terça-feira, 12 de abril de 2022

Gramsci, a Grande Propaganda e o Senso comum

   Fazendo uma análise da situação, em alguns pontos, no Brasil, à lamparina de Antonio Gramsci – uma hora com base na situação, outra com base nos escritos de Gramsci, indo e vindo - com relação a alguns trechos do Volume 2 dos Cadernos do Cárcere. Aliás, este volume 2 é uma dificuldade imensa encontrá-lo no mercado editorial brasileiro. Eu o tinha – e tenho - em PDF, mas queria o volume 2 em celulose para completar a coleção. Os volumes 1, 3, 4, 5 e 6 encontram-se com facilidade, porém, o volume 2 está sempre “indisponível” ou “esgotado” mesmo em sites de grandes editoras. As razões dessa “falta” não me cabem aqui analisar, mas deixarei, mais adiante, algumas meditações neste sentido à luz do maçarico do próprio Gramsci.

   O volume 2 que tenho, encontrei num sebo depois de muito garimpar por uns dois anos. Isso já tem uns três anos, mas escrevo agora porque terminei as labutações mentais em torno dos Cadernos do Cárcere com o intuito de libertar-me da preocupação de não ter estudado alguma coisa de Gramsci.

   Citarei alguns trechos (coisa que não gosto muito de fazer), mas a análise em questão exige, mesmo que seja para despertar o interesse do leitor por Gramsci.

   Gramsci começa fazendo uma pergunta: “Os intelectuais são um grupo autônomo e independente, ou cada grupo social tem uma sua própria categoria especializada de intelectuais?” GRAMSCI, Antonio, Cadernos do Cárcere, volume 2, página 15.

   E segue discorrendo sobre o assunto, como veremos adiante. Neste volume 2, o que nos interessa, além desta primeira parte (intelectuais), são algumas partes dos Cadernos Miscelâneos e a parte do Jornalismo (Caderno 24, de 1934).

 

   “Por isso, seria possível dizer que todos os homens são intelectuais, mas nem todos os homens têm na sociedade a função de intelectuais (assim, o fato de que alguém possa, em determinado momento, fritar dois ovos ou costurar um rasgão no paletó não significa que todos sejam cozinheiros ou alfaiates).” GRAMSCI, Antonio, Cadernos do Cárcere, volume 2, página 18.

   Gramsci começa o Caderno 12 (1932), caderno este que faz parte da compilação que forma o volume 2 (livro 2), fazendo apontamentos e notas dispersas para um grupo de ensaios sobre a história dos intelectuais. Lembrando que o corcunda Gramsci escreveu seus Cadernos do Cárcere quando estava numa das prisões do Mussolini (a prisão romana de Regina Coeli) onde ali residiu comendo e bebendo de graça por 8 “felizes” anos (1926-1934) e produziu as Cartas do Cárcere e os Cadernos do Cárcere, o que não trouxe muita felicidade para a humanidade.

   Várias partes dos Cadernos do Cárcere tem uma validade intrínseca em relação à realidade, porém, vai da moral de quem aplica tais conhecimentos e técnicas, ou seja, pode-se usar tanto para o bem como para o mal.

   A moralidade de uma técnica reside no uso que se faz dela e não na técnica em si. Ninguém é “dono” de uma técnica. Podemos usar uma arma de fogo tanto para nos defender como para assaltar, bem como podemos furar o olho de alguém com uma caneta ou utilizar um livro para iniciar um incêndio que pode alastrar-se pela sociedade.

 

   “O caso é diverso para os intelectuais urbanos: os técnicos de fábrica não exercem nenhuma função política sobre suas massas instrumentais, ou, pelo menos, é esta uma fase já superada; por vezes, ocorre precisamente o contrário, ou seja, que as massas instrumentais, pelo menos através de seus próprios intelectuais orgânicos, exerçam uma influência política sobre os técnicos.

   O ponto central da questão continua a ser a distinção entre intelectuais como categoria orgânica de cada grupo social fundamental e intelectuais como categoria tradicional, distinção da qual decorre toda uma série de problemas e de possíveis pesquisas históricas.” Idem, página 23.

   “É necessário fazer algumas distinções: 1) para alguns grupos sociais, o partido político é nada mais do que o modo próprio de elaborar sua categoria de intelectuais orgânicos...

   2) o partido político, para todos os grupos, é precisamente o mecanismo que realiza na sociedade civil a mesma função desempenhada pelo Estado, de modo mais vasto e mais sintético, na sociedade política, ou seja, proporciona a soldagem entre intelectuais orgânicos de um dado grupo, o dominante, e intelectuais tradicionais;...”. Idem, página 24.

   “A formação dos intelectuais tradicionais é o problema histórico mais interessante”. Idem, página 25.

 

   Intelectual orgânico, para Gramsci, são os propagandistas políticos em cada classe (ou categoria). Pode ser um cantor, um jogador de futebol, um ator, uma atriz, um político, um jornalista, um padre, um pastor, enfim, qualquer analfabeto cumpridor de ordens (condição essencial) a quem o “partido” carimbe com esse rótulo de “intelectual”; e este ser surge das sombras da ignorância para ser alçado à condição de “intelectual” e formar opiniões falando e/ou fazendo bobagens o dia inteiro na grande propaganda. Às vezes eles se alternam, um sai de cena para dar lugar ao outro, evitando assim a exposição maçante e excessiva da imagem do “intelectual”, senão todo mundo perceberá que é um imbecil.

   Lembrando que “propagandista político” não se refere exatamente à política partidária como a conhecemos no Brasil – se é que isso existe no Brasil. Propaganda política, para Gramsci, é a propaganda do partido comunista, das idéias comunistas, dos princípios comunistas.

   Por exemplo, um padre católico que não usa batina e constantemente está na grande propaganda (grande mídia) e posta fotos suas com camisetas apertadas explicitando uma vaidade imensa e faz comentários irrelevantes acerca da sua própria sexualidade; tal padre nem precisa falar para propagar ideias comunistas, ele próprio É a propagação de tal subversão, no caso, a teologia da libertação.

   Outro exemplo: um jornalista e/ou comentarista “homem” na televisão/youtube/jornal que usa sutiã por baixo da roupa achando que ninguém percebe, isso também é um propagandista ou um “intelectual orgânico”.

   Um político corrupto que propõe a descriminalização de pequenos furtos também é um propagandista a serviço do partidão, mesmo que não saiba. Como se diz: "esquerdistas e liberais são prostitutas políticas de comunistas".

   Um político “didireita” que entra com um projeto para criar órgão de fiscalização das redes sociais é um propagandista a serviço do partidão, mesmo que não saiba, pois está sendo usado momentaneamente como “intelectual orgânico” por ser um analfabeto, um idiota útil.

   Uma “cantora” que só sabe rebolar a bunda, tatua o próprio ânus, além de que, quando abre a boca, só saem obscenidades; é uma propagandista.

   Uma apresentadora de programas infantis que está sempre vestida escassamente com as coxas de fora, às vezes mostrando as polpas da bunda, também é uma propagandista, no caso uma das piores, pois trabalha influenciando crianças. Este tipo de apresentadora não precisa sequer mencionar a palavra “feminismo” porque ela É o feminismo encarnado, a vida dela é o feminismo em si. Umas até alugam um homem para gerar uma cria.

   Um apresentador cujo público é majoritariamente infantil, mas está sempre promovendo sexualidade, promiscuidade, bizarrices, lambuzando-se de melecas numa banheira, ensinando veladamente a fazer sexo oral, também é um propagandista, um dos piores que possa existir.

   Um apresentador aparentemente sério na forma, mas cujo conteúdo é voltado para bizarrices, programas populares no sábado ou domingo de tarde com mulheres coxudas dançando escassamente vestidas; também é um propagandista.

   Um apresentador de programas de entrevistas cuja forma e cujo conteúdo são aparentemente sérios, mas pratica a “espiral do silêncio”, ou seja, entrevista somente quem é da patotinha; também é um propagandista. Desses, no Brasil, você dá um chute numa touceira, saltam uns 300.

   Juízes que se afastam do Direito para praticar política terminam por basear suas decisões com o que sai na grande propaganda corrompendo-se e corrompendo o Direito; são propagandistas.

   "Cientistas", "especialistas" de todo gênero que pipocam na grande propaganda; sendo que de cientista e especialista tem somente o nome. São promovidos artificialmente à categoria de "cientistas", sendo que muitos deles falam bobagens que ouviram de orelhada (mesmo sem ter ouvido) ou são pagos para defender interesses escusos; são meros propagandistas.


“O tipo tradicional e vulgarizado do intelectual é dado pelo literato, pelo filósofo, pelo artista. Por isso, os jornalistas – que acreditam ser literatos, filósofos, artistas – crêem também ser os “verdadeiros” intelectuais.” GRAMSCI, Antonio, Cadernos do Cárcere, volume 2, página 53.

   O intelectual tradicional, para Gramsci, é o que se chama simplesmente de intelectual, é o verdadeiro intelectual. Aliás, no Brasil tornou-se necessário adjetivar com “verdadeiro(a)” porque as pessoas não sabem mais sequer o significado das palavras. O corcunda Gramsci foi um dos responsáveis, pois tem a mania de desdobrar os conceitos, significados e definições ad infinitum criando novas categorias e/ou classes bagunçando o significado original das palavras. Apesar de que Gramsci, neste ponto, não foi tão pernicioso como Kant, Hegel, Marx, etc, que não trabalham com definições, trabalham com “determinações” e vão desdobrando o objeto de estudo até o infinito na intenção de concretizá-lo, ou seja, desdobram tudo até causar náuseas no leitor e concretizam nada, mas geram um palavrório oco e vazio; palavras bonitas, mas vazias de conteúdo.

   E dê-lhe enfiar tal idéia na cabeça dos “jornalistas” brasileiros: “vocês são intelectuais, vocês são intelectuais, vocês são intelectuais”, repitam isso até virar verdade... somente na cabeça de vocês. Os "jornalistas" no Brasil - e em grande parte do mundo - não passam de idiotas úteis porque são idiotas e não sabem, mas são úteis para uma determinada causa. É Gramsci sussurrando no ar: "fazer todo mundo virar socialista sem nem perceber".

   Na página 75 temos uma passagem interessante: “A teoria de Freud, o complexo de Édipo, o ódio pelo pai – patrão, modelo, rival, expressão primeira do princípio de autoridade – colocado na ordem das coisas naturais. A influência de Freud sobre a literatura alemã é incalculável: ela está na base de uma nova ética revolucionária(!). Freud deu um novo aspecto ao eterno conflito entre pais e filhos. A emancipação dos filhos da tutela paterna é a tese em voga entre os atuais romancistas. Os pais abdicam de seu “patriarcado” e fazem autocrítica honrosa diante dos filhos, cujo senso moral ingênuo é o único capaz de quebrar o contrato social tirânico e perverso, de abolir as coerções de um dever mentiroso. (Cf. Hauptmann, Michael Kramer; e a novela de Jakob Wassermann, Um Pai).”

   Grosso modo, é a “ressignificação” da destruição da família e da propriedade privada. “Meu pai me oprime”. Lembrando que Freud é aquele imbecil que escreveu que o ciúme da mulher vem da inveja que ela tem do pênis masculino.

   O tal Complexo de Édipo de Freud é uma invenção maligna que distorceu brutalmente a cabeça das pessoas. O cocainômano Freud baseou-se na tragédia grega Édipo Rei de Sófocles para emprestar o nome do seu Complexo... e as semelhanças terminam aí. Talvez Freud tivesse o desejo de copular com a própria mãe e transferiu tal desejo para toda a humanidade estuprando a mente de várias pessoas que ainda acreditam nessa bobagem de “complexo de édipo”. Freud foi um propagandista, um intelectual orgânico alçado à categoria de intelectual.

   A promoção de imbecis como “intelectuais”, acarreta o efeito contrário no qual a sociedade passa a tratar estudiosos sérios como não-intelectuais, como caricaturas, malucos do bairro, figuras folclóricas, personagens histriônicos, teóricos da conspiração, etc, e são excluídos da “comunidade intelectual respeitável”, ou seja, inverte completamente a coisa e produz uma sociedade de analfabetos insanos, mas facilmente controlável pela corriola que manda no partidão, onde os tais intelectuais orgânicos se acham pensadores independentes, mas são escravos que se acham donos. Gramsci discorre com propriedade que os intelectuais orgânicos se acreditam serem autônomos e independentes mesmo dentro de seu grupo social onde todos repetem as mesmas coisas. Isto é feito de propósito, esta é uma das propostas gramscianas: criar novas classes para ter hegemonia cultural; como veremos agora na parte do Jornalismo.

 

   “O tipo de jornalismo considerado nestas notas é o que se poderia chamar de “integral” (no sentido que, no curso das próprias notas, ficará cada vez mais claro), isto é, o jornalismo que não somente pretende satisfazer todas as necessidades (de uma certa categoria) de seu público, mas pretende também criar e desenvolver estas necessidades e, consequentemente, em certo sentido, gerar seu público e ampliar progressivamente sua área.” Idem, página 197.

   O tal “jornalismo integral” de Gramsci nada mais é do que a propaganda, ou seja, o jornalista e o jornalismo são desviados de suas funções precípuas e são transformados em meros propagandistas a serviço da guerra cultural, ainda que eles saibam ou não. Este “ainda que eles saibam ou não” vem do conceito gramsciano de “fazer todo mundo virar socialista sem nem perceber”. Isto se dá através da manipulação do próprio jornalismo.

   “... o jornalismo que não somente pretende satisfazer todas as necessidades (de uma certa categoria) de seu público...”, o jornalismo sai de suas funções de satisfazer as necessidades de seu público, de fornecer e transmitir fatos e informações como eles acontecem na realidade e passa a “criar e desenvolver estas necessidades e, consequentemente, em certo sentido, gerar seu público e ampliar progressivamente sua área”. O jornalismo vira propaganda pura e simples que cria novas classes artificiais na sociedade, cria seu próprio público específico e amplia este público. O jornalismo transforma-se em propaganda que mente, distorce e manipula a opinião pública numa certa e específica direção.

   Por exemplo: movimentos, coletivos, ONGs, etc. Movimento feminista, gayzista, anti-racismo, etc. Cria-se um coletivo desses, fornece-se uma (ou várias causas) e promove-se tal coletivo na grande propaganda – aquilo que chamam de grande mídia no Brasil, mas que de jornalismo tem mais nada, é somente propaganda na guerra cultural para destruir a cultura de um país, criar dissensões, lutas de classes, fragmentar a sociedade, “dividir para conquistar”. Assim temos uma sociedade majoritariamente analfabeta e insana cujo controle social torna-se fácil por um grupo específico.

 O "jornalismo do tipo integral" cria novas classes, tais como "seu racista", "seu machista", "seu fascista", "seu negacionista", "seu anti-vax", "seu esquerdopata", "feminista", "seu extrema-direita", etc (o espectro político não interessa mais) e amplia essas classes gerando fragmentação da sociedade fazendo todo mundo virar socialista sem nem perceber. Não é preciso mais observar classes na realidade, vamos inventando novas classes e produzindo chavões até que a população passa a se preocupar somente com isso, com coisas irrelevantes, com picuinhas, com mesquinharias.

   Exemplos: separação de celebridades passam a ter uma importância incomensurável na sociedade; o biquíni novo da fulaninha vira assunto imprescindível no seio familiar; o último lançamento de um filme é motivo de brigas e discussões ferrenhas; pessoas desmancham amizades consangüineas com parentes, amizades de anos, brigam com conhecidos por causa de um jogador de futebol, por um político, por um cantor, um grupo, uma banda, etc, e ainda postam com vaidade nas redes socais: "corri meu irmão para fora de casa, ele é 'petista', 'bolsonarista', 'lulista', 'morista', 'cirista', ou sei lá que PQP", e postam isso com uma vaidade nojenta.

   Destruição da família é isso na realidade, e você, seu idiota útil, grita "Deus, Pátria, Família". Está destruindo sua família por uma pessoa que sequer sabe da sua existência, sequer sabe que você existe; esse político, celebridade, etc, nem sabe que você existe. Quando der um revés na tua vida quem você procurará? Esse político que nem sabe da sua existência e que você nem tem acesso a ele? Um desconhecido? Você mesmo fragmentou a sua vida, virou um átomo solto no mundo berrando "Deus, pátria, família".

 

   “Cada um destes tipos deveria ser caracterizado por uma orientação intelectual muito unitária e não antológica, isto é, deveria ter uma redação homogênea e disciplinada; portanto, poucos colaboradores “principais” devem escrever o corpo essencial de cada número. A orientação redacional deve ser fortemente organizada, de modo a produzir um trabalho intelectualmente homogêneo, apesar da necessária variedade do estilo e das personalidades literárias; a redação deve ter um estatuto escrito, o qual, quando coubesse, impediria as improvisações, os conflitos, as contradições (por exemplo, o conteúdo de cada número deve ser aprovado pela maioria da redação antes de ser publicado).” Idem, página 201.

   A “orientação intelectual muito unitária” é a ocupação dos espaços nas redações por diretores e editores que tenham somente uma mesma determinada orientação político-ideológica. A partir daí a coisa espalha-se, alastra-se como um incêndio pela redação e pela sociedade como um todo. Cria-se uma uniformidade no “jornalismo” em âmbito nacional.

   Para analisar como se dá esta uniformidade, vamos tomar como exemplo, de baixo para cima, um jornal de uma determinada região, um jornal de âmbito regional que abrange algumas cidades e que não seja de âmbito estadual. Tal jornal tem seu corpo editorial e redacional, tem seus diretores e editores. O repórter em seu serviço de rua capta uma notícia e vai investigar. No início capta algumas informações para dar o começo da reportagem. Este repórter entra em contato com seu editor específico de sua “página” (policial, coluna social, política, etc) e comunica ao editor que está fazendo tal reportagem. Pode acontecer que o editor fale: “nem perca seu tempo, o jornal não publicará isso porque não faz parte das pautas, da política do jornal”. O repórter então, a partir daí, será condicionado a buscar notícias as quais ele sabe que serão publicadas, ou seja, acontece um direcionamento das notícias e tal direcionamento pode tornar-se pernicioso no sentido de que umas notícias serão publicadas e outras não. A verdade em si será escamoteada do público e o repórter, acostumado a isso, não verá nada de errado. Caso o repórter insistir em tal notícia cujo editor avisou para “não perder seu tempo”, pode acontecer que o repórter será encostado numa seção sem importância ou perderá o emprego. É o que se conhece por censura.

   Analisando agora de cima para baixo, com relação a jornais de âmbito nacional, acontece que jornais menores por não terem meios de ação, neste caso, dinheiro, por serem jornais pequenos, eles captam notícias nacionais dos jornais maiores, ou seja, jornais menores não tem condições de terem uma sucursal em cada estado da federação (do país), então as notícias nacionais replicam de cima para baixo. O que sai num grande jornal, sai nos vários jornais menores espalhados pelo país e isso dá uma impressão de veracidade para o leitor, pois o leitor verá a mesma notícia num grande jornal e no jornal da sua cidade. Muitos jornais pequenos “copiam e colam” notícias nacionais e apresentam em letras pequenas “via Estadão”, “via Folha de São Paulo”, etc. Muitas vezes o leitor não percebe que a notícia é a mesma, mas guarda o fato essencial da notícia em sua cabeça; isso dá uma impressão de veracidade. De certo modo isto é natural. O problema é quando se extrapolam esses limites o “jornalismo” transforma-se somente nisto: uma uniformidade brutal, inorgânica e, nas maioria das vezes, mentirosa.

   Esta extrapolação de limites, principalmente limites morais, posso exemplificar com o seguinte: um jornal apoia certo político, um prefeito, um governador, etc. Neste jornal sairá somente notícias maravilhosas acerca do governo deste político. Os problemas reais da sociedade serão escamoteados, escondidos do público, mas o público percebe tais problemas na realidade e pela repetição constante de tais notícias lindas sobre o governo, o público pode resultar em dissonância cognitiva, aquele deslocamento das notícias em relação à realidade dos fatos. Em segundo plano, mas não menos importante, o público fica mal informado e/ou desinformado.

   A repetição constante, mas não mecânica, sugerida por Gramsci, é uma técnica que funciona, pois repete-se a mesma idéia, o mesmo conceito, porém com outras palavras. Por exemplo: "vou te eliminar... vou acabar contigo... darei um jeito em você...". Não é necessário repetir "vou te matar", está implícito e tem muito mais efeito.

   Na grande propaganda é comum encontrar, por exemplo, "isso é fake news", "checamos e constatamos que é boato", "tal pessoa acusou sem apresentar provas" e assim por diante repetimos constantemente, mas não mecanicamente.

 

   “Um organismo unitário de cultura, que oferecesse aos diversos estratos do público os três tipos supracitados de revista (e, ademais, entre os três tipos deveria circular um espírito comum), ao lado de coleções de livros correspondentes, satisfaria as exigências de uma certa massa de público, que é mais ativa intelectualmente, mas apenas em estado potencial, e que é a que mais importa elaborar, fazer pensar concretamente, transformar, homogeneizar, de acordo com um processo de desenvolvimento orgânico que conduza do simples senso comum ao pensamento coerente e sistemático.” Idem, página 201.

   Este “organismo unitário de cultura”, no Brasil, é o consórcio de imprensa que temos, vários grandes veículos de comunicação (jornais, televisões, revistas, etc) que estão uniformemente alinhados em uma certa corrente político-ideológica. As notícias que saem num jornal, saem em todos e espalham-se nacionalmente como um incêndio formando o senso comum da população.

   O senso comum é o imaginário popular, o fabulário popular. Senso comum não implica em bom senso e nem em mau senso, pode ser um como pode ser outro. O problema é quando o senso comum vira somente mau senso, ou seja, somente determinadas notícias tem permissão de sair na grande propaganda.

   É óbvio que muitas das coisas que Gramsci escreveu vieram de Kant, Croce, Hegel, Marx e vários outros autores. E também é lógico que não há um controle central que comanda todas as instâncias do processo cultural como se tivesse um gênio do mal, um vilão de histórias em quadrinhos, uma eminência parda que sabe de tudo.

   Utilizando agora o conceito tirado do Judô, a luta japonesa, conceito este bem delineado por Yuri Bezmenov, ex-agente da KGB, onde não precisamos usar a força para barrar um golpe do adversário, ainda mais se o adversário é mais forte fisicamente. Então usamos a força do adversário contra ele mesmo, ou seja, desviamos do golpe e damos um empurrão onde o adversário dá com a cara na parede ou desviamos do golpe, agarramos o braço do adversário e puxamos.

   Seguindo neste conceito, muitas vezes basta dar a direção do movimento e um “empurrãozinho” que o resto vem por si. Também se cria um ou vários movimentos em torno de uma causa onde a causa é a unidade do movimento e é o modo como se controla o movimento (ou coletivo), todos em torno de uma (ou várias) causas. E a grande propaganda dá a devida publicidade e promove uma evidência constante até criar-se um senso comum em torno da causa, causa esta sempre provinda de uma única corrente político-ideológica. De certo modo isto é natural em todo e qualquer grupo, mas podemos criar grupos e causas artificiais, como foi uma das propostas de Gramsci. Outros também formularam esta idéia de não somente observar classes existentes na realidade, mas agora criar “classes artificiais”, porém Gramsci, segundo meus conhecimentos, foi o autor mais específico neste ponto.

 

   “O senso comum não é algo rígido e imóvel, mas se transforma continuamente, enriquecendo-se com noções científicas e com opiniões filosóficas que penetraram no costume. O “senso comum” é o folclore da filosofia e ocupa sempre um lugar intermediário entre o folclore propriamente dito (isto é, tal como é entendido comumente) e a filosofia, a ciência, a economia dos cientistas. O senso comum cria o folclore, isto é, uma fase relativamente enrijecida dos conhecimentos populares de uma certa época e lugar.” Idem página 209.

   Vemos que a proposta de Gramsci é criar o senso comum na sociedade, aquela única corrente de pensamento que resulta em chavões populares advindos de uma única corrente filosófica e/ou ideológica.

   Como exemplos de senso comum, posso citar a “cultura do estupro”, “racismo estrutural”, homofobia, violência contra a mulher, a polícia sempre é a malvada da história, “estão encarcerando a população”, hoje tal profissão é malvada e amanhã já não é mais, etc, e também vai-se criando novos "sensos comuns", vai-se alternando a publicidade entre os já existentes de acordo com a moda do momento ou de acordo com um único fato que acontece na realidade e este único fato sai na grande propaganda como se fosse o senso comum da população inteira e acontece aquele bombardeio das mesmas "notícias" durante dias, semanas até.

   Certas coisas não tem como provar na realidade de um País grande como o Brasil, então manipulam as estatísticas, e a grande propaganda dá a devida publicidade promovendo o debate na sociedade até a causa transformar-se em projeto de lei que virará lei. Algumas vezes o próprio projeto de lei é, em si, a promoção do debate para depois virar lei. Umas vezes promove-se o debate primeiro, outras vezes entra-se primeiro com o projeto para promover o debate, porém, o resultado final é o mesmo: é aprovada uma lei que ferra com o cidadão, cuja lei, atualmente, somar-se-á com as mais de 190 mil leis vigentes que temos no Brasil. É o cidadão completamente sufocado, infantilizado, analfabeto e insano. É o socialismo, é a proposta de Gramsci: "fazer todo mundo virar socialista sem nem perceber".

   Bem como Gramsci escreveu anteriormente sobre as redações e editoras de livros, ou seja, o mercado editorial, promove-se no mercado editorial somente uma única corrente filosófica e/ou ideológica e a população tem somente acesso a esta única corrente. É tirado da população o contraditório. Como bem escreveu Lênin (além de outros), “o ser humano avança pelo contraditório”. Porém, a proposta de Lênin, e de Gramsci, não é fornecer o contraditório para a população, pois assim a população fica mais inteligente. Como queremos controlar a sociedade, fornecemos somente uma única corrente de pensamento através do mercado editorial e da grande propaganda e emburrecemos a população afim de controlá-la mais facilmente.

   Mesmo que determinado livro de outra corrente seja publicado, a grande propaganda não dará publicidade e visibilidade a este livro. É óbvio que nem toda grande editora é comunista, vamos por assim dizer, mas acontece que por determinado livro não sair na grande propaganda, obviamente não venderá como deveria e então a editora terá uma certa reticência em publicá-lo. Caso o livro tenha um conteúdo excelente, mas seja de um autor desconhecido ou de um autor que não faz parte do “beautiful people” haverá uma certa resistência em publicá-lo. E se for publicado, tal livro sofrerá um boicote da “intelectualidade oficial” e da grande propaganda. E isto se dá em várias áreas no Brasil. Concentração de dinheiro e poder, é o tal "organismo unitário de cultura" agindo na realidade, é Gramsci na cara de todo mundo, que oferece a mesma corrente filosófica e/ou ideológica aos diferentes estratos do público.

   O problema é que não se tem o controle do processo, como alguns pensam que tem. Cito como exemplo o meu caso do Volume 2 dos Cadernos do Cárcere cujo livro não se encontra no mercado editorial. Gramsci tomou no rabo com a sua própria proposta: controle da grande propaganda. Apesar de que alguns podem elucubrar que este livro não está presente no mercado editorial justamente para que a população não tenha conhecimento, ocasionando assim a confirmação do que Gramsci escreveu. Porém, caso a proposta de Gramsci seja elitizar o conhecimento, isso vai contra ele mesmo. Por outro lado, até admito que isso seja a confirmação do que Gramsci escreveu porque todo comunista é mentiroso ao extremo.

   No fim, tudo resulta numa questão de inteligência e moral (ou falta delas - decai a inteligência, decai a moral e vice-versa), pois nos Cadernos do Cárcere fica bem clara a aversão de Gramsci ao Cristianismo e, bem ou mal, o Cristianismo ensina a moral para seus praticantes ou, pelo menos, fornece uma boa base.

   Procurei evitar repetir, neste texto, coisas que já estão no senso comum de quem tem algum conhecimento do assunto, coisas como “destruição do ocidente”, da moral judaico-cristã, destruição da família, destruição da propriedade privada, etc, pois isto já é sabido.

   Para encerrar, menciono Hugo von Hofmannsthal, escritor e dramaturgo austríaco que escreveu um livro chamado Idéias Austríacas, Discursos e Ensaios. Neste livro, Hofmannsthal diz que: “Nada está na real política de uma nação, que antes não esteja na literatura”. Posso parafrasear: “Nada está na cultura de uma nação, que antes não esteja na literatura”.

   Como Gramsci bem escreveu anteriormente: “O “senso comum” é o folclore da filosofia e ocupa sempre um lugar intermediário entre o folclore propriamente dito (isto é, tal como é entendido comumente) e a filosofia, a ciência, a economia dos cientistas. O senso comum cria o folclore, isto é, uma fase relativamente enrijecida dos conhecimentos populares de uma certa época e lugar”.

   É um processo de inda e vinda, mas geralmente a literatura forma o senso comum de uma sociedade, ou seja, vem de cima para baixo, é assim que a literatura age na realidade.

   Autores escrevem sua literatura numa linguagem um pouco mais rebuscada em relação à linguagem coloquial da população, então ocorre uma troca de palavras até chegar na população, ocorre uma metonímia (troca de palavras). O problema é quando, nesta troca de palavras, perde-se o conceito original do autor. Quando, nesta troca de palavras, mantém-se o conceito original do autor, temos a formação do senso comum, que pode ser um bom senso ou um mau senso. E este senso comum pode ou não, ao longo do tempo, transformar-se em cultura na sociedade.

   Por exemplo: Gramsci quem criou e/ou propagou os conceitos e definições de "sociedade civil", "hegemonia cultural", "revolução passiva", "filosofia da práxis", "intelectual orgânico" e outras expressões que já fazem parte do vocabulário das pessoas na sociedade ou fazem parte de determinados grupos.

   Em outro texto veremos mais profundamente como se dá essa “troca de palavras”, pois isso envolve conceitos básicos de linguística tais como signo, significado (e vários sentidos) e referente. E significados básicos como conceito, significado e definição.