dentro da gramática temos a ortografia, a sintaxe e a semântica - e outras. Mas vamos tomar por base essas três. Ortografia: conjunto de regras estabelecidas pela gramática normativa que ensina a grafia correta das palavras. Sintaxeparte da gramática que estuda as palavras enquanto elementos de uma frase, as suas relações de concordância, de subordinação e de ordem. Semântica: estudo sincrônico ou diacrônico da significação como parte dos sistemas das línguas naturais, o componente do sentido das palavras e da interpretação das sentenças e dos enunciados.

    Erro ortográfico, por exemplo, é trocar "ç" por dois "s", escrever "caza" em vez de "casa". Erro sintático, por exemplo, "Nós vai lá"; há um erro de concordância do sujeito com o verbo; o correto é "Nós vamos lá". Quando você troca "mais" por "mas" há dois erros: de ortografia e de semântica. Nem sempre erros ortográficos e/ou sintáticos levam a erros semânticos, por exemplo: "Nós vai lá!", há erro sintático, mas você capta o referente, a semântica da frase, você entende o que o cara quis dizer. Porém, muitos erros ortográficos e sintáticos levam a um erro semântico, você não capta o sentido da frase porque o animal não sabe escrever ou falar. Então, quando estiver lendo um livro (ou qualquer outra coisa) procure identificar e discernir entre ortografia, sintaxe e semântica.

   A maioria comete erros de semântica, erra nos sentidos das palavras, das orações, das frases, enfim, do referente. Neste sentido, o referente também se confunde com a semântica, sentido das palavras, da interpretação de texto, das frases, sejam elas faladas ou escritas.

   Para entendermos melhor que a tal da linguagem não são somente palavras e a tal da gramática não são somente regras inventadas, elas tem uma base na realidade. Vamos a um exemplo simples. A palavra "de" é o nome de uma coisa. É um signo também. É o nome da preposição "de". "Vou DE um lugar para o outro". Caso escrevesse "Vou um lugar para o outro". Ficaria esquisito. A conjunção "para", "Vou de um lugar PARA o outro". Caso escrevesse - ou falasse - "Vou de um lugar o outro". Ficaria estranho. E isso acontece porque quem vai, vai de um lugar para o outro. Ninguém vai de um lugar para o outro e fica parado. E se falar "Vou para casa" e ficar parado ou for para outro lugar, há um erro semântico, perde-se o referente na realidade.

   É óbvio que, talvez, o leitor raciocine agora: "Mas e se eu mudar de idéia?" Eu falo: "Vou para casa" e mudo de idéia e não vou. Bom, aí esse raciocínio surgiu devido a essa base dada acima. Vejam como as coisas na linguagem acontecem naturalmente quando se raciocina. Signo, significado e referente.

   Vamos a outro exemplo. “Politicamente Correto”. Expressão bastante em voga hoje em dia. Mas o que é isso? Qual é o referente?

   “Politicamente”, ocupar-se de política, fazer política. “Correto”, que se corrigiu, isento de falha, ou, em outro sentido, possuidor de bom caráter.

   Então “politicamente correto” é a pessoa que é correta na política; é a pessoa que tem uma política correta; é uma coisa que se corrigiu ao fazer política; é alguém possuidor de bom caráter ao fazer política... ou o que é isso, qual o referente?

   Por exemplo, a pessoa que é correta na política, necessariamente é um político; mas a pessoa que tem uma política correta não necessariamente é um político, pode ser um cidadão que tem uma política de vida e segue ela. Então são coisas diferentes.

   Não se sabe qual é o referente porque um imbecil qualquer juntou duas palavras nessa expressão onde uma palavra altera o significado da outra.

   E daí aparece outro imbecil - ou o mesmo - que se julga o supremo sabedor da verdade, um ser iluminado, que inventa, caga uma definição para essa expressão sem referente. E a definição inventada, por não ter referente na realidade é automaticamente esdrúxula, completamente subjetiva.

   “O termo ‘politicamente correto’ é usado para descrever expressões, políticas ou ações que evitam ofender, excluir e/ou marginalizar grupos de pessoas que são vistos como desfavorecidos ou discriminados, especialmente grupos definidos por gênero, orientação sexual ou raça”.

   Ou essa: “Politicamente correto é utilizado como um título para classificar algo ou alguém que segue as normas e leis estabelecidas por uma instituição oficial”.

   Tem outras "definições", tem até dossiê, estudos, artigos sobre o tal “politicamente correto”. A coisa vai tomando proporções gigantescas que, pelo seu próprio tamanho, torna-se impossível saber o que é isso. Vira um ente abstrato, uma coisa transcendental pairando no ar que ninguém sabe o que é, mas todo mundo imagina que existe; vira um imaginário popular, um fabulário popular, um senso comum.

   “Politicamente correto”, evitar o uso de certas palavras preconceituosas em relação a grupos de gênero, raça, orientação sexual e sabe-se lá mais o quê.

   Ora, quais palavras devo evitar? Existe uma lista de palavras que devo evitar? Claro que não existe tal lista, mas as palavras que você deve evitar são as palavras preconceituosas em relação aos grupos ali. Mas a subjetividade continua e o resultado é catastrófico.

   Você me chama de uma coisa e eu me ofendo, reajo pela emoção. Pronto. Acrescentei uma palavra na tal da lista que não existe. E o absurdo não pára de crescer.

   Quando dizem que o politicamente correto é uma forma de censura, concordo; mas o estrago, acredito eu, vai mais além. Causa emburrecimento. Decai a inteligência, decai a moral e vice-versa. Mas não confunda Inteligência com astúcia maligna. A inteligência é ligada ao bem, ao belo e à verdade. A astúcia maligna é a caricatura satânica da inteligência. A astúcia maligna, por exemplo, é o jeitinho brasileiro, levar vantagem em tudo, malandragem, mentira, enganação, lograr os outros, subir na vida pisando nos outros, baixeza moral. É a mentira. Mentir todo mundo nasce sabendo fazer ou aprende depois, mas quê inteligência precisa para mentir, enganar os outros e não cumprir acordos? Nenhuma. Basta ser um sem-vergonha jeitoso nas palavras e ganhar fama e dinheiro. A partir daí as pessoas emburrecidas julgam que alguém é inteligente somente porque tem fama e dinheiro. Esquecem o que essa pessoa fez para chegar lá, como ela fez, de que maneira, etc. Decai a inteligência decai a moral e vice-versa, uma vem de arrasto da outra.

Chavões no Direito   

   Vamos a alguns exemplos da realidade que, no Brasil, já quase não se sabe mais o que é realidade ou o que é ficção. A Lei 12.711/2012, a lei de cotas raciais e seu decreto 7.824/2012. Há a expressão "autodeclarados" pretos, pardos e indígenas. Ora, quando uma lei usa e/ou cria um termo ou uma expressão deve especificar no parágrafo seguinte: considera-se "autodeclarados" para os devidos fins desta lei... e estabelecer alguns parâmetros. Na lei de cotas raciais não há tal coisa, então o que vale é o sentido gramatical. Todo esse pessoal que entrou nas cotas raciais e agora está sendo acusado de fraude e tendo seu diploma cassado, entrou dentro da lei. As tais bancas que estão surgindo, após 8 anos da promulgação da lei, são criadas por portaria de algum Reitor e a lei de cotas está em vigor, ou seja, uma portaria de um Reitor regulamenta e altera uma lei aprovada pelo Legislativo e pelo Executivo. As tais bancas é que decidem agora pelo critério fenotípico quem pode entrar ou não nas cotas raciais. Em última instância, essas pessoas estão decidindo quem é preto, pardo ou indígena no Brasil.

   Outro exemplo. Inciso LVII do artigo 5º da Constituição: "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória". Este inciso é a causa desse imbróglio todo da prisão em segunda instância. Ele não é claro, nem preciso. Segundo os parâmetros de clareza, concisão, precisão e aplicabilidade na realidade, toda lei no seu texto escrito deve observar os 4 parâmetros em conjunto, não somente um, dois ou três. No caso desse inciso, ele é conciso, mas não é claro nem preciso e por isso não tem como executar, aplicar na realidade. "Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória"... tá, mas e quando o cara vai preso? A culpabilidade está ligada à prisão do elemento. Não tem clareza no texto. Ele trata da presunção de inocência, mas pelo se entende o cara só perde a inocência depois do último do último do último... recurso no STF. Não tem precisão. É por isso que o STF já julgou 4, 5, 6 vezes, sei lá quantas vezes, a prisão em segunda instância. Julga ao fedor do momento, agora pode, agora não pode...

   Para entender a aplicabilidade na realidade vamos imaginar que o inciso tivesse a seguinte escrita: "ninguém será preso até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória". Teríamos um inciso claro, conciso e preciso, mas também não seria aplicável (executável) na realidade. Ninguém mais iria preso no Brasil. Eu poderia sair na rua e dar 6 tiros num vivente só para ver de que lado o Cristão cai e iria na Delegacia, jogaria a arma fumegando ainda, com o cano quente, em cima do balcão do policial plantonista e diria: "matei um cara lá e registra logo isso que estou com pressa". Eu iria preso somente depois do último do último do último... recurso no STF. Esse é o problema da burrice quando não se sabe mais escrever um simples texto de uma lei. Decai a inteligência, decai a moral e vice-versa. É automático isso, decai a moral, decai a inteligência, acontece quase ao mesmo tempo.

   Mais um. A Lei do Abuso de Autoridade (Lei 13.869/2019). No parágrafo único do artigo segundo diz: "Reputa-se agente público, para os efeitos desta Lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função em órgão ou entidade abrangidos pelo caput deste artigo". Ora, "qualquer outra forma de investidura ou vínculo...", até a tia do cafezinho é um agente público, portanto, uma autoridade e está enquadrada nessa lei. Ela me traz um cafezinho frio, eu reclamo, discutimos... e pronto. Processo ela por abuso de autoridade, mas a minha intenção será tentar ganhar um dinheiro do órgão público por "danos morais". A tia do cafezinho é circunstancial. E se alguém acha isso um absurdo, lembro que o Brasil é a terra do absurdo e que quando saiu a lei de cotas raciais há 8 anos pouquíssimos perceberam a nhaca que iria dar e está dando hoje. Pouquíssimos perceberam a nhaca do inciso LVII. A coisa vai num crescendo, aumentando, o "exagero da verdade que inevitavelmente transforma-se num absurdo". Exagero da verdade no caso é mentira, mentir até tudo transformar-se num absurdo completo. Um texto subjetivo demais enseja inúmeras interpretações, cada um interpreta como quer e, a partir daí, vale a interpretação da "otoridade" cuja interpretação é subjetiva na essência porque o texto é subjetivo na essência. Nem a "otoridade" sabe do quê o texto está falando. Que maravilha isso.

   Com base nesses exemplos acima - eu poderia citar mais, ficaríamos aqui meses falando da subjetividade das nossas leis, da margem de interpretação, da famosa "brecha" na lei que vem dessa subjetividade absurda no texto escrito -, então eu pergunto: dos 513 deputados, 81 senadores e mais todo o pessoal envolvido (Executivo e Judiciário) ninguém percebe isso? Ninguém leu o texto "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória" e se perguntou: tá, mas e quando o cara vai preso? Ninguém se perguntou: tá. mas o que é autodeclarado preto, pardo e indígena? Qual é o referente dessa coisa? Como se dará isso na realidade? Como se aplicará tal lei? Como se executará tal lei?

   E nem falei do excesso excessivamente excessivo do número de leis vigentes que temos no Brasil. Temos em torno de 190 mil leis vigentes, em vigor, estão valendo. E o Congresso não pára de cagar leis diariamente, uma mais absurda do que a outra. Alguns dizem 180 mil leis, outros dizem 200 mil leis. É tanta lei que mesmo que se fizesse um mutirão - um puxirão - não teria como se chegar ao número exato. Tem estudos de juristas que falam que num país como o Brasil o ideal seria ter um mínimo de 500 e um máximo de mil leis vigentes. Temos 190 vezes mais e a esmagadora maioria subjetiva demais. Que maravilha!

   A realidade jamais se adaptará a um texto escrito. É ao contrário: o texto escrito é que deve ser de acordo com a realidade. Mas enfim, vamos passar para outro tema, outro objeto do assunto.

   Vou aqui, para o nosso entendimento, propor uma diferença entre chavão e ditado. Um mesmo enunciado pode ser um chavão ou um ditado. Um chavão é uma frase, uma expressão que se repete abusivamente e que perde, por isto, o valor expressivo. Um ditado é uma máxima, uma frase, uma citação retirada de um contexto.

   Por exemplo: “E conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”. Essa citação pode ser um chavão como pode ser um ditado. Caso você leu, ao menos, o capítulo no qual esta citação está inserida e você a usa em uma situação na vida parecida ao contexto, então é um ditado. Caso você não leu, ao menos, o capítulo, então você está pegando a palavra sagrada da Bíblia e transformando-a em um chavão imbecil. Apesar do enunciado, da citação ter um significado em si, ainda assim fica uma coisa meio esquisita você utilizá-la sem relação com o contexto original. Isto se aplica a qualquer citação de qualquer autor. No mínimo, se faz necessário que você tenha lido alguma coisa para usar uma citação, senão é um chavão.

   A linguagem não são somente palavras. É através da linguagem que o ser humano expressa seu raciocínio. O modo como uma pessoa fala ou escreve reflete como é a cabeça dessa pessoa. Por isso que conversando 30 minutos com uma pessoa que nunca vimos na vida temos condições de saber se esta pessoa tem um certo raciocínio ou não. É óbvio que existem mais coisas envolvidas, por exemplo, na hora da conversa a pessoa pode estar ansiosa, nervosa, mas pelo período da conversa percebe-se isso. Aí entram a Razão e a Emoção.

   Tudo o que você fala e escreve são seus pensamentos e raciocínios materializados. A linguagem não são somente palavras... ou, a linguagem não é somente palavras, como queira.

   Pensamento/raciocínio, linguagem e comportamento. É outra tríade indivisível. Alterando qualquer uma dessas três, automaticamente você altera as outras duas. A mais fácil de mudar é a linguagem. Em uma sociedade grande, como a brasileira, o processo é demorado, mas alterando a linguagem você altera o pensamento/raciocínio e o comportamento das pessoas. Podemos agir mais diretamente no raciocínio e/ou no comportamento. Por exemplo, eu entro em uma seita e daqui uns meses ou um ano estarei saindo de fraldas na rua cantando mantras. Meu comportamento foi alterado através da mudança da linguagem e do raciocínio.

   Caso o leitor ainda não tenha se convencido da importância da linguagem, das palavras, dos signos, significados (e seus sentidos) e da relação com seus referentes, então peço ao leitor que pense ou raciocine com uma frase formada por palavras que você nunca ouviu ou leu na sua vida. Forme uma frase com palavras que você nem sabe que existe. Tente expressar aos outros (ou a você mesmo) um pensamento ou raciocínio com palavras que você desconhece totalmente. Quando você conseguir fazer isso, daí eu revejo tudo o que escrevi sobre a linguagem. Quando você conseguir fazer isso, daí tudo o que já foi escrito e falado por vários autores sobre a linguagem estará errado. Por outro lado, é óbvio que isso é impossível (pensar e/ou raciocinar em palavras que não sabemos que existem ou nunca ouvimos ou lemos), mas raciocinando em cima disso você entenderá o que significa: "No princípio tudo era verbo". Você entenderá que quando decai a inteligência, decai a moral e vice-versa.

   Já encerrando, senão farei um livro aqui, mas deixo links ao final para quem quiser perder mais tempo lendo sobre pensamento/raciocínio, linguagem e comportamento, como uma afeta as outras. São textos ainda incompletos, talvez o leitor acrescente alguma coisa.
   Poderia discorrer sobre outros exemplos de chavões corriqueiros, mas vou deixar alguns aqui a título de informação.

   “Não é bem assim”. “Tenho meus direitos”. “Tinha que ter uma lei para isso”. “Para um bom entendedor meia palavra basta”. “Tempo é dinheiro”. "Faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço". “Capaz que isso é verdade”. “Estado democrático de direito”. “Estão atacando as instituições”. "O impossível é impossível somente até alguém torná-lo possível". “A pressa é inimiga da perfeição”. "O poder corrompe e o poder absoluto corrompe absolutamente". “Futuro melhor para as próximas gerações”. "Quem pode mais, chora menos". "Liberal na economia e conservador nos costumes". "Desta vida não se leva nada". "Eu trabalho a semana inteira, tenho direito a me divertir". “A esperança é a última que morre”. "Não existem verdades absolutas". “O gigante acordou”. “Doa a quem doer”. "A política é a arte do possível". “Consulte o pai dos burros”. E por aí vai.

   E a cada chavão proferido, o animal repete: “É somente uma expressão que utilizei”. E durante o dia o animal fala uns 50, 100 chavões, mas cada um é somente uma expressão que ele utilizou. Nada tenho contra os chavões e palpites em si, o problema é a constância, a repetição quantitativa. E o problema também é que a partir daí tudo será transformado em palavras vazias. Tudo o que a pessoa fala é automaticamente sem referente. O animal transforma tudo o que fala e escreve em palavras vazias de referente, às vezes, vazias até de significado. O ditado popular: Palavras bonitas, mas vazias de conteúdo!

   Caso for dar um palpite, deixe bem claro que é um palpite: “Olha, não tenho muito conhecimento desse assunto, o que vou falar é um palpite, lá vai...” e daí você dá seu palpite. Ou diga: “Não sei, não tenho uma opinião formada”. Mas nessa hora sempre tem um animal que insiste: “Ué, você não tem opinião sobre as coisas?” E temos as variações dessas imbecilidades, cujas quais não me estenderei.
   Analisando somente o último: “consulte o pai dos burros”, é um chavão porque uma pessoa burra não consulta o dicionário, um burro, por definição, não quer aprender, tem aversão ao conhecimento. Quem consulta o dicionário é porque está querendo aprender, portanto, é inteligente, e mais portanto ainda: o dicionário é o pai dos inteligentes. Porém, o dicionário em si não é o bambambam da coisa toda, mas é um parâmetro básico.

   Quando você profere um chavão do alto da sua ignorância você está reagindo pela emoção, está toda afetada, porque, provavelmente, você não sabe o significado da palavra ou da expressão, mas faz uma vaga idéia na sua cabeça. É esse tipo de burrice que leva à canalhice, à baixeza moral. Decai a inteligência, decai a moral e vice-versa. Decai uma, decai a outra automaticamente.
   O texto ficará nessa linguagem coloquial, sem revisão (talvez revise depois, sei lá, ou vou revisando com o tempo), pois estou com o raciocínio preguiçoso hoje. Ficarão faltando algumas coisas, mas como se diz: “Deus morreu, Marx morreu e eu mesmo não estou me sentindo muito bem”. Nesta circunstância, isso é um chavão ou um ditado?

   Deus está morto, então vamos ressuscitá-lo.

Links:

https://julioseibei.blogspot.com/2024/07/pensamento-e-raciocinio.html

https://julioseibei.blogspot.com/2021/03/a-linguagem-nao-e-somente-palavras.html

https://julioseibei.blogspot.com/2019/07/esboco-de-filosofia-8-pensamento.html

https://julioseibei.blogspot.com/2020/02/esboco-de-filosofia-9-raciocinio.html

https://julioseibei.blogspot.com/2020/08/esboco-de-filosofia-10-importancia-da.html